sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

WEIMARANER: PAU PARA TODA A COLHER

Caso não fossemos adeptos incondicionais do Cão de Pastor Alemão, o que não nos impede de reconhecer as mais-valias presentes noutras raças e de as apreciar, o Weimaraner seria o nosso cão de eleição, porque é multifacetado, versátil, atleta, valente e enérgico, um verdadeiro ícone no mundo canino. Pouco visto até ao final da década de 80, prolifera hoje entre nós e a esmagadora maioria dos seus proprietários sente-se feliz ao seu lado. Apesar de ser por vezes teimoso e exigir um dono assertivo, a sua polivalência distancia-o dos outros bracos, porque para além de caçador inveterado, o Weimaraner pode abraçar qualquer disciplina cinotécnica, desempenhando-a superiormente e competindo com os melhores. Presta-se como animal de companhia e companheiro de brincadeiras, pode ser um excelente cão de resgate e um valente guardião, porque alia à sua extraordinária “máquina” sensorial uma morfologia dinâmica e robusta, visível na junção entre a velocidade e a força, o que o capacita também como atleta para o agility.
A variedade de pelo curto, a mais vista entre nós, durante a fase de crescimento e nas estações mais frias, acusa as baixas de temperatura, chegando alguns cachorros a tremer. Uma vez atingida a sua maturidade sexual, o fenómeno tende a desaparecer. Como o seu stop é pouco pronunciado e os seus olhos são de cor âmbar, tende a encandear-se na época estival, nas horas de maior luminosidade, entre 11 e 14 horas, pelo que não ser convidado para a prática de obstáculos nesse período, em especial diante daqueles de pouco contraste. O facto de ter o pelo curto e de ser azul, leva-o por vezes a perder o pelo nos codilhos e a adquirir calosidades nessas áreas e nos curvilhões, nada que uma aplicação de um creme gordo não resolva. O particular do nosso clima (temperado marítimo), devido ao percentual de humidade, compromete a sua saúde articular, induzindo-o a artroses precoces, isto quando privado do exercício regular que exige. Por estas razões e também porque reconhecemos a importância da cauda para a orientação e travamento dos cães, mais depressa adquiríamos um exemplar de pelo comprido do que um de pelo curto.
Resistente e célere, com mãos para todo o terreno, uma garupa invejável e com um excelente desempenho dentro de água, não apresentando entraves a trabalhar em altura e no subsolo, o Weimaraner é um multiusos que até se presta para cão-guia. Nobre, valente e decidido, é um cão que tem muito para dar e que veio para ficar, que não cessa de surpreender os seus donos a cada dia que passa. Temos cão!

JÁ O CÃO ESTAVA FARTO DE SER CÃO, AINDA O LOBO NÃO ERA NEGRO

Descobriu-se recentemente que a coloração negra visível nos lobos europeus e americanos é devida à hibridação com os cães, que lhes transmitiram esse gene, o que deverá ter acontecido nos últimos 10.000 anos, porque antes disso tal gene não constava no genoma dos lobos, como não consta nos actuais de outras variedades cromáticas, o que torna estes lobos negros, no que à sua coloração diz respeito, devedores dos cães. As conclusões são do Prof. Gregory Barsh, da Universidade norte-americana de Stanford, na Califórnia. A notícia desta descoberta científica parece dar razão aos criadores de Pastor Alemão Negro, que o consideram mais cúmplice e menos instintivo, mais versátil e menos recalcitrante, do que os seus congéneres doutras colorações, possivelmente por ser cão há mais tempo e se mostrar menos silvestre. Hoje, os lobos negros europeus existem somente em Itália, preenchendo apenas 1/5 da população total de lobos naquele espaço geográfico, sendo essa coloração mais numerosa na América do Norte.

DE VOLTA AO IMPULSO AO CONHECIMENTO

O impulso ao conhecimento canino pode ser descrito sucintamente como a curiosidade que leva ao querer compreender. Durante anos dedicámo-nos ao seu reforço nos nossos cães, testando grande número deles para efeitos de reprodução, o que tornou exímia a nossa linha tanto na cumplicidade como na utilidade. Alcançaram particular destaque os nosso cães negros, os descendentes do Warrior d’Acendura Brava e o Kyrios-Schwartz da Quinta do ABC, o que veio a tornar todos os nossos preto-afogueados recessivos na variedade negra. Estes cães, para além de assimilarem mais de 40 comandos verbais e de lhes responderem prontamente noutras linguagens, facilmente respondiam a palavras código dentro de discursos extensos e descontraídos, tornando imperceptível o despoletar das suas acções para os estranhos. Naturalmente observadores, destacaram-se nas disciplinas de Obediência e Guarda. Na primeira pareciam ter já nascido com um chip para o efeito e na guarda conseguiam combinar meios sonoros ou electrónicos para maior efectivação da sua vigilância.
Mas o que os tornava verdadeiramente excepcionais era o estudo que faziam dos indivíduos à sua frente, como se adivinhassem as suas intenções ou soubessem destrinçar diferentes situações, sendo altamente fiáveis, objectivos e eficazes nas capturas, que executavam a partir do ponto mais fraco dos indivíduos, dominando-os de imediato, para já não se falar que conseguiam atacar alvos imóveis. Naturalmente eram pouco subornáveis e nada dados a escaramuças entre iguais, constituindo facilmente matilhas com propósito definido, mesmo sem treino prévio. Ainda que os donos intentassem disfarçar, eles conseguiam entender os seus estados de espírito, solicitando-lhes a alegria e o ânimo que momentaneamente lhes faltava. Hábeis em abrir portas, a cortar corda e a soltar-se, progrediam em silêncio durante a noite ou quando as situações o exigiam, dispensando o reparo dos seus condutores. Pouco instintivos e de fácil controle, aceitavam a novidade de desafios com alegria, aprendendo uma figura, um trajecto ou uma nova progressão sem maiores delongas. Conseguiam diferenciar e transportar em média 25 acessórios (pertences dos donos, brinquedos e até ferramentas), dentro de água, entre labaredas e subindo escadas. Escrevemos este texto para aqueles que hoje usufruem da companhia e cumplicidade dos seus descendentes, para que melhor os conheçam, os honrem e não os subaproveitem. 

quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

EXCEPCIONALMENTE PORQUE SÃO RAROS

Excepcionalmente, porque não é nosso objectivo vender cachorros mas reflectir sobre a cinotecnia, damos notícia de uma ninhada de pastores alemães, propriedade do Sr. João Oliveira, nascida a 11 de Novembro de 2014, onde nasceram 4 exemplares fígado (vulgo chocolate), raros por estas paragens. Os cachorros descendem da nova linha evolutiva da raça, mostram-se atentos e apresentam uma ossatura e desenvolvimento invejáveis, conforme atesta fotografia seguinte.
Neste momento, o seu proprietário tem para venda 3 machos e sugeriu-nos que o ajudássemos na sua divulgação, pedido que aceitámos de bom grado, atendendo ao particular da variedade cromática e ao seu contributo para a multivariedade desejável nos pastores alemães, hoje saturados e de menor préstimo, diante da novidade dos pressupostos selectivos que se contradizem na consanguinidade e na endogamia. E nesse sentido, embora sem o esperar, está o Sr. João Oliveira de parabéns. Tivemos oportunidade de ler os pedigrees dos pais da ninhada e confirmámos a sua ascendência em Arminius. Os pastores alemães fígado, que remontam às origens da raça, são por norma cães atentos e seguros, mais dados à cumplicidade do que ao disparate, o que automaticamente os transforma em excelentes cães de defesa e companhia. Quem estiver interessado e quiser saber mais detalhes, pode ligar para o nº 932 084 085 ou enviar um email para joãololiveira13@gmail.com .

A FACE OCULTA DA CANICULTURA

A canicultura é um relicário de crenças filosóficas, religiosas, políticas, culturais e científicas, baseada na procura de diversas harmonias, que espelham em cada raça o carácter iniciático e expectante dos seus criadores, segundo os seus conceitos de vida, criação e evolução, enquanto agentes transformadores mais ou menos sincréticos, como reflexo da sua inquietação no tempo que os cativou. Por detrás de cada raça, para além dos propósitos enunciados e do produto que temos na frente, escondem-se pressupostos, inquietações e desejos que, transportados para os cães, divergem, atentam ou superam a sua selecção natural. Mais do que discutir genealogias caninas, versões adulteradas dos modelos originais, importa conhecer as aspirações dos homens que criaram as distintas raças, tantas vezes debaixo de propósitos até aqui omissos e que assim massificaram os seus desejos mais ocultos. Para melhor compreendermos os cães que temos hoje, libertá-los dos entraves do passado, tirarmos deles maior proveito e operamos a sua selecção, importa conhecer e estudar os seus autores, o seu particular individual, social, cultural e científico, porque alteraram os cães conforme às suas expectativas.
Em todas as raças se pode ver o dedo de Darwin e Galton, mas não são únicos, pois nalgumas também estão “pedreiros livres”, gente simples e douta, perseguidores do Santo Graal, adeptos de fórmulas clássicas, muitos místicos e um sem número de filantropos e revolucionários, ainda que por vezes inconfessos ou encobertos, que produziram cães utilitários, lúdicos e bélicos, de acordo com os seus conceitos estéticos ou como resposta a necessidades. A compreensão dos criadores originais melhorará a nossa comunicação com os cães, enquanto criaturas de quem os idealizou, massa dos seus anseios. Assim, tratar de cães não irá dispensar o conhecimento mais aprofundado dos seus arquitectos. Convém não afirmar o já gasto e sem comprovação, estudar e ir mais além, colocar em dúvida o que comummente se aceita e reflectir sobre aquilo que nos chega, até porque a ignorância a ninguém serve, e isto antes de alcançarmos os inevitáveis jardins de pedra, com jarras de água choca e flores murchas, onde o silêncio impera e aguarda pelo esquecimento. Só o apego ao conhecimento justificará estar na canicultura, labutar na cinotecnia e ser cinófilo.

OS CHINESES FICAM COM A FAMA E OUTROS COMEM GUISADO DE GATO

Sempre ouvi falar da Suíça e dos suíços com muito apreço, como um bastião de civismo e uma sociedade modelo, onde nenhum papel esvoaça pelas avenidas, não se vêem beatas no chão nem latas de refrigerantes nas bermas das auto-estradas, apesar de isolada nas montanhas e do seu povo ter sido originalmente pastor. Ao tomar conhecimento de uma notícia divulgada pela Reuters, datada de 26 de Novembro de 2014, nem queria acreditar nela, julguei-a resultante de pirataria informática e obriguei-me a confirmá-la. Nela pude ler: “Um grupo de cidadãos apostado na Defesa dos Direitos dos Animais apresentou uma petição ao governo suíço para proibir uma prática tradicional, ainda que rara, a de se comerem gatos no jantar de Natal e de se transformarem cães em salsichas. Segundo Tomi Tomek, Presidente do Grupo pelos Direito do Animal SOS CHATS NOIRAIGUE, cerca de 3% da população ainda come gato e cão, não havendo como denunciar os seus consumidores à polícia, porque não existe nenhuma lei contra essa prática e consumo”.
A Suíça tem actualmente, 7,8 milhões de habitantes, o que feitas as contas, dá cerca de 234 000 consumidores daquelas “iguarias”! Será que foi para lá igual número de chineses, que ao tornar-se cristão, celebra o Natal? Não me acredito que os emigrantes portugueses, espanhóis, italianos e turcos, se deliciem com tal manjar!  O gato é consumido em forma de cozido, em substituição do coelho, na época natalícia e a carne dos cães é transformada em salsichas, aproveitando-se a sua gordura para dar combate ao reumatismo. E quem pensar que tal acontece nalguma recôndita encosta engana-se, porque ele é comum nos Cantões de Berna (o Bouvier Bernois dava cá uns bifes!), Lucerna e Jura.
Caso os russos não fossem tão biqueiros, agora que o preço da comida está pela hora da morte naquelas paragens, com os cães vadios que há em Moscovo e noutras grandes cidades, não passariam por tantas dificuldades. E os portugueses? Realmente são muito esquisitos! Com o desemprego, a miséria e a fome que por aí vão, só padecem porque querem (razão tem a Merkel), porque com tanto cão e gato abandonado, não faltaria comida para as famílias e o seu jantar de Natal seria farto (dava até para convidar os amigos). E já agora, porque não “bifar” o gato do vizinho que vem urinar nos nossos vasos ou o cão da vizinha que não pára de ladrar? Não estarão mesmo a pedi-las? Já estou a imaginar as associações de recolha de animais transformadas em dependências do Banco Alimentar Contra a Fome. E os velhos, meu Deus, agora que o Serviço Nacional de Saúde faliu e não têm dinheiro para comprar medicamentos, porque não se jogam aos cães e os espremem, deitando mão à sua gordura para alívio das artroses? Cá para mim, a culpa é dos Romanos, que nos tempos áureos do seu Império impuseram às tribos germânicas comer cão, elas tomaram-lhe o gosto e a penitência virou tradição. Uma coisa é certa: se já não entrava num restaurante chinês e não comia salsichas, muito menos entrarei num suíço e, jantar de Natal em casa de helvéticos, à cautela, só depois de ver a cabeça do animal!
Ironia à parte, porque o caso é sério, com a miséria humana não se brinca e os animais domésticos merecem-nos todo o respeito, há que denunciar e impedir os maus hábitos destes bárbaros, cujo número à partida deverá estar inflacionado, ainda que “em tempo de guerra não se limpem armas”. Com que direito condenamos os chineses, se ainda fazemos pior? É preciso ter descaramento! Por vezes, parece valer a pena vir da parvónia!

THEY ARE GONE

Saíram de Lisboa pela manhã de hoje, a Joana e o Radar, rumo ao porto de Santander, onde irão apanhar o ferry rumo a Portsmouth, que os colocará em Inglaterra de regresso a casa (o João espera-os impaciente). Pela frente terão 800km de estrada e horas infindas sobre o Atlântico. Queira Deus que tudo corra bem, ficamos a aguardar notícias. Nas semanas que cá estiveram, participaram nas aulas colectivas e ainda apadrinharam as pastoras vermelhas, que agora despertam para o trabalho, em classes no exterior, onde se deu prioridade às disciplinas de pistagem e de guarda. Para além de ter sido fotógrafa, a Joana auxiliou os demais condutores nos seus afazeres, não se escusando a vestir o fato de ataque e servir de cobaia, para além de ter sido leitora nas aulas teóricas. Como aos amigos não se agradece, antes se anseia a sua presença, não vemos a hora de os tornar a ver! No meio disto tudo, o Radar aproveitou para fazer o gosto ao dente, tarefa do seu agrado que não esqueceu (estava mortinho, segundo a Joana). Bons ventos os levem para casa e outros ainda melhores os tragam de volta. Força Joana, sempre em frente Radar!

QUAL SERÁ O MOTIVO (XIV)

O Bat é um Bulldog Francês muito asseado, tem agora 2 anos e logo desde pequenino deixou de fazer as necessidades em casa, contrariamente aos outros machos da vizinhança, que só depois da maturidade sexual conseguiram controlar-se. Como é muito afável com toda a gente, os seus donos não o mandaram castrar. No Domingo passado, os seus donos receberam visitas em casa e como trouxeram consigo um cãozinho, para evitar maiores confusões e todos poderem estar à vontade, o Bat foi posto no quintal, retornando a casa depois da saída das visitas. Inesperadamente, começou a urinar por tudo o que era canto, para espanto dos seus proprietários e desconsolo da dona, que de esfregona em punho, dizia mal da sua vida. Porque teria o cão procedido assim? Hipótese A: Agiu por revolta, porque foi posto na rua. Hipótese B: Sentiu o cheiro do outro cão e começou a marcar o território. Hipótese C: Bebeu água em demasia no quintal. Hipótese D: Deveria ter ficado mais tempo no quintal. Hipótese E: Urinou para que lhe dessem atenção. Para a semana adiantaremos a hipótese correcta e cá estaremos com um novo caso. 

SOLUCÃO DA SEMANA ANTERIOR

A resposta certa para esta rubrica da semana passada (QUAL SERÁ O MOTIVO (XIII)?) é a Hipótese D: Porque o filho do casal lhe tinha dado comida confeccionada. A “Hipótese” A não faz qualquer sentido. Como a voracidade pela ração não desaparece de um momento para o outro, a “Hipótese B” deverá ser descartada. O medo da possível saída dos donos difcilmente lhe tiraria o apetite, ainda por cima eram raras as suas ausências, o que torna a “Hipótese C” pouco ou nada provável. A “Hipótese E”, enquanto reparo aos donos, é rebuscada e fantasiosa. 

RANKING SEMANAL DOS TEXTOS MAIS LIDOS

O Ranking semanal dos textos mais lidos ficou assim ordenado:
1º _ O CÃO LOBEIRO: UM SILVESTRE ENTRE NÓS, editado em 26/10/2009
2º _ PASTOR ALEMÃO X MALINOIS: VANTAGENS E DESVANTAGENS, editado em 15/06/2011
3º _ A CURVA DE CRESCIMENTO DAS DIFERENTES LINHAS DO PASTOR ALEMÃO, editado em 29/08/2013
4º _ EU QUERIA UM PASTOR ALEMÃO, DE PREFERÊNCIA TODO PRETO, editado em 05/06/2010
5º _ O ESTRANHO ANÚNCIO DOS PASTORES ALEMÃES CASTANHOS, editado em 26/04/2013

TOP 10 SEMANAL DE LEITORES POR PAÍS

O TOP 10 semanal de leitores por país ficou assim escalonado:
1º Portugal, 2º Brasil, 3º Estados Unidos, 4º Alemanha, 5º Rússia, 6º Índia, 7º Angola, 8º França, 9º México e 10º Japão.

sábado, 24 de janeiro de 2015

UMA LOBA BOA

Em miúdo nunca acreditei em duas histórias: aquela em que o Menino Jesus descia pela chaminé e ia pôr as prendas no sapatinho e a do Lobo Mau, a primeira porque não ma deixavam presenciar e mandavam-me para a cama e a segunda nem sei bem porquê, quiçá por gostar de animais e não temer o bicho. A Loba que vos apresento aqui, surpreendida pelas fotos na pistagem, é uma pastora alemã vermelha, irmã da Dharma, também filha do Red e propriedade do Rui Santos, que para além doutras qualidades, é rápida e objectiva na procura de pessoas desaparecidas ou carenciadas de socorro, advindo disso a qualificação de “boa”.
Observando as fotos deste artigo, que se encontram em sequência, facilmente compreendemos a avidez da cadela em encontrar o seu dono, que depois de lhe apanhar o rasto e de ter visto o seu pulôver, rapidamente o descobriu. O que as fotos não mostram, porque ninguém esperava, foi o que fez a seguir, quando carregou o pulôver e foi levá-lo ao dono. Conduzida pelo Ricardo neste trabalho e apostada em se soltar para dar com o Rui, foi mordiscando o pobre miúdo, que nalguns trajectos parecia atormentado por uma praga de pulgas!
Já portadora de uma obediência inquestionável, a Loba mostra igual aproveitamento na guarda e na pistagem, retomando as tarefas e os louros dos seus antepassados, também eles exímios nestas três disciplinas cinotécnicas. Para além de ter sido agraciada pela genética, a Loba teve a felicidade de encontrar o Rui, um condutor experiente, dedicado e cúmplice, que torna fácil a comunicação interespécies. Temos binómio!

O CIRCO ESTÁ DE VOLTA!

Sempre que pronuncio a palavra Circo, sinto de imediato um amargo de boca, avassala-me uma imagem e a tristeza toma conta de mim, porque me lembro de ter visto, há meia-dúzia de anos atrás, nas traseiras da “Casa do Artista” em Carnide, lar condigno prás gentes do espectáculo, os outrora artistas de circo, que tal qual refugiados, sobreviviam acantonados em decrépitas roulottes, apodrecendo dentro delas sem o mínimo de condições, andrajosos, esquecidos e a obrarem atrás das árvores. Que triste fim para quem fez a alegria da pequena ao longo de gerações! Felizmente, ao que se consta, parece que já foram ou estão a ser realojados. Todos sabemos que o circo está mais pobre, que cada vez mais tem menos animais e que eles funcionavam como cabeça de cartaz (chamariz). Apesar de haver menos companhias circenses e a frequência dos seus espectáculos ser menor, o circo continua, ainda que com artistas diferentes, alcançando maior público, segundo o imortal fascínio exercido pelos animais, que de deuses a demónios, já foram de tudo um pouco.
A moda agora é levar cães para os concursos televisivos, competir por conta das habilidades dos canitos, num espectáculo mais circense do que artístico, baseado em truques e não na técnica, à imitação do que sempre vimos fazer debaixo de velhas tendas embandeiradas. A novidade não provoca estranheza, até porque há pais que sacrificam a carreira dos filhos por conta duns quantos euros (que dão um jeitão do caraças), quando os remetem para séries e telenovelas, aproveitando-se da sua ingenuidade, inexperiência e natureza sonhadora, aumentando-lhes assim a confusão entre a ficção e a realidade, para além de os exporem precocemente a um sem número de toleimas e de perigos desnecessários. Por detrás do aumento das prestações caninas televisivas três factores se levantam: a necessidade de audiência, o sucesso que tem sido o César Millan e a histórica paixão dos portugueses pelos cães. Ainda que noutro formato, o circo está de volta e os cães continuam a prestar-se para quem procura as luzes da ribalta, palhaçadas que não escondem, mais uma vez, a exploração dos animais. Realmente é verdade: tendo a sua côdea para comer, do que o povo mais gosta é de circo! 

O AUXÍLIO DA MATERNIDADE

Com alguma dificuldade e relutância, diante do bem-estar que é devido aos animais, ainda conseguimos aceitar a castração dos cães abandonados, que entendemos como um mal necessário. O que não nos entra na cabeça é a castração dos que têm dono, são saudáveis e ostentam pedigree. Bem sabemos que o paradigma castrante a que assistimos, tem como objectivo a supressão de tumores no útero, o que não evitará que as fêmeas, sendo de propensão cancerígena, não venham a sofrer de tumores noutros órgãos ou aparelhos. Por detrás desta política “do mal, o menos”, esconde-se o comodismo de muitos donos, que não querendo ser incomodados, acabam por castrar também os machos, na esperança da sua maior mansidão. Sim, porque a lei relativa aos cães perigosos está aí! Grande número de proprietários de cadelas, ainda que se justifiquem a castração dos seus animais pela razão profilática, o que não quer é ter chatices, uma prenhez inusitada, um magote de cães à porta de casa ou sair à rua com uma matilha atrás de si. Graças a esta política de castração, ainda que a lei obrigue ao uso da trela na via pública, eles soltam os seus cães por toda a parte e lêem comodamente o jornal num banco de jardim, certos de que a liberdade dos animais não lhes trará problemas de maior. Ora, se isto não é puro especicismo, eu vou ali e já venho!
Pondo de parte esta filosofia, tornada soberana pela conveniência, e porque nos importa valer aos cães, vamos tratar da importância da maternidade para o bem-estar psíquico e social das cadelas, nomeadamente das menos confiantes e mais receosas, muitas delas também “à brocha” com o bisturi, o que não deixa de ser um tremendo disparate, face ao agravamento dos seus medos, resistindo algumas a sair à rua, a escapar-se diante doutros cães ou a ganirem por tudo e por nada, mercê da amputação que transtornou o seu viver social. O recurso à maternidade sempre foi usado na cinotecnia para o robustecimento do carácter das cadelas, para potenciar o seu impulso à defesa e torná-las mais seguras e menos esquivas, potenciação naturalmente propiciada pelo instinto maternal. Quer queiramos ou não, as cadelas nasceram para parir, precisam de ser mães, necessidade que leva algumas à ilusão da prenhez, enveredando pela pseudociese. Apesar do exercício da maternidade fortalecer o impulso à defesa, ele não aumentará de acordo com o número de ninhadas, a menos que determinada cadela se veja obrigada a esconder os seus filhos, por senti-los mal acomodados ou constantemente importunados.
Assim, aconselhamos aos nossos leitores proprietários de cadelas, que as deixem fazer uma ninhada ou duas, para que biologicamente se sintam mais fortes, seguras e felizes, já que nenhum pecúlio ou artificialismo conseguirá substituir plenamente o que recebem da maternidade, procedimentos que deverão acontecer depois dos 2 anos de idade e antes dos 6. Para aqueles que têm cadelas por demais receosas ou que evidenciam taras de vária ordem, a prenhez é o melhor dos antídotos, porque lhes resolve um sem número de achaques, tanto psicológicos como sociais, geralmente resultantes da nossa indiferença pelo particular destes animais. Evitaríamos esta trabalheira se os bonecos de peluche mamassem ou se as cadelas não nascessem para procriar. É possível que no futuro se façam cadelas sem essa necessidade, à imitação das galinhas poedeiras que nunca chocam. Até lá, porque as respeitamos, há que valer-lhes, considerar à sua natureza e propósito de vida. 

SELECÇÃO DE CÃES: QUANDO (-1) X (-1) É IGUAL A 1

Na minha passagem pelo mundo equestre e ao travar contacto com vários criadores de cavalos, tanto a norte como a sul do Equador, invariavelmente, ouvi-lhes dizer que mães ruins geram por vezes excelentes crias, referindo-se à morfologia e à funcionalidade. Na canicultura também testemunhei casos idênticos, não tanto do ponto de vista morfológico mas ao nível do carácter, quando do beneficiamento entre dois cães mansos ou receosos resultaram um ou mais cães valentes. Também pude verificar o contrário, quando do cruzamento de dois progenitores valentes resultou uma prole maioritariamente cobarde, belicosa, instintiva e de menor préstimo, que receosa, não hesitava a atacar por medo, manifestando alguns indivíduos características suicidas, que comprometiam consideravelmente o seu desenvolvimento, apreensão, bem-estar social e uso.
Depois de descobrir que a qualidade das ninhadas dependia mais das mães do que dos pais, percebi que, ao invés de seleccionar progenitores pela excelência do seu impulso à luta, mais importava que fossem seleccionados pelo maior impulso ao conhecimento, visando o seu equilíbrio, desenvolvimento e parceria, facto que me levou a resistir à venda das cadelas, que as desejava de boa ossatura, com bom impulso ao alimento, activas e portadoras de 5 a 6 pares de tetas, mesmo que afáveis, até porque as mais másculas, sendo por norma mães mais descuidadas, tendiam a sujeitar os cachorros precocemente, mordendo-os inclusive antes do desmame, condenando-os ao subdesenvolvimento e tornando-os mais submissos e desconfiados.
Na escolha dos machos sempre segui o mesmo critério, substituindo os de forte impulso ao poder pelos de maior capacidade de aprendizagem, porque de outra forma a sua devolução era eminente, particularmente depois dos cachorros atingirem a maturidade sexual, de terem regrado os seus donos ou terem subjugado algum membro do seu agregado familiar. Escolher cães pela excelência do impulso ao poder é transformar uma fábula num desastre, já que o atavismo, sendo um retrocesso, tem um preço que, justificadamente, poucos se predispõem a pagar.
Considerando os principais impulsos herdados caninos (ao alimento, ao movimento, à defesa, à luta, ao poder e ao conhecimento) e classificando-os de 1 a 5, depois de somadas as características dos seus progenitores, o desejável é que os impulsos ao movimento, alimento e conhecimento atinjam nota máxima (5) e que os restantes não excedam a nota 3, isto no que concerne aos cães de guarda, considerando o acerto no seu uso, porque para animais de companhia, a soma da totalidade dos impulsos não deverá ultrapassar a nota 3, nem os impulsos ao movimento e ao conhecimento excederem a nota 4, considerando o bem estar dos animais, isto em termos gerais, porque cada serviço específico exigirá diferentes valores (ex: cães-guia). Ao contrário do que à partida se julga, a natural disparidade de carácter numa ninhada, embrião do futuro escalonamento social canino, presta-se a maior número de clientes e deseja-se que cada um se sinta feliz com o cão que leva, porque doutro modo bem cedo se livrará dele.
Por razões óbvias, é um tremendo erro isentar os submissos da reprodução, imaginem uma alcateia ou uma matilha constituída somente por “machos alfa” e “fêmeas beta”, certamente teria os dias contados, seria destruída antes de se constituir e se todas fossem assim, toda a espécie desapareceria. Curiosamente, por aquilo que temos visto, experimentado, ouvido, lido e estudado, os submissos apresentam maior curiosidade e versatilidade do que aqueles que apenas usam a força bruta, o que é de extrema importância para autonomia condicionada que esperamos dos nossos cães, visando a sua adaptação e utilidade. Para que nos serviria um lobo desregrado, anti-social, instintivo, resistente à liderança, indiferente a qualquer investidura e despegado? Talvez para ser preso à corrente, viver enjaulado ou dentro de um cercado!
Se um cão muito-dominante poderá beneficiar ou ser beneficiado por uma cadela submissa, no intuito de se alcançarem cachorros equilibrados, jamais nos deveremos valer dum macho ou duma fêmea medrosos para reprodução, porque o legado do medo tende a perpetuar-se e é de difícil solução. O cruzamento entre dois animais muito submissos também não é desejável, porque dessa matriz sempre resultam cachorros predispostos à chantagem emocional e dados a picardias entre iguais, ainda que a manha no seu todo não seja de origem genética. O que importa guardar é que dois animais submissos podem gerar filhotes dominantes, a exemplo da multiplicação na matemática, quando dois números negativos dão um resultado positivo, facto que fica a dever-se à sobrevivência das espécies, à adaptação a que ela obriga e ao particular social dos cães. No entanto, visando a homogeneidade das ninhadas, melhor servirá o beneficiamento entre um dominante e um submisso. Oportunamente retornaremos a este assunto.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

FOGE CÃO, QUE TE FAZEM BARÃO. PARA ONDE? SE ME FAZEM VISCONDE

A frase é de Almeida Garrett, o pai do teatro português, não é nossa. De tempos a tempos volta à baila, não perdeu actualidade e espelha os benefícios para quem respeita os paradigmas, seguindo as máximas “faz como vires fazer” e “em Roma sê romano”, numa relação cínica e tantas vezes idiota que desconsidera a verdade e inflaciona o valor dos indivíduos, como se o acerto fosse impossível e o mundo não fosse feito de mudança.
As actuais raças caninas encontram-se estagnadas e enfermas, já não têm mais para dar. Não obstante, sobram por toda a parte títulos de campeões e exaltam-se genealogias na canicultura, como se a excelência fosse devedora da aberração, as menos valias sustentassem a erudição e a ortodoxia das selecções não houvesse resultado da diferença na procura da qualidade. Espera-se dos canicultores mais jovens que vão para além do politicamente correcto, que ousem corrigir as actuais políticas de selecção, devolvendo aos cães a saúde e aptidão que num século lhes roubámos.

DIE “GROSSE FUGE” UND DIE ZUKUNFT DER HUNDE

Ao que consta, Ludwig Van Beethoven não era apaixonado por cães, vivia para a música e entendi-a como a própria linguagem de Deus, que se manifestava tanto nas notas como nos seus espaços, nos sons e nos silêncios, mediante emoções perceptíveis aos homens. Quando escreveu a sua “Große Fuge”, já praticamente surdo, pretendia estabelecer uma ponte entre o passado e o futuro da música, obra que foi incompreendida pelos seus contemporâneos, mas que mais tarde viria a surtir efeito, servindo de inspiração a muitos compositores que lhe seguiram. Visionário e homem adiantado para a sua época, vulgarmente confundido como bruto e irascível egocêntrico, desconsiderou os críticos dessa sua pequena/grande obra inovadora, que a consideraram ao momento sem graça, incompreensível e perturbadora, produto de um homem que perdera a lucidez. O futuro haveria de fazer-lhe justiça.
Sem a genialidade e a riqueza visionária do “Maestro” alemão, mas conscientes do passado e do presente dos cães, não nos custa acreditar que a cinotecnia sofrerá no futuro profundas alterações, mediante a “Grande Fuga” proporcionada pela adopção do reforço positivo, ponte consistente para a compreensão e uso dos cães vindouros, que pouco a pouco serão libertados do jugo a que se vêem remetidos, vindo a ser mais respeitados e menos explorados, usados pelo que são, para seu e nosso benefício, mediante práticas de bem-estar comuns, que sendo incondicionais, garantirão aos homens o reforço da cumplicidade e devolverão aos cães maior liberdade. Deixarão de haver cães de guerra, polícias ou de guarda, finalmente todos encontrarão a paz. E se houver necessidade de treino, como já agora acontece, serão os donos a ir às escolas, para aprenderem os rituais de comunicação que tornarão possível o diálogo com os seus cães. O futuro, que começa hoje, dirá se temos razão ou não! Quem lhes fará uma “Ode an die Freude” (um Hino à Alegria), agora que Schiller e Beethoven já cá não estão? Não sabemos, mas pensamos que a melodia já anda na boca das crianças, quando correm para abraçar os seus cães! 

QUAL SERÁ O MOTIVO (XIII)?

Um casal de avós, finalmente liberto dos encargos com os netos, decidiu fazer umas curtas férias e entregar o seu cão aos cuidados dum filho, que para o efeito ficou a ocupar a casa. Quanto voltaram e para espanto seu, o cão, que até ali devorava a ração, começou a desprezá-la. E por mais voltas que dessem à cabeça, não entendiam qual o motivo da inapetência do animal. Alarmados com o sucedido, até pensaram em levá-lo ao veterinário, apesar se encontrar vivo e alegre, não ter temperatura, ter as vacinas em dia e ter sido desparasitado há 15 dias atrás. A que se ficou a dever a falta de apetite do cão? Hipótese A: perdeu o apetite por sentir a falta do filho dos donos. Hipótese B: Não comia a ração por se ter enjoado dela. Hipótese C: Porque temia que os donos saíssem outra vez. Hipótese D: Porque o filho do casal lhe tinha dado comida confeccionada. Hipótese E: Não comia para chamar à atenção dos donos. Para a semana, como é nosso hábito, adiantaremos qual a hipótese correcta.

SOLUÇÃO DA SEMANA PASSADA

A hipótese certa à rubrica QUAL SERÁ O MOTIVO (XII)? da semana passada é a Hipótese E: Porque dos três era o único que tinha medo de cães. A Hipótese A não deverá ser considerada porque, vendo os outros adiantados e em fuga, o que lhe serviria de estímulo, o cão jamais desistiria deles, ainda que a princípio pudesse hesitar. A Hipótese B deverá ser descartada porque qualquer captura canina sempre obedece a alguma razão. A Hipótese C é ambígua, porque havendo hipótese de escolha, mais depressa um cão capturará um indivíduo de menor envergadura. A Hipótese D deverá ser desprezada porque nos ataques lançados pesa mais a mecanicidade das acções do que a memória afectiva canina, apesar de ser a certeza da vitória que mais impele o cão à perseguição.

RANKING SEMANAL DOS TEXTOS MAIS LIDOS

O Ranking semanal dos textos mais lidos ficou assim ordenado:
1º _ PASTOR ALEMÃO X MALINOIS: VANTAGENS E DESVANTAGENS, editado em 15/06/2011
2º _ TIPOLOGIA DOS PASTORES DA ACENDURA BRAVA, editado em 16/01/2015
3º _ EU QUERIA UM PASTOR ALEMÃO, DE PREFERÊNCIA TODO PRETO, editado em 05/06/2010
4º _ A CURVA DE CRESCIMENTO DAS DIFERENTES LINHAS DO PASTOR ALEMÃO, editado em 29/08/2013
5º _ NASCER E MORRER COM MEDO DA TROVOADA, editado em 28/06/2011

TOP 10 SEMANAL DE LEITORES POR PAÍS

O TOP 10 semanal de leitores por país obedeceu à seguinte ordem:
1º Portugal, 2º Brasil, 3º França, 4º Rússia, 5º Estados Unidos, 6º Índia, 7ºAlemanha, 8º Bélgica, 9º Ucrânia e 10º Angola.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

JE SUIS POUR LA PAIX

Perante os recentes atentados terroristas ocorridos em França, ninguém pode ficar insensível, porque causaram vítimas inocentes e nenhum de nós está livre de sofrer o mesmo castigo, independentemente do lugar na Europa em que vivamos, já que os terroristas, infelizmente, se encontram por toda a parte, ainda que nalguns lados se mostrem menos por conveniência e necessidade de resguardo, vivendo acoitados entre nós como se de ovelhas se tratassem e vestindo a sua verdadeira pele quando o ocasião lhes é propícia, o que aumenta a nossa revolta diante da insegurança em que vivemos. Os mais radicais, oriundos dos diferentes nacionalismos europeus recalcitrantes, já alvitram uma nova cruzada contra os infiéis, ganhando apoiantes junto das vítimas da actual guerra económica, que sendo global a ninguém poupa. Já se fala de duas soluções: a “espanhola e a “americana”, a primeira a exemplo da ocorrida em 1492, quando os reis católicos expulsaram os muçulmanos e a segunda que reclama por prisões tipo Guantanamo, iguais nos métodos e nas sevícias, como se ódio gerasse tolerância, facilitasse o diálogo entre os povos, concorresse para a liberdade de expressão e a troca de papeis nos enaltecesse, tudo isto dissimulado pelo pedido de abolição do “Espaço Schengen”. Não será a liberdade uma legítima aspiração de todos os povos? Para quê transformá-la em fruto proibido?
Assim como há que diferenciar o islamismo dos seus radicais, muita embora essa fronteira seja nalguns casos ténue, também não podemos atribuir tais actos criminosos a razões económicas ou a más políticas de integração, porque isso seria justificar o injustificável e atribuir nobreza ao crime, como se os fins justificassem os meios e o desacerto duns legitimasse o fratricídio perpetrado por outros, o que à luz dos “estados de direito” em que vivemos, seria no mínimo paradoxal. Enquanto cidadão, penso que o combate ao terrorismo e aos terroristas deverá ser uma luta sem tréguas, visando a segurança de todos para além das questiúnculas ligadas ao racismo, à xenofobia e às diferenças culturais. Para ficarmos em paz uns com outros, importa identificar os criminosos e os seus aliados, julgá-los e condená-los pelo que são, impedindo-os de perpetrar os seus actos e de recrutarem outros para a mesma senda, privá-los da liberdade que tão mal aproveitaram e contra a qual se rebelaram tão indecentemente.
Mais do que correr atrás do prejuízo, aqui massificado pelas vítimas, importa estabelecer políticas preventivas que obstem a consolidação das práticas terroristas, o que deverá unir os europeus e todas as nações livres do mundo à volta deste propósito. Generalizar ou julgar o todo pela parte, para além de injusto e fratricida, é engrossar as fileiras dos nossos inimigos, criar barreiras ao entendimento entre os povos, impedir que outros possam usufruir da liberdade e contribuir para a paz geral. Convém não esquecer que o polícia covardemente assassinado às portas do Jornal Charlie Hebdo (Ahmed Merabet), era de origem argelina e muçulmana, o que de imediato nos obriga a destrinçar os islamitas dos que se servem do islão para hediondas práticas criminosas, cujas motivações se prendem com patologias assassinas e não com a religião que dizem seguir ou professar, esclarecimento e diferenciação que caberão, prioritariamente, a quem prega e ensina o Corão.
Doravante, atentados como estes não deverão repetir-se e não deverão ser objecto de idêntica mediatização, considerando a salvaguarda dos cidadãos, o melhor desempenho das polícias e a ausência de publicidade, já que os assassinos sempre aproveitam, para se alvitrarem em mártires e combatentes, quando não passam de reles verdugos. Se há que os mostrar, mais vale que sejam vistos na barra do tribunal ou a entrar para o cárcere, quando sentenciados e condenados, segundo a gravidade impiedosa dos seus actos, servindo de exemplo aos que intentarem seguir-lhes os passos. Se o único combate que dignifica a humanidade é a procura a paz, não nos restando outra alternativa e quanto antes, teremos que declarar guerra ao terrorismo e aos seus sequazes, para que outros facínoras não os aproveitem e venham a causar-nos maior destruição. Dar combate ao terrorismo é também trabalhar pela integração de todos os povos, cuja esmagadora maioria é ordeira e pacífica, não se faz explodir, não espera por virgens no céu, tem os pés assentes na terra e trabalha arduamente. Combater o terrorismo é sair à rua sem medo, como aconteceu no passado Domingo em Paris, onde milhões de pessoas se fizeram ouvir pela democracia e contra o terror, em prol da paz e contra o terrorismo, na defesa da liberdade de expressão contra os que nos querem calar.

A bandeira da paz é branca e jamais deverá ficar tinta pelo sangue dos inocentes. Je suis pour la paix parce que je m’engage à la vie!

REFLEXÃO SOBRE OS CÃES DE RUA MOSCOVITAS (Москва уличные собаки)

Se há um lugar privilegiado para compreender o regresso ao atavismo dos cães, fazer trabalho de campo (investigação), subsidiar umas quantas teses de mestrado sobre o comportamento canino e melhor compreendermos o que temos feito com estes animais, ainda que pelo caminho inverso, ele será em Moscovo e nos seus arredores, onde proliferam várias dezenas de milhar de cães de rua, descendentes de pets desprezados e nessa situação há várias gerações (nalguns casos desde o Sec. XIX), desprovidos de dono, tornados párias, autónomos, constituídos em matilhas e hábeis em sobreviver, muitas vezes entre o abate, o tiro ao alvo e a compaixão, apesar de bem adaptados ao viver urbano e à lide das gentes, concorrendo invariavelmente aos mesmos meios de transporte e sujeitando-se aos mesmos perigos e desafios. A Laika, a primeira e única cadela astronauta até à presente data, de quem falámos há algumas edições atrás, foi resgatada dessa mesma condição e, atendendo ao fim que teve, mais valia terem-na deixado por lá!
Segundo Andrei Poyarkov, um biólogo especializado em lobos, que nos últimos 30 anos se tem dedicado ao estudo dos cães de rua moscovitas, a esperança de vida destes cães ronda os 10 anos e poucos são os cachorros que chegam à idade adulta, vindo os sobreviventes a substituir aqueles que perecem, o que mantém um grupo estável de 35.000 indivíduos, agregados em várias matilhas de características diferentes, que podem ser divididas em quatro grupos: os selvagens (cães nocturnos que evitam os humanos e os vêem como uma ameaça), os semi-selvagens (que procuram comida), os de guarda (que aceitam determinadas pessoas como líderes) e os pedintes (notoriamente mais inteligentes, que pedem comida sem se ligarem afectivamente às pessoas). Generalizou-se entre eles um tipo morfológico próprio, caracterizado pelo tamanho médio, pêlo comprido, cabeça em forma de cunha, olhos amendoados, caudas longas e orelhas erectas. No decorrer da sua observação, Poyarkov notou que eles foram perdendo a pelagem malhada, o costume de abanar a cauda e a afectuosidade, características que separam os cães dos lobos, pormenores que nos induzem a várias reflexões, tomando em conta rusticidade e a parceria que esperamos dos nossos cães, nomeadamente dos Pastores Alemães.
O tipo físico ali dominante, afinal tão próximo do Pastor Alemão, aponta claramente para a justeza dos pressupostos selectivos defendidos pelos construtores desta raça, em abono da sua sobrevivência, rusticidade, autonomia, adaptação, uso e melhor desempenho – Stephanitz e os seus seguidores tinham razão! Com o tempo e o desprezo pelo trabalho, mediante massivas infusões de maus sucedâneos de Arminius e Wienerau, a cauda destes cães passou a ser um adorno, por força da estilização procurada, permanecendo tombada e sem vida como as dos lobos, o que vem dificultando a leitura da sua mímica, equilíbrio, travamento e desempenho atlético. Infelizmente os lobos são furtivos, temem os homens, não se podem mostrar e só contam consigo, muito embora em matilha sejam perigosos e letais. Mas vamos adiante que isto são contas de outro rosário!
Lá por Moscovo, os ditos cães pedintes, que são os mais espertos, não se incomodam com o barulho, a azáfama e o movimento ao seu redor, perfeitamente adaptados, conseguem dormir uma sesta nos sítios mais inesperados. Constituídos em matilhas/alcateias, os diferentes grupos interagem entre si, sendo liderados pelos mais inteligentes e não pelos mais fortes ou dominantes, porque a tanto obriga a sobrevivência, necessidade que automaticamente os transforma em cães alfa, novidade para aqueles que dão primazia ao impulso à luta nos seus cães e que inevitavelmente acabam por correr atrás do prejuízo. Que grandes lições têm os cães vadios Moscovo para nos dar! Peritos na arte de sobreviver e capazes de entender a psicologia de certos humanos, os cães pedintes desenvolveram várias técnicas para alcançar comida dos transeuntes. Uma delas passa pelo uso dos membros mais pequenos e bonitinhos, por isso mesmo mais apelativos, para pedir comida às pessoas. E como também têm um “Plano B”, não encontrando outro remédio, ao sentirem que alguém transporta algo comestível, ladram-lhe de surpresa pelas costas, para que surpreso e assustado deixe cair o repasto. Eles descobriram que nas áreas mais movimentados é mais fácil encontrar comida e graças a isso, são mais sociáveis, não se apresentam subnutridos e até são selectivos nos seus manjares, muito embora haja notícia de ataques por comida nas zonas industriais mais isoladas.
Como casos destes são raros, entre a afeição e o incómodo, os cães acabam por ser tolerados, havendo muita gente que os alimenta e que lhes constrói abrigos nas Estações do Ano mais frias. Observadores, aprenderam a respeitar os semáforos e a evitar o confronto com as pessoas, não defecando nas áreas mais movimentadas da cidade. Para muitos, eles fazem parte da própria personalidade de Moscovo e as campanhas de castração encetadas tiveram pouco impacto na sua redução.
Mas o que mais impressiona nestes cães é uso que fazem do Metro de Moscovo, ao tornarem-se seus passageiros e residentes nas suas estações, o que levou Eugene Linden, um reputado especialista em inteligência animal, a considerá-los portadores de “raciocínio flexível e pensamento consciente”, uma vez que aprenderam a reconhecer as estações ao ouvir o seu nome pelas gravações, pelo seu odor particular e pela combinação desses e doutros factores, nomeadamente o tempo entre o embarque e o desembarque. Durante a era soviética não eram permitidos cães no Metro, mas também eram raros os restaurantes e snack-bares na Capital russa, o que não lhes justificava a ida ao centro da cidade, preferindo viver nas zonas industriais, onde arranjavam comida nos caixotes do lixo, vivendo dos restos ali jogados pelos trabalhadores. Mas com a queda URSS tudo mudou, começaram a surgir blocos de apartamentos e centros comerciais nos arredores e o número de restaurantes e lanchonetes aumentou drasticamente no centro da cidade.
Como qualquer passageiro, mesma nas horas de ponta, é comum vê-los a apanhar o Metro nos subúrbios, onde pernoitam, rumo ao centro da cidade, no intuito de se alimentarem, retornando ao local de partida depois de saciados, partindo pela manhã e regressando ao final da tarde, viajando deitados nos bancos, no chão ou entre as pernas das pessoas, não reagindo a qualquer pisadela acidental por força do hábito. Ainda que prefiram as primeiras carruagens ou as últimas, por serem menos concorridas, é comum vê-los a entrar e sair pelas diversas portas durante as paragens, brincadeira em que arriscam ficar com as caudas presas. Cerca de 500 cães vivem nas estações do Metro, mas apenas 4% o usam como meio de transporte.
O Caso Malchik. Em 2001, uma modelo de 22 anos, que regressava a casa acompanhada pelo seu Staffordshire Bull Terrier, matou a facadas um cão de rua negro, alcunhado de “Malchik” (“menino” em russo), que tinha escolhido como abrigo a estação de Mendeleyevskaya, local que protegia de bêbados e outros cães. Como o triste episódio ocorreu numa hora de muito movimento e foi presenciado por um se número de pessoas, o que provocou a revolta generalizada da opinião pública e profunda consternação nalgumas celebridades moscovitas, a assassina do Malchik foi presa, julgada e condenada a um ano de tratamento psiquiátrico (com os russos ninguém brinca!). Como resultado de uma campanha de fundos, foi erigida, a 17 de Fevereiro de 2007, uma estátua em bronze como homenagem ao cão assassinado, à entrada daquela estação do metropolitano moscovita, obra do escultor Alexander Tsigal, que contou com a colaboração do arquitecto Andrey Nalich e do designer Peter Nalich. A estátua foi intitulada de “Compaixão” e é suportada por uma serpentina monolítica.
Uma coisa é certa: ainda temos muito que aprender acerca dos cães, sobre a inteligência e préstimo destes dedicados companheiros, que apesar de milhares de anos ao nosso lado, não param de nos surpreender.