Se os
gatos pudessem expressar-se como nós e lhes fosse dada a palavra, quando
questionados acerca dos cães, certamente falariam de genocídio, da terrível
mortandade que os lobos familiares têm infligido à sua espécie. E como gatos,
acusá-los-iam por desconhecerem a relação causa-efeito, não imputando aos donos
a responsabilidade de tais actos. É muito antigo o ódio dos caçadores pelos
gatos, porque estes felinos nas zonas rurais e do interior, à imitação do
lince, caçam aves e coelhos, tornando-se seus concorrentes, o que os coloca
imediatamente na sua lista de inimigos a abater. E como se isto não bastasse,
por alturas do “defeso”, nada melhor para aumentar o instinto de presa e a
tenacidade na caça do que atiçar os cães a um ou mais gatos afastados de casa!
Normalmente os cães saem vencedores daquela luta de predadores e só não sairão
se o número de gatos lhes for superior, mas não regressarão incólumes, já que
alguns carregarão lesões ou insuficiências para toda a vida, o que poderá
impedi-los de voltar a caçar, o que irá aumentar ainda mais a raiva dos
caçadores, primeiros responsáveis pelo disparate.
Apartando-nos
disso, importa falar sobre a coabitação entre cães e gatos, sabendo-se de
antemão que é mais fácil controlar um cão do que um gato. O gato tem tudo o que
um cão precisa para lhe dar caça, porque provoca, mostra-se bem e põe-se em fuga. No entanto a sua
coabitação é possível e pode ser plena, desde que se observem determinadas
regras. A maneira mais fácil de os familiarizar e sociabilizar passa por
adquiri-los em simultâneo e com idades aproximadas, o que facilitará a
identificação comum e a amizade entre ambos, sem os entraves territoriais que
despontam num e noutro com o crescimento.
As
cadelas aceitam com mais facilidade um gatinho recém-chegado, ao ponto de
criarem leite para o amamentarem. Contudo, essa aceitação irá depender da
liderança dos donos e das regras que adoptarem. Uma delas é dar-lhes de comer
em separado e a outra é a de fomentar o seu convívio, mostrando para a cadela
que o gato nos pertence e que faz parte
nosso grupo, apresentando-o várias vezes na nossa presença, conservando-o ao
colo e depois junto dela. No princípio do relacionamento importa proteger o
gatinho, que só deverá brincar com a cadela debaixo da nossa supervisão.
Passados alguns dias a aceitação será plena e a cadela adoptará o bichano (já
vimos cães e gatos a caçar em conjunto).
Os cães correctamente
ensinados, porque a sociabilização abrange o salutar convívio com homens, cães
e outros animais, aceitarão sem maiores reservas um gatinho, podendo mostrar-se
reticentes perante a chegada de um gato adulto, invasor do seu território, esquivo
e de atitudes inesperadas que aparece e desaparece quando menos se espera. Para
quem já tem um cão e pretende adquirir um gato, é melhor adoptar um gatinho do
que um gato já feito, até porque um felino nestas condições não morrerá de
amores pelo cão, fugirá da sua presença e esconder-se-á amiúde, podendo
atacá-lo de surpresa e causar-lhe algum dano (o contrário também pode suceder).
Quando já
se tem um gato adulto e se pretende adquirir um cão, importa proteger o
cachorro dos ataques do felino, que pode inclusive cegá-lo. Os gatos castrados
nesta situação poderão vir a reagir do mesmo modo, pelo que importa estar
atento e repreendê-los quantas vezes forem necessárias, não dispensando a
coerção se tal se justificar. Com o dono atento e o gato em “sentido”, por
força da habituação, a coabitação virá a suceder. É possível acontecerem
algumas escaramuças, pelo que importa estar alerta para se evitarem males
maiores e não alimentar a antipatia entre ambos. Se agirmos correctamente, o
cão virá a afeiçoar-se ao gato, a tornar-se seu companheiro e a defendê-lo.
Se tivermos um gato
adulto e adoptarmos um cão também adulto, a coabitação entre eles será mais
difícil e demorada, porque o gato defenderá o seu território com “unhas e
dentes” e o cão tudo fará para o desalojar. Se houver essa possibilidade, devem
ser atribuídos para ambos regras de protecção e territórios diferentes, para
facilitar a familiarização que induz à tolerância e à futura coabitação sem
maiores atropelos de parte a parte.
De
qualquer forma a coabitação entre cães e gatos é possível e muitos dos nosso
leitores podem prová-lo. A estratégia que melhor serve os nosso intentos passa
por adquirir ambos antes dos 4 meses de idade, para que a integração seja quase
automática e plena. Na Acendura Brava sempre tivemos gatos a circular dentro da
pista táctica, a descansar sobre os obstáculos e indiferentes aos cães, que
chegavam a passar por cima deles sem os incomodar. Havia inclusive um obstáculo
vertical designado por “gaiola do gato”, constante do perímetro exterior, onde
os gatos dormiam e os cães saltavam-lhes por cima sem se deterem. Dos muitos
gatos que ficaram famosos nas nossas hostes, o “PM” foi o que mais se
evidenciou, um siamês que procurava a companhia dos cães e que descia com eles
para a pista, chegando a segui-los na transposição dos obstáculos. Sobre este
assunto adiantaremos mais subsídios a quem nos solicitar.
Sem comentários:
Enviar um comentário