O Fogo-fátuo (do latim i̅gnis fatuus) é uma luz azulada
que pode ser avistada em pântanos, brejos, etc., uma inflamação espontânea do
gás metano (CH4) resultante da decomposição de seres vivos (plantas e animais
típicos do ambiente). São também fogo-fátuo as labaredas vindas dos túmulos nos
cemitérios, porque resultam da Fosfina (PH3) presente na decomposição dos
cadáveres, que se apresenta à superfície dos túmulos na sua forma gasosa, sendo
um gás altamente inflamável que se combusta à temperatura ambiente,
particularmente nos dias mais quentes. A ocorrência de um fogo-fátuo,
dependendo das circunstâncias e condições, pode despoletar um incêndio de
proporções muito maiores. E se por acaso for surpreendido por um fogo destes,
não se alarme e não fuja, porque ele segui-lo-á devido à deslocação do ar
produzida pelo movimento do seu corpo (deixe-o arder).
Não é de química que queremos tratar aqui mas de uma raça que entendemos
encontrar-se moribunda: o Cão de Pastor Alemão, que sobrevive hoje pelas
memórias do passado, tal qual fogo-fátuo que se ergue sobre as campas dos
finados. Pelas nossas contas, a raça encontra-se em decadência há mais de 50
anos, vindo a ser gradualmente substituída por outras nos serviços que a notabilizaram.
Aos gloriosos cães de outrora (guardas, policiais e militares), que sempre são
mencionados na venda dos actuais, sucedem-lhe agora os esganarelos do presente,
cães de lastimável apresentação, de biomecânica periclitante e muitos deles
disfuncionais, ora lembrando miniaturas dos seus protótipos ora recordando as
primeiras bicicletas (as de Pierre Michaux ou as Penny Farthing) cuja roda
dianteira, para além de ser pedaleira, era substancialmente maior que a
traseira (estes cães sobrecarregam em demasia as mãos).
Raros são os Pastores Alemães actuais verdadeiramente aprumados e
robustos, sendo natural encontrá-los de peito estreito ou invertido, com
exagerado abatimento de metacarpos, mãos divergentes, parcos de ossatura e
cabeça, de codilhos afastados, com os ossos a romper a pele e com jarrete de
vaca, havendo cães com peso de cadelas e cadelas com peso abaixo do estalão, em
tudo idênticos ao Malinois que porventura lhes serve de inspiração. Não
obstante, sobra ainda a falácia de alguns eruditos, que não tendo quem os
contradiga, adiantam que o Pastor Alemão para ser bom, tem que ser pequeno
(para a carteira não será mau, tanto para quem vende como para quem compra)
Estes desaprumos e menos valias acabam por interferir no bom desempenho
atlético destes cães, promovendo-lhes dificuldades na transição dos andamentos
naturais, dificultando-lhes a sua escalada, levantando-lhes problemas na
transição de saltos contínuos, extenuando-os e tonando-os irritadiços ou
carentes, mais sensíveis às contrariedades e necessitados de maior estímulo, o
que lamentavelmente nada abona a favor da sua autonomia funcional, por lhes
faltar a segurança e o equilíbrio para o desempenho esperado. E como tarde é
aquilo que nunca chega, ainda que timidamente, aqui e ali começam a aparecer
exemplares capazes, muito embora o seu número não chegue para contrabalançar o
montante dos desprezíveis, que continuam a proliferar e a ser vendidos à custa bom-nome
dos Pastores há muito enterrados e que nada têm a ver com eles, de quem são uma
ténue e pálida imagem, fogo-fátuo de uma glória que não lhes pertence.
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