quinta-feira, 26 de março de 2015

HOWAVART: UM ALEMÃO LENDÁRIO, SEGURO, VALENTE E POUCO CONHECIDO

Excepcionalmente ao abordarmos o Howavart, não vamos abordar pormenores morfológicos ou adiantar o seu estalão, porque qualquer o pode fazer mediante consulta, o que nos liberta imediatamente de algum embaraço e possibilita a sua abordagem como cão familiar e de guarda, funções que executa como poucos e que continuam a justificar a presença desta raça entre nós, ainda que pouco conhecida em Portugal e pouco divulgada no Mundo. À primeira vista lembra um pastor alemão de pelo comprido com as orelhas abatidas ou um mestiço dessa raça, mas visto mais de perto percebemos que não é nada disso e reconhecemos-lhe características molossóides, uma inesperada “souplesse” de andamentos  e uma nobreza de carácter inconfundível. Hoje a maioria dos Howavarts são negros mas também os há preto-afogueados e vermelhos.
A sua história é muito antiga e remonta aos inícios do Séc. XIII, notabilizando-se na altura um exemplar desta raça que livrou das mãos dos eslavos um príncipe alemão recém-nascido, que haviam sitiado o castelo do seu pai, acabando por matá-lo. Em 1473, em plena Idade Média, a raça foi considerada por Heinrich Mynsinger uma das mais nobres entre as cinco reconhecidas como tal. Passado o período medieval e no início do Séc. XX a raça entrou em declínio e quase desapareceu, vindo gradualmente a ser substituída por outras raças de trabalho, nomeadamente pelo Cão de Pastor Alemão. Por volta de 1915, um grupo capitaneado pelo zoólogo alemão Kurt Friedrich König decidiu salvar a raça, melhorando-a com o Kuvaszok Húngaro, Pastor Alemão, Terra Nova, Leonberg, Bouvier Bernois e até com um cão de caça africano. Em 1937, graças a esse esforço, o Clube de Canicultura Alemão viria reconhecer em  o Howavart. Com a eclosão da II Guerra Mundial, que muito requisitou Howavarts pelas suas qualidades, sobraram no seu final muito poucos exemplares. Em 1947, um grupo de entusiastas pela raça, liderado por Otto Schramm, levou a cabo a sua recuperação, ao fundar o Clube “Rassezuchtverein für Howavart-Hunde Coburg”, trazendo o Howavart até aos nossos dias. Em 1964, o Clube de Canicultura Alemão reconheceu o Howavart como a 7ª raça de trabalho do país, facto que incrementou a sua procura e proliferação para além das fronteiras germânicas (não existem muitos exemplares em Portugal).
O Howavart é um cão seguro de carácter, maioritariamente silencioso, pouco efusivo nas suas manifestações, de olhar sério e observador, que não se intimida facilmente e não liga para provocações, dificilmente confunde alvos e quando carrega é para valer. É resistente ao castigo, territorial, gregário e protector, goza de boa sociabilização com os outros animais e é naturalmente impoluto e incorruptível, pouco dado a qualquer tipo de chantagens e que não usa a sua tremenda força gratuitamente. Sobra-lhe da herança molossóide a tendência de pensar e agir livremente, alguma teimosia e resistência, dispensando maiores preparos na disciplina de guarda, porque opera ataques multidireccionais e a vários golpes a zonas vitais, tanto pela retaguarda como pela frente dos agressores, tornando-se quando experimentado praticamente indefensável, muito embora seja um cão mais defensivo do que ofensivo, mais inclinado ao contra-ataque do que ao ataque propriamente dito.
Exige um dono experiente e comedido, conciso e apegado aos procedimentos, porque antevê e reage contra os abusos e injustiças. Quando comparado com o Rottweiler é mais distante e menos afectuoso, mais reservado e menos brincalhão, reagindo a diferentes motivações. Tem um senso de justiça tremendo, não carrega nos mais fracos e tende a proteger as crianças, suportando sem queixas as suas tropelias e participando nas suas brincadeiras. A raça apresenta dimorfismo sexual.
Se o seu carácter enche o olho a quem gosta de cães sérios e nada dados a tremeliques, a sua biomecânica não lhe fica atrás, apesar de ter um quociente de envergadura médio de 1.7 e pesar mais 12% do que um Pastor Alemão, do qual é em média um pouco mais alto e pesado. Na verdade estamos na presença de um falso lento, porque o seu semblante é pachorrento e as suas rectas articulações traseiras não indiciam a sua capacidade de manobra e velocidade. Com facilidade atinge o trote em suspensão e o seu galope consegue cobrir 8m/s, quando instantâneo, linear e rasgado, sendo próprio para as pistas tácticas onde normalmente se destaca. Tem uma excelente capacidade de impulsão, é célere na natação, não se intima facilmente pelo fogo e equilibra-se perfeitamente sobre estruturas estreitas ou periclitantes. É muito resistente e rústico, apresentando melhor desempenho nas estações frias. Os Howavarts vermelhos, menos comuns, têm iguais performances atléticas durante o ano inteiro, porque aquecem menos e necessitam de menor tempo de recuperação. Apesar do seu tamanho ou talvez por causa dele, é bastante comum encontrar Howavarts com 55 pulsações por minuto em descanso e por vezes até com menos.
Dos pontos de vista físico, sensorial, psicológico e cognitivo, o Howavart encontra-se superiormente apetrechado para qualquer disciplina ou utilidade canina, não apresentando dificuldades de assimilação em qualquer uma delas, quiçá pelo melhoramento de que a raça foi alvo no Século passado. Actualmente, os Howavarts  estão a ser mais usados como cães familiares, de salvamento (dentro e fora de água), guardiões, no rastreamento e na perseguição de criminosos. Tudo o que aqui dissemos acerca desta raça, não o fizemos pela boca de outros mas pelo contacto directo com alguns exemplares que dela treinámos, cães que nos ficaram na memória pela grandeza do seu desempenho e dedicação aos seus donos, que por sua vez nos aguçaram o apetite para sabermos mais sobre o Howavart., um excelente cão que para muitos continua a ser um ilustre desconhecido.

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