Quando um homem sai à rua, mal dá dois passos, já está gastar dinheiro e
se não tiver cuidado, ainda lhe roubarão a paciência, pelo que importa sair de
bolsos a abanar e ser surdo, para não ser vítima da publicidade que instiga ao
consumo e não se sujeitar a ouvir um sem número de disparates, coisa que nos
sucedeu há meia dúzia de dias, forçados pelo apego que temos aos animais. Um
jovem irreverente e versado em cães por convicção própria, com um grupo de
pessoas ao seu redor, apresentava-lhes o seu pastor alemão, de quem tecia rasgados
elogios e dizia ser muito raro. A exaltação e a raridade anunciadas
aguçaram-nos a curiosidade e num ápice juntámo-nos àquele magote, mudos e
falsamente inibidos como se estivéssemos a aprender. E como o moço teimava em discursar,
o cão cansou-se e acabou por se sentar, mostrando-se careca na área genital e
isento de pelo nos sovacos, contrariamente ao que a raça adianta. Como que
envergonhados, perguntámos-lhe o porquê daquele particular, ao que ele
respondeu ser marca de qualidade. E nisto não mentiu, já que o mestiço era de
primeira! E depois, o que importa o pormenor, a bem do dono e do animal, há que
deixar o homem feliz e convencido de que tem o melhor cão do mundo. Por isso não lhe
dissemos nada, nem sim nem sopas e deixámo-lo entregue à ilusão e à prosápia.
quinta-feira, 5 de março de 2015
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