quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

O CÃO E OS BRINQUEDOS: CUIDADOS A HAVER

Tal qual o Tabuleiro de Simulação, que prepara os condutores para a técnica de condução, os brinquedos preparam os cães, para as futuras acções reais. Infelizmente, estes acessórios de trabalho são vendidos a granel e sem qualquer tipo de explicação ou recomendação, desacompanhados de literatura e isentos de fiscalização, o que nos parece abusivo diante do bem-estar animal. O brinquedo é para o cão um objecto de pertença, algo que considera seu e que fará parte integrante do seu crescimento. Assim, havendo a certeza de sucesso no imprinting, o cachorro deve fazer-se acompanhar para o novo lar de algum objecto que lhe é familiar, (um pedaço de manta; um brinquedo; etc.), para que a sua adaptação não resulte estranha e implique num corte com o passado, comportamento visível nos cachorros que se comportam como bichos nos novos lares de adopção, como se oriundos doutra galáxia.
Na instalação doméstica, os primeiros pertences do cão devem ser aqueles objectos que teima em abocanhar e com os quais insiste em identificar-se (sapatos; pantufas; pedaços de roupa, etc.), coisas incapazes de lhe causar dano ou atentar contra a sua saúde. Sobre eles despertará o seu sentimento territorial e evidenciará os seus impulsos à luta, à defesa e ao poder. Chama-se a estes objectos de estímulo: “proto-cobaias”, porque antecedem e preparam a futura captura das cobaias escolares (figurantes). É evidente que a loja tem tudo, brinquedos bem bonitinhos e do agrado dos donos, fazendo-lhes encher o olho, contudo, para que surtam efeito, carecem de aceitação e podem ser ou não do agrado e interesse do cão. Como o cachorro não vai à loja, deve ser ele a escolher os primeiros brinquedos, aqueles objectos pessoais e domésticos, que são da sua predilecção, que facilitam a identificação dos donos e que promovem o bem-estar social do animal.
À medida que o tempo passa e a instalação “at home” acontece, novos brinquedos devem ser-lhe apresentados, cada um com funções diferentes e de acordo com os impulsos que se pretendem desenvolver, por serem deficitários ou necessitarem de potenciação. Estamos agora na fase da “experiência directa”, aquele período na vida do cão que antecede o treino propriamente dito e que importa ser variado e rico, graças à variedade dos brinquedos pedagógicos que possibilitam diferentes desafios. Só se alcança o propósito dos brinquedos mediante a recompensa, que é o reconhecimento pelo trabalho efectuado pelo cão, que se esforça para se para se sentir aprovado. Como a muda dos dentes acontece, normalmente, entre os 4 e 5 meses, convém que nesse período, o cão roa os brinquedos, cordas ou bonecos, mas é indesejável abaná-los na sua boca ou suspendê-lo pelos objectos. E isto porquê? Para se evitarem prognatismos e mordeduras anómalas, já que os seus maxilares se encontram em formação.
Antes dos seis meses de idade, nenhum brinquedo que evolui em diferentes direcções deverá ser apresentado a um cachorro, para não se atentar contra a formação dos seus ombros e incorrer na sua luxação. Nos cães de raça grande e de crescimento prolongado, este período de segurança deverá ser alargado até ao perfeito equilíbrio entre o comprimento e a altura do cachorro. Por norma, só aconselhamos brinquedos desse tipo às fêmeas depois do primeiro cio e aos machos quando já levantam a pata para urinar. As anomalias “dorso selado” e “divergência de mãos”, quando não são hereditárias, resultam inúmeras vezes da escolha errónea de um brinquedo ou do seu abuso.
Com os brinquedos é possível ensinar todo o currículo de obediência de modo descontraído e alegre, mercê do despertar da memória afectiva canina, difícil é actuar sem eles e operar o cumprimento pronto e imediato de uma ordem, o que a ninguém espanta, já é quase impossível ensinar, seja o que for, sem qualquer tipo de supercompensação. Nisto deverá haver equilíbrio e um norteamento prévio acerca das funções do cão (caça; companhia; guarda, etc.). Assim, a distribuição e o convite para os brinquedos deverá depender do trabalho a destinar-lhe, porque tanto pode subsidiar a sua sociabilização como condenar a sua vigilância, quando usados como jogo e manobra de distracção. Também aqui, “o segredo é a alma do negócio”, os brinquedos usados não devem ser do conhecimento geral, porque eles reforçam a liderança e ela não deve rolar pelas pedras da calçada. Quem os pode dividir com o cão? Somente o agregado familiar, em prol da pedagogia e da salvaguarda do animal.
Como já foi dito no capítulo “ A IMPORTÂNCIA DE SER ELEMENTO NEUTRO”, os brinquedos podem ser usados como auxiliares na convalescença e recuperação de um cão, mas sua função terapêutica ainda abrange outros benefícios e opera satisfatoriamente noutras áreas. Imagine-se um cão debaixo do “efeito campainha”, que evolui com a cabeça nivelada pelo dorso, será que um brinquedo na mão do condutor não ajudará à sua eliminação? Usando o mesmo método, não será possível eliminar ou atenuar o “efeito vassoura”, quando os cães evoluem com a cabeça abaixo da linha do dorso? É evidente que sim! Não somos contra o uso escolar dos brinquedos até ao seu 3º ciclo (10 meses), usamo-los inclusive como medida de recurso junto dos “binómios doentes”, como estímulo prós diferentes impulsos herdados caninos, como introdutores à guarda de objectos, como indutores à pistagem e temo-los presentes nos momentos de super compensação. Se não o fizéssemos seríamos tontos e não alcançaríamos as vantagens que nos oferecem. Normalmente aconselhamos o seu uso doméstico e evitamos, quando possível, o seu uso escolar, por causa da distracção e confusão que operam, substituindo-os pelo cão que vai na frente e pela simpatia existente entre cães e cachorros. Depois do 3º ciclo escolar, altura em que os alvos requeridos são reais, apenas os usamos nos momentos de supercompensação, como reconhecimento do trabalho prestado e como inibidores de stress. O brinquedo sendo um meio, não pode e não deve ser um fim, a menos que seja uma réplica fiel daquilo que o cão irá ter pela frente.
Todo e qualquer brinquedo tem de ter em conta o cão a que se destina e estar de acordo com o seu estado etário, morfologia e grau de desenvolvimento, substituindo e complementando o que anteriormente lhe houvera sido distribuído. Também os brinquedos reclamam o uso progressivo, a passagem do fácil para o difícil, do simples para o complexo. E brinquedos não são só bolas; nós de corda; churros e toda a parafernália existente no mercado, são também jogos associados à forma e ao lugar, aprendidos pelos sentidos maiores, que se encontram presentes nos cães, (olfacto e ouvido). Os brinquedos existentes no mercado resultam de protótipos usados por diferentes escolas ou adestradores, sendo exemplares menos rudimentares e mais apresentáveis do que os originais. Vendedores e clientes desconhecem a sua utilidade, os primeiros mandam-nos vir porque se vendem e os últimos porque o cão do lado tem um igual! No meio de tudo isto e borrifando-se para a saúde animal, há por aí gente com responsabilidades pedagógicas que indevidamente engorda neste negócio. Para que não continuem a aumentar os disparates causados pelos brinquedos da moda, no intuito de cessar as lesões que podem causar e evitar o seu uso indevido, qualquer brinquedo, por mais inofensivo que nos pareça, deve merecer a aprovação do adestrador escolar. Convém lembrar que as diferentes disciplinas cinotécnicas exigem diferentes brinquedos, ainda que os primeiros sejam comuns a todas elas.

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