terça-feira, 21 de junho de 2011

O MELHOR E O PIOR DO PASTOR SUIÇO: ANÁLISE MORFOLÓGICA E FUNCIONAL

Ainda antes das considerações técnicas sobre a “raça”, somos obrigados a falar do genocídio perpetrado contra esta variedade cromática no seio do Cão de Pastor Alemão, quase desde a sua origem e de forma massiva após o final da Segunda Grande Guerra (1939-1945), prolongando-se esse extermínio quase até aos nossos dias. Mais do que agradecer aos suíços e aos canadianos a sua salvação, importa ressaltar e denunciar a violência do erro, baseado num gritante eugenismo negativo e explicado por um todo de mentiras (pretenso albinismo, docilidade exagerada, menor propensão laboral, suposta descaracterização, etc.), hoje considerado deveras criminoso face à Carta dos Direitos dos Animais, surgida em 1978. Como a reintegração da variedade cromática na CPA nos parece impossível, pelo menos oficialmente, jamais será feita justiça ao Pastor Branco, ao Weiss Deutsche Schaferhund. E dizemos oficialmente porque ele tem vindo a ser reintegrado à revelia, um pouco por todo o lado e em pequena escala, para a obtenção de cães unicolores de manto vermelho e cinzento, ainda que essas variedades cromáticas possam vir a ser alcançadas pelo contributo do negro, quando conjugado com o lobeiro, o que a ninguém espanta, porque os lobeiros originais, ao contrário dos actuais, tinham a pele branca. A supressão arbitrária do branco obrigou o CPA a uma esforçada e lamentável endogamia, à perpetuação de incapacidades que a raça não tinha à partida e que tem obstado à sua proliferação, enquanto cão de trabalho e de acordo com os ancestrais pergaminhos. Mais do que na procura da novidade, surgindo como uma necessidade, a hibridação do CPA com o Lobo, responsável pelo aparecimento de novas raças de qualidade questionável, tentou reencontrar no atavismo aquilo que a raça foi perdendo pelo decorrer das décadas. Contra todos os tabus e diante da fraca prestação dos híbridos, não nos custa aceitar o Pastor Branco como um melhorador dentro e para o CPA, porque triste fim terá a raça, que desprezando o seu todo, apenas procura os alelos que lhe justificam a cor. A somar a isto, no Weiss Schaferhund, não são visíveis as maleitas e inaptidões resultantes dos erros selectivos que afligem o actual CPA. A solução sempre esteve à mão e ninguém se lembrou dela, enquanto pedra de esquina e fundamento de construção. Se alguns admitem com relutância o Pastor Alemão Branco, a nós corta-nos a garganta em tratá-lo com Suíço, porque, exceptuando a cor, nada mais há assinalar ou a justificar em relação ao CPA, muito embora nos actuais pastores brancos o pelo comprimido seja por demais evidente e o “gigantismo” se faça presente, assim como algum pernaltismo e uma diferença assinalável de peso (menor), factores interligados, advindos da proto-selecção e intimamente associados à variedade de pelo mais longo, que não é específica do branco e que está presente em todas as variedades cromáticas. O menor coeficiente de envergadura, também visível na maioria dos exemplares estéticos padronizados, ainda que por outras razões, torna o cão branco mais propenso a desaprumos e por causa disso, mais concorrente a lesões, o que irá obrigar simultaneamente ao aumento dos momentos de liberdade e ao acompanhamento sistemático dos seus ciclos infantis. Na dita casta dos “Pastores Suíços” (o termo parece-nos mais correcto mercê da endogamia), os seus criadores têm oscilado entre a aproximação ao CPA e a sua diferenciação, quer evidenciando iguais qualidades, quer procurando díspares características estéticas, apresentando-se a primeira opção como natural e a segunda como uma aberração, já que o erro histórico dos criadores alemães jamais justificará o erro dos amantes do “Pastor Suíço”. A fragilidade do actual pastor branco, tornada genética mercê das circunstâncias e pelo concurso de alguns puritanos, reclama agora pelo contributo das restantes variedades cromáticas, naquilo que elas transmitem em termos de robustez, nomeadamente do preto-afogueado. Graças a esse aligeiramento forçado (o cão parece-nos oco, só pêlo e ossos a bater), o Pastor Branco irá encontrar mais tarde a harmonia estética e a graciosidade de movimentos, sobrecarregando até ali lá as suas articulações e aprumos, já por si longe das ideais, o que obrigará a alguma delonga no seu adestramento, particularmente no alcance dos seus indíces atléticos. Porém, é sabido que os animais que mais demoram a crescer, são aqueles que evidenciam melhor impulso ao conhecimento e maior capacidade de aprendizagem. A robustez do Pastor branco exige riqueza nas dietas (apesar de não ser um glutão) e só depois se poderá pensar na sua prestação, porque não absorve como os outros iguais benefícios do sol, tanto em quantidade quanto em qualidade, apesar de necessitar dele e não o dispensar.
Quando comparado com o CPA, em estado puro e sem interferência de condicionamento objectivo, é mais instintivo, menos participativo e mais autónomo, características que sobraram do seu desprezo e abandono, porquanto não foi alvo da selecção pela funcionalidade e a sua prestação foi, desde cedo, desconsiderada e desleixada, o que não quer dizer que não possa ser um excelente guardião ou que não possua, porque possui, uma excelente máquina sensorial. É competitivo e medianamente territorial, lembra o lobeiro e precisa de antever as acções, não resiste à sociabilização e facilmente se incorpora em novas matilhas. Reage satisfatoriamente aos estímulos e aceita sem maiores dificuldades a mecanicidade. Não é um ladrador inato, é silencioso e apresenta-se por vezes desconfiado. Aceita naturalmente a troca de condutores e é delicado ao dono. Suporta bem os climas sujeitos a grande amplitude térmica e apresenta grande propensão para nadar, possui características inatas de caçador e depois de construído é bastante activo. Tolera excepcionalmente as crianças e não raramente toma parte nas suas brincadeiras, o que o torna no cão ideal para os condutores mais novos. Reclama por exercício e cedo se farta das recompensas comestíveis, procura a companhia de outros cães e não mantém contra eles qualquer incompatibilidade somática, reage por provocação e é naturalmente calmo. É sóbrio, não inventa trabalho e não vai prà além do que lhe é estipulado (não sofre de excesso de zelo). Acusa a repreensão e nem sempre tenta agradar, porque é independente e não abdica gratuitamente das suas preferências ou inclinações. Não obstante, considerando as disciplinas cinotécnicas mais em uso, será na obediência que alcançará maior destaque, se os seus criadores mantiverem, como até aqui, os actuais critérios selectivos (pouco apostados na funcionalidade).
Morfologicamente falando, não subsistem diferenças significativas entre o pastor branco e os restantes pastores, já que ele mantém as mesmas linhas e a divisão clássica 1 – 2 – 1 para igual comprimento. Talvez peque por menor homogeneidade, o que pode ser uma vantagem, já que em termos de angulações apresenta-se do angulado para o muito angulado, com o dorso paralelo ao solo ou mais convexo. Tudo o que se considera virtude ou defeito no CPA pode ser encontrado no pastor branco, o que denuncia de imediato a origem comum. A cadência de marcha dos exemplares maiores é muito elevada e rasgada, exigindo condutores com mais de 120 cm em relação à sua altura. Ao mesmo tempo, nos exemplares menos angulados, subsiste uma troca do andamento natural preferencial, assistindo-se à permuta da marcha pelo galope. Não se passará o mesmo com as restantes variedades cromáticas?
Havendo esse cuidado na selecção, o pastor branco poderá constituir-se num guardião de eleição, porque dificilmente ultrapassará os 45 kg, é rápido, naturalmente autónomo e esquivo, nada ladra em demasia e é portador de uma excelente máquina sensorial, pese embora o facto de ser branco e a sua silhueta ser por demais visível ou detectável, o que o desabona como guarda-nocturno. No entanto, pode perfeitamente ser instalado ao redor de habitações de alvenaria ou junto a imóveis e muros caiados (é praticamente indetectável em pisos de areia marítima). O seu instinto de presa é mediano e pode ser potenciado. O facto de se fazer mais tarde ajuda na absorção dos códigos e evita muitos reveses. Os exemplares de pêlo duro são mais consistentes e seguros, apresentam maior predisposição laboral, mais quilos e outra valentia. Os de pêlo comprido mantêm os indíces laborais em temperaturas acima dos 28º sem maior cansaço ou dispêndio de energia extra. Sem o concurso da engenharia genética, o retorno ao passado glorioso do CPA, em termos operacionais, só será possível pelo retorno à recessividade branca e a outras, porque doutro modo, e o resultado está à vista, cada vez mais haverão menos pastores em trabalho, atribulados com os achaques típicos da endogamia. Apesar de abominarmos a ideia, se há que cruzar Malinois com CPA na procura de vantagens, os riscos serão substancialmente menores diante do contributo dos pastores brancos, considerando a proximidade tangencial das origens, a homogeneidade das ninhadas e a dominância dos cães belgas vermelhos. O Pastor Branco é um melhorador sempre oculto noutras pelagens e a sua supressão pode acarretar recuos que ninguém deseja, enquanto o controlo for necessário, a liberdade condicionada for exigível e a saúde dos animais o melhor dos seus bens. Parabéns se tem um Pastor Branco, felicitamo-lo pela opção e pelo bom gosto.

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