Depois
dos cruzados entre os grandes Molossos e os Pastores Alemães, animais outrora
usados para segurança de habitações, de grandes propriedades agrícolas e de unidades
fabris, cães por norma sem qualquer tipo de ensino, com pouca ou nenhuma interacção,
invariavelmente acorrentados e enraivecidos pela prisão, sucediam-lhes na
reeducação os “CÃES
DOS POMBA-MANSA (1)”,
animais que foram ensinados a atacar e que começavam por fazê-lo sobre os seus
donos e demais membros do seu agregado familiar, a quem não reconheciam
qualquer autoridade para comandar os seus destinos, fenómeno muito comum no
tempo em que os cães eram ensinados por uma terceira pessoa, geralmente
contratada e longe dos olhares dos donos. Com ou sem o consentimento dos
proprietários dos animais e quando não desse muito trabalho, na maioria dos
casos para seu próprio gozo, os contratados punham os cães a morder, ensinando
depois os donos a fazê-lo, o que ordinariamente resultava num tremendo
disparate, uma vez que a cessação dos ataques não era tão pronta quanto o seu
lançamento. Ataque após ataque, as dificuldades aumentavam e os cães passavam a
agir por modo próprio, ensurdecendo-se e revoltando-se contra o controlo dos
donos, que carentes de autoridade, com pouca ou nenhuma experiência e
portadores de um perfil psicológico impróprio, acabavam presas ou cobaias dos
seus próprios cães, temendo pela sua vida quando debaixo do mesmo tecto – o problema
persiste até aos nossos dias!
Como
não se consegue impedir um psicopata de ter filhos na sociedade em que vivemos,
do mesmo modo não se pode impedir que qualquer um compre indiscriminadamente um
cão, bastando para isso ter dinheiro para o comprar, por mais contra-indicado que
seja o animal naquele dono ao ponto de se constituir num divórcio
pré-anunciado. Cães duros dificilmente se compadecem de donos inseguros e
complacentes, indecisos e temerosos, gente que foge desesperadamente a qualquer
tipo de confrontação, grei de paz e não de guerra, que os cães acabarão por dominar
graças à sua impropriedade, excelentes companheiros que não nasceram para
liderar cães agressivos ou preparados para atacar. Por alguma razão, os
condutores mandatados para comandar cães assim - os profissionais - e não são
todos, sempre acabarão por ser objecto de alguma selecção. Sim, caros leitores,
sempre que iniciamos um processo de treino, estamos a adequar cães e donos para
que se entendam e alcancem a comunhão de objectivos, pois ensinamos binómios,
não donos e cães isoladamente. Debaixo deste conceito e atendendo também ao bom
senso, não podemos ensinar aos cães qualquer disciplina, comando ou utilidade
que esteja para além do controlo dos seus donos, o que a acontecer levará à destruição
dos binómios pela inversão da liderança, dispondo-se os donos às ordens dos
animais.
Como nem todos os cães servem para toda a
gente e vice-versa, na hora de escolher um, mais do que trazer aquele que mais
me encanta, importa escolher o que melhor se adequa ao meu feito e modo de vida,
características físicas, disponibilidade e expectativas, caso contrário podemos
assistir ao casamento forçado entre o insatisfeito e o infeliz, uniões que
continuam a engrossar de sobremaneira as fileiras da reeducação canina. Ao
longo da minha carreira fartei-me de ouvir gente a reclamar por cães de guarda
que nada tinha de seu para guardar a não ser as suas maluqueiras. Concluindo,
perante donos inapropriados, os seus cães não deverão ser ensinados a defender
e a atacar, o que poderá ter como consequências o dolo e a morte dos donos e de
terceiros. Treinador que brincar com o assunto está, ainda que levianamente, a
subsidiar o crime e a produzir algozes, a potenciar um comportamento social
assassino que não consegue dominar.
(1)O termo “Pomba-Mansa”, primeiro aplicado a uma estudante de medicina chamada Dulce, aplica-se entre nós aos condutores pacíficos, de bem com a vida, amantes da concórdia e avessos a conflitos, que nos procuram para alcançar cães com as mesmas características.
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