terça-feira, 22 de janeiro de 2019

O QUE ENTENDEMOS POR OBEDIÊNCIA

Uma leitora enviou-nos o seguinte email, que estendemos na íntegra à globalidade dos nossos leitores:” Prezados Senhores, tenho reparado que a obediência canina ocupa um lugar privilegiado naquilo que dizem ensinar. Gostava de saber qual o seu propósito, utilidade, método de ensino e contribuição para o bem-estar dos cães. Atentamente (…)”.
Entendemos a obediência como a pedra basilar do ensino clássico canino, porque nenhuma disciplina cinotécnica, especialidade ou binómio a podem dispensar, considerando a desejável interacção entre homens e cães baseada na cumplicidade que a torna possível. O alcance da cumplicidade que leva à assimilação dos protocolos, à aceitação da regra e à instituição de um código de vida é um pré-requisito para o objectivo central do adestramento - a salvaguarda canina. Em simultâneo e quando necessário, a cumplicidade possibilita ainda o fim útil dos cães, que difere de animal para animal de acordo com as suas características ou mais-valias individuais.
Como a disciplina de obediência não pode ser dissociada daquilo que oferece e é um canal seguro e privilegiado para a comunicação interespécies, a formação dos condutores, enquanto líderes e gestores do esforço canino torna-se obrigatória, tanto para compreenderem como para se fazerem compreender, o que equivale a dizer que devem dominar e aplicar acertadamente as ordens que constituem o código no seu todo, desenvolvendo para isso as posturas e a sinalética que possibilitam a transformação dos comandos em automatismos. Como se depreende, a obediência é uma disciplina que instrói e capacita donos e cães, carecendo ambos de aprovação.
Antes dos pormenores técnicos relativos ao particular dos conteúdos e subsídios de ensino, importa realçar o papel da recompensa e a contribuição do reforço positivo para o melhor aproveitamento do potencial canino, porque tornaram o adestramento mais célere e menos traumático, suscitando dos cães maior alegria e superior disponibilidade, por verem o seu esforço recompensado. Adeptos do reforço positivo, que não se restringe apenas a um ou dois modos de recompensar, entendemos que a sua adopção veio devolver a dignidade aos cães, tratá-los com o devido respeito e apostar decididamente no seu bem-estar.
De acordo com o nosso método concorrem para o ensino da obediência 3 linguagens, 2 modos e 3 tipos. As linguagens a utilizar e que se reforçam reciprocamente são: a verbal, a gestual e a sonora. Os modos apontam para o ensino atrelado e em liberdade e os três tipos utilizados prendem-se com os possíveis no exercício da condução, a saber: linear, dinâmico e nuclear. Entende-se por condução linear aquela que é desenvolvida em círculo ou em recta, tanto à trela como posteriormente em liberdade, com o cão em marcha, sem transição de andamentos e sem o concurso de obstáculos, funcionando a trela como um verdadeiro cordão umbilical para o condicionamento procurado.
A condução linear é a base introdutória e indutora das conduções que a complementam e que são fruto do seu aproveitamento. A maioria dos comandos neste tipo de condução são subsídios ou comandos de imobilização (alto, senta, deita, quieto, morto e de pé) muito embora sejam contrabalançados com os comandos direccionais de em frente, troca, roda, à frente e atrás. A condução dinâmica é caracterizada pelo uso dos diversos andamentos do cão (passo, marcha e galope), podendo usar-se em simultâneo qualquer dos subsídios de imobilização atrás adiantados. Ainda que a condução dinâmica possa ser requerida à trela, nomeadamente na fase de transferência da linear, ela só ganha o seu sentido quando executada com o cão em liberdade, o que irá obrigar os seus condutores a alguma disponibilidade física, considerando os percursos de obstáculos que não dispensa e onde se robustece.
A condução nuclear, expoente máximo da condução, acontece quando o esforço dos condutores é minimizado e o dos cães é maximizado, deslocando-se os animais distantes dos seus condutores, mas debaixo da sua orientação, executando diversos percursos, evoluções ou conjunto de obstáculos, como se movidos por um “controlo remoto”. Debaixo desta condução e nos percursos circulares, os condutores conservam-se no seu centro e nos lineares os cães dispensam qualquer acompanhamento por parte dos seus líderes. Escusado será dizer que as mudanças de direcção e os comandos de imobilização serão também solicitados à distância. Quando à condução nuclear se junta a linguagem gestual, estamos perante binómios considerados operacionais, próprios para a defesa e guarda de pessoas e bens.
É trabalho da obediência alcançar a tríplice sociabilização canina: entre iguais, com outros animais e com pessoas. A recusa de engodos, o accionar de dispositivos de alarme, o transporte de utensílios e de meios de socorro, o resgate de pessoas, a complementaridade com meios electrónicos, a constituição de cães de terapia e assistência, são também tarefas dela decorrentes. Nenhum cão tem mais ou menos obediência - ou tem ou não tem - e ela tem para nós uma condição exclusiva: o seu cumprimento pronto e imediato, o que define o treino como rigor, já que exercício da obediência canina aprende-se na escola para se aplicar no quotidiano. Eis em síntese o que entendemos por obediência, quais os seus propósitos, utilidade, método de ensino e contribuição para o bem-estar dos nossos fiéis amigos.

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