O Cão
Leopardo da Catahoula, “Louisiana Catahoula Leopard Dog”, depois de ser
adoptado como cão oficial da Louisiana em 1979, é um cão de origem incerta e de
linhagem tão obscura quanto a sua aparência. Existem duas teorias relativas à
sua origem, uma atribuída aos Índios norte-americanos e outra aos colonos
franceses que se radicaram na Louisiana. A primeira diz que o cão resultou do
cruzamento de cães índios com os molossos de Hernando de Soto, no Século XVI e
a outra que resultou do cruzamento entre o Beauceron e o Lobo Vermelho, três
séculos mais tarde. Também não se sabe ao certo qual a origem do seu nome, pois
há quem diga que resultou da aglutinação de duas palavras indígenas e outra que
é produto do seu afrancesamento. Discussões à parte, enquanto cão de trabalho,
o Catahoula foi seleccionado pelas suas qualidades e temperamento e não pela
estética, o que tem levado muitos a considerá-lo como “cur” (rafeiro/mestiço),
também devido às diferenças do seu tamanho e características físicas,
disparidade sustentada por 3 linhas de criação diversa: Wright, Fairbanks e
McMillin, que acabaram por acasalar entre si (apesar de reconhecida pelo AKC, a
raça ainda não foi reconhecida pela FCI).
O que torna este cão único é sua aparência bizarra,
com um ou dois olhos vítreos ou cada um metade colorido, o que lembra vidro
rachado, e uma pelagem próxima do Cavalo Appaloosa ou do Dog Alemão Arlequim,
para além da sua especialidade, que faz toda a diferença, a de subir às árvores
(daí o termo leopardo), graças à morfologia das suas patas, que têm membranas
interdigitais, funcionando como ventosas e que se prestam também e muito bem,
ao seu desempenho dentro dos pântanos quando obrigado a nadar. Bom trepador e
exímio nadador, o Catahoula é um caçador anfíbio, exímio e inveterado, que nada
dá descanso a esquilos, guaxinins, javalis, leões da montanha, ursos negros e
veados, assim como a qualquer animal doméstico se não for convenientemente
sociabilizado, servindo ainda como pastor de varas e manadas, encontrando-se nisso
apto para prestar provas de trabalho. Extremamente resistente, ele consegue
bater grandes distâncias sem se cansar, perseguindo a presa silencioso e sem
denunciar a sua presença, fixando-a primeiro e atacando-a depois. Graças às
suas qualidades de pastor e caçador, já chegou à Austrália e Nova Zelândia,
onde os seus créditos foram confirmados. Sem dúvida que aqui faria furor na
caça ao javali. Ultimamente, por influência de alguns vídeos na Internet e a
conselho da insanidade, muitos cães viraram Catahoulas e passaram a amarinhar
pelos troncos de árvores, sem membranas interdigitais e sem certeza de isenção
da displasia do ombro, o que é um claro atentado à saúde desses pobres animais.
Como guarda, por ser mais defensivo que ofensivo,
este cão presta-se mais ao alarme do que à captura, apesar de ser territorial,
o que não impede de capturar por intercessão ou de surpresa, sendo mais lesto e
espevitado na perseguição. Contudo, exactamente por ser defensivo, pode cortar
qualquer estranho que lhe force o convívio ou que lhe surja sem avisar. Quando
devidamente sociabilizado para o efeito (logo desde tenra idade), pode vir a
constituir-se num óptimo cão de busca e salvamento, tanto dentro como fora de
água. Próprio para o canicross e para o agility, será um excelente cão de
obstáculos e virá a ser um bom animal de companhia desde que não lhe outorguem
a liderança, lhe estabeleçam regras e o sociabilizem cedo, porque tem como
tendência varrer qualquer animal da sua frente e agredir quem lhe toque no
prato da comida. Mas se por um lado isso é mau e indesejável, por outro, este
cão pode ser um excelente guardião de capoeiras, expulsando texugos-çães,
saca-rabos, doninhas e raposas. Por estas razões, nem todos poderão ter um cão
desta raça, já que tende a dominar tudo e todos para impor a sua vontade,
apesar de muito dedicado e protector da família. Quando criado com as crianças,
rapidamente se tornará num excelente bodyguard da pequenada.
O
Catahoula atinge a maioridade emocional aos 2 anos de idade. Muito embora seja
de propensão independente e dominante, ele apresenta um bom impulso ao
conhecimento, é versátil e cúmplice, desde que não o isolem e o condenem à
inactividade, factores que geralmente o induzem a grande destrutibilidade, a
mordiscar tudo o que se move e lhe passa pela frente (crianças, corredores,
outros animais, bicicletas e viaturas automóveis, porque foi criado para o
ofício cinegético, é um atleta em potência, extraordinariamente vigoroso, activo
e excursionista (tanto como um Border Collie, um Jack Russell Terrier ou Braço
Alemão de pêlo curto), o que irá reclamar uma interacção diária com o dono,
trabalho e algumas léguas de passeio. Seria o cão indicado para um monte
alentejano ou propriedades rurais com alguns hectares. A transição de alvos
(dos animais para as pessoas) não é tarefa fácil, muito embora possa ser facilitada
pelo exemplo dum cão de guarda tipo, mais velho, dominante e nisso indutor. Na
hora da mestiçagem em que vivemos, já houve quem beneficiasse os seus Pastores
Alemães com Catahoulas, no intuito de verem aumentada a sua versatilidade e a
rusticidade, na idílica procura do super-cão.
O melhor
aproveitamento das características do Catahoula assenta sobre dois pilares:
liderança e sociabilização, liderança para alcançar o fim útil e sociabilização
para lhe fortalecer o carácter, porque importa dominá-lo e levar de vencida os
seus instintos, ataques inusitados, desconfiança e temores, para que não venha
a tremer diante de qualquer um ou a agredir alguém com um comportamento
diferente, independentemente da atribuição que venha a alcançar. Para além da
necessidade de exercício diário, o Catahoula necessita de um abrigo quente se
ficar no exterior, não tanto no nosso clima mas noutros com temperaturas mais
baixas durante o Outono e Inverno. Morfologicamente estamos a falar dum cão do
médio para o grande, de características molossóides, de cabeça larga, crânio
achatado e rectangular, peito profundo (o que indicia um coração potente e boa
capacidade pulmonar), maioritariamente de pêlo curto, com membros robustos e sólidos
e cauda em arco, com uma esperança média de vida dos 12 para 13 anos. A sua
altura oscila entre os 51 e os 70cm, respectivamente nas linhas McMillin e Wright
e o seu peso entre os 16 e os 50kg, muito embora o projecto do seu estalão
avance menor disparidade (de 16 para 37kg e de 51 para 61cm).
O
Catahoula apresenta três tipos de manto, um bastante curto e rente à pele
(descrito como “coat slick”), outro de pêlo comprido e finalmente um lanoso
(coat wooly-wooly). Nem todos os Catahoulas têm pelagens arlequins por acção de
gene dispersor “merle”, que não actua na totalidade do manto dos cães mas que
dilui as cores somente nas áreas que apresentam aleatoriamente a sua presença,
subsistindo indivíduos de cor sólida, normalmente castanhos, vermelhos,
cinzentos e pretos, que podem apresentar manchas brancas na cabeça, no peito e
nos membros, havendo ainda alguns tigrados. Entre os portadores do gene merle,
sobressaem os vermelhos (mesclados de castanho e afogueado), os azuis
(mesclados de cinza e preto), os pretos (com pouquíssimas manchas azuis ou
cinza) e os cinzentos, podendo todos evidenciar algumas manchas brancas nas
áreas já citadas. Para além destes, existem ainda exemplares tricolores, alguns
que combinam cinco cores e outros maioritariamente brancos, com pequenas malhas
de cor sólida ou totalmente invadidos pela presença do gene merle (os
“patchwork”). Independentemente do tipo e da cor do seu manto, os Catahoulas
não exigem cuidados adicionais na sua escovagem diária. Como a raça é
proeminentemente branca, a surdez é o maior dos seus problemas, podendo ser
total ou reportar-se somente a um dos ouvidos. Alguns cães apresentam problemas
de visão e displasia da anca, mas com valores menores aos encontrados noutras
raças. Eventualmente, chegada a velhice, alguns exemplares virão a sofrer de
cancro.
O
Catahoula, para além das atribuições que já manifestámos, pode ainda
constituir-se num bom detector de componentes explosivos ou de elementos
químicos. Graças à sua selecção para o trabalho, robustez física, propensão trepadora,
características anfíbias, diferentes tamanhos, mantos e cores, a raça tornou-se
universal e capaz de fornecer indivíduos para todo e qualquer ecossistema,
garantindo os mesmos índices laborais. Caso raro no panorama da canicultura
mundial, fortemente dominado pelas diferenças estéticas e desconsiderando as
aptidões caninas, o Catahoula pode ser considerado “o rei dos cães”, um
património da América para os americanos, tantas vezes enfeitiçados pela Europa
e por vezes fixados nas últimas tábuas do “Mayflower”, apesar dos estaleiros e
docas de Rotherhithe já não existirem. Oxalá não vão atrás de modas e valorizem
a prata da casa, potenciem a raça e venham a servir-se dela como melhoradora
doutras, já que pouco se espera da mui estagnada cinotecnia europeia.
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