Há quem não tenha perfil para ser militar, quem
abomine tudo o que à tropa diz respeito e quem defenda a extinção de todos os
exércitos e arsenais (nucleares e outros), o que me parece justo e razoável
desde que não seja unilateral. No entanto, sem daí granjear qualquer lucro
pessoal ou desejar mal a alguém, acho que todos os jovens deveriam fazer uma
recruta de alguns meses, sem os prejudicar profissionalmente, tal como se fazem
outras formações, algumas delas, diga-se em abono da verdade, de utilidade
duvidosa e de lucro imediato para os formadores. Quer se concorde ou não, a
incorporação militar é um processo pedagógico único, particularmente para
aqueles que precisam de assumir a pontualidade, de ser disciplinados, de
compreender e respeitar a hierarquia, de ser responsáveis, de cumprir o que
lhes cabe, de ser decididos, de equilibrar a razão com a emoção, do apego aos
procedimentos, de exercício físico, de espírito de sacrifício, de reconhecer o
esforço colectivo e a importância de cada um para o seu sucesso. É evidente que
há pessoas que já nascem assim, como é evidente que a maioria delas se comporta
de modo díspar. Geralmente acaba incorporado quem menos precisa e os mais
necessitados nem lá metem os pés, para mal das famílias e da sociedade, gerando
gastos e desencontros que uma melhor formação de carácter poderia diminuir.
Na tropa aprendi que “hábito não é regulamento” e
que “conhaque é conhaque e serviço é serviço”, princípios à primeira vista
toscos, mas que se revertem de extrema utilidade, quando importa cumprir e
refrear desejos. Na semana passada, aproveitando as Férias de Natal dos miúdos
e a baixa de preços, também porque o hotel aceitava cães, uma família nossa
conhecida decidiu ir até uma estância de inverno espanhola, levando consigo o
seu Pastor Alemão Negro, um cachorro matulão de oito meses, com 68cm e com
38kg. A viagem de carro correu sem percalços e o animal não se fez notar,
embalado pela viatura e aconchegado pelos mais novos, adolescentes que nunca
tinham visto neve, apesar dela raramente faltar na nossa Serra da Estrela.
Encantada com aquela infinda paisagem branca, que lhe invadia a alma de
artista, a matriarca da família largou o cão pelos campos fora, sem saber o que
a neve ocultava, desconhecendo o território, a natureza dos seus limites e os
perigos que escondia, apesar de previamente instruída para não o fazer,
atendendo à salvaguarda do animal. Estranhamente, o animal veio de lá a vomitar
e com as fezes alteradas, tanto de aspecto quanto de cor, pelo que enfatizamos
(já não nos lembramos quantas vezes o fizemos), que antes de soltar o seu cão,
passe em revista o território e certifique-se da ausência de perigos para o
animal, pois “hábito não é regulamento” e há erros que se pagam caro! E como a
excursão foi a Espanha, rematamos com um aforismo de lá: “ Inicialmente, los
hábitos son telarañas, después se convierten en cables” (no cabo dos trabalhos,
dizemos nós).
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