Como
preâmbulo ao tema, para desencanto de muitos, lamento reafirmar pela enésima
vez que nenhuma das raças formadas a partir do Cão de Pastor Alemão (CPA)
conseguiu ultrapassá-lo na sua capacidade de aprendizagem, excelente interacção
e rara versatilidade laboral; que não é necessário cruzá-lo com outras raças
para que venha a ser maior, porque a riqueza e o acerto nas suas dietas
dispensa facilmente a hibridação para esse fim, desde que se proceda a uma
política de criação de “quadro aberto”, evitando-se ao mínimo a consanguinidade
e a endogamia pela parceria entre as variedades dominantes e recessivas
presentes na raça. Com uma selecção assim é possível produzir cães com mais de
74 cm de altura e acima de 50 kg de peso, como outrora produzimos e que foi razão
de espanto para muitos.
Contudo,
aprendi pela experiência que um CPA macho para ser excelente não precisa de ter
65 cm ou mais e que os cães desta raça acima dos 68 cm ou são excepcionais ou
de pouco préstimo, acontecendo com mais frequência o segundo caso. Se há que
melhorar o CPA, esse beneficiamento deverá considerar a origem da raça e não os
seus recentes e adulterados sucedâneos, porque a infusão de sangue novo tem
potenciado a parte em prejuízo do todo que sempre enalteceu este excelente cão
alemão, que não sendo um especialista, é o mais multifacetado dos cães. A raça
não precisa que lhe acrescentem algo, mas que lhe devolvam aquilo que lhe
roubaram nos últimos 60 anos, pois não é um Ovcharka e a sua aptidão está a
anos de luz de um instintivo Malamute do Alaska.
Vamos ao KING SHEPHERD como forma de resposta a um email que me enviaram no passado sábado, dia 23 de abril e que dizia assim: “Boa tarde. Encontrei teu contato e estou em Curitiba brasil. Bom trocar informações. Você cria ou sabe que tem o king shepherd? Abraços. Atenciosamente (…)”. Originário dos Estados Unidos, o King Shepherd, para todos os efeitos um “designer breed”, foi desenvolvido a partir de 1990 pelos criadores norte-americanos Shelley Watts-Cross e David Turkheimer, através da hibridação do Cão de Pastor Alemão com outras raças, como foi o caso do Pastor de Shiloh e do Malamute do Alasca. Alguns autores, ao debruçarem-se sobre as origens desta raça híbrida, reconhecem a presença do Cão de Montanha dos Pirineus e do Akita na sua formação. Pastores Alemães de pêlo comprido originários da Europa também estão por detrás do King Shepherd, cujos criadores pretendiam que ostentasse uma pelagem comprida. A recorrência inicial ao Pastor de Shiloh (um híbrido de CPA com Malamute do Alasca) dizem, serviu para elevar as melhores qualidades do Pastor Alemão?!
O
propósito dos criadores desta raça híbrida era o de criar um cão semelhante ao
Pastor Alemão na sua natureza e aparência, contudo maior e com menos problemas
de saúde de origem genética, apesar de ser menos longeva do que o cão alemão na
sua origem. A meu ver, debaixo do pressuposto selectivo atrás adiantado, os
cães ganharam tamanho e perderam aptidão, tornando-se cães para adorar e não
para guardar, facto comprovado por muitos autores ao tratarem-nos como “fofos”
e “excelentes cães de companhia”, comportamento a que a grande infusão de
sangue spitz não é alheia. A raça continua em formação e não é ainda
reconhecida pelo AKC (American Kennel Club), mas já é reconhecida pela American
Rare Breed Association (ARBA), World Wide Kennel Club (WWKC) e Eastern Rare
Breed Dog Club (ERBDC), entre outras organizações menos conhecidas.
No geral, o King Shepherd é um excelente cão de família, particularmente para quem tem espaço, porque estamos a falar de um cão gigante, cujas fêmeas pesam entre 35 e 50 kg e medem de 63,5 a 68,5 cm; os machos pesam entre 41 e 68 kg e medem de 68,5 a 78,7 cm. Cão de grande adaptabilidade, vive bem dentro de um apartamento, não querer donos com muita experiência em cães, tolera amplitudes térmicas, mas não aprecia ficar sozinho. De fraco sentimento territorial, é amigo da família, recomendado para crianças e tolera com facilidade as pessoas estranhas. Tido como muito inteligente, é fácil de treinar, ladra pouco e raramente uiva, adora brincar e requer algum exercício diário.
O King Shepherd é acima e tudo um cão para se disfrutar, não para trabalhar, porque a excessiva infusão de sangue de Malamute do Alasca surripiou-lhe o melhor que o Cão de Pastor Alemão tinha para lhe dar, conservando deste apenas a aparência, pelo que aparenta uma coisa quando na verdade é outra, na diferença que vai entre uma arma a sério e outra de brincar, sendo por isso deficitário nas áreas da protecção e segurança, o que o coloca em “maus lençóis” quando usado para isso, porque ao ter uma presença intimidatória devido ao seu tamanho, os seus oponentes tudo farão para eliminá-lo. Adoro todos os cães, mas procuro para o meu gasto sempre os que são de trabalho, aqueles que me poderão valer a mim e aos outros, com os quais me entendo às mil maravilhas, que me socorrem quando for caso disso e que dificilmente me deixarão só. Quando era criança queria um cão para brincar, agora que sou maduro procuro um para me ajudar. Assim, não procuro um cão para adorar ou por me parecer bonito, mas um que faça equipa comigo e que zele pelo meu bem-estar por pior que seja a jornada, escolha que dificilmente recairia sobre o King Shepherd, rei só no tamanho, grande sem ser grande coisa. Por tudo isto, face ao Pastor Alemão na sua origem, considero o King Shepherd uma involução do excelente lupino germânico.
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