Antes de avançar o
enunciado sou obrigado a revelar particulares que só os criadores
experimentados das respectivas raças caninas conhecem à partida, muto embora
alguns os ocultem intencionalmente: Cockers
dourados; Dogues Alemães Boston e Arlequins; Filas de S. Miguel vermelhos e negros;
Labradores chocolate; Leões da Rodésia vermelhos; Pastores Alemães azuis, chocolate,
negros, red sable e vermelhos e Serras da Estrela marfim e negros, enquanto
variedades cromáticas recessivas, podem apresentar comportamentos aparentemente
inexplicáveis ligados à sua curva de crescimento e ao alcance precoce ou tardio
das suas respectivas maturidades, sendo por isso animais que merecem a melhor
das atenções e cuidados.
Dito isto, vamos ao
enigma. Um cachorro CPA negro com 4 meses e pouco, que trocou os dentes dos 3
para os 4 meses, com irmãos de ninhada a rasar os 30 kg de peso, recentemente
adquirido e que em casa do seu criador não evidenciou qualquer problema,
resiste agora em entrar para o carro da família desmesuradamente, sem contudo
se mostrar agressivo, mostrando idêntica resistência nas idas ao veterinário e manifestando
em simultâneo um profundo incómodo quando os seus donos lhe pegam ao colo,
gente que gostaria de saber a qual a causa deste comportamento anómalo para
poder valer-lhe.
Pelo que adiantámos fica
claro que estamos perante um animal precoce que foi tardiamente adquirido,
sendo esta a primeira causa para o seu desencanto e resistência. A passividade
(imobilidade) com que resiste denuncia um comportamento submisso, porque doutro
modo insurgir-se-ia de maneira mais agressiva ao incómodo e poderia até morder
atendendo ao seu estádio etário e robustez. Convém relembrar que são muitíssimo
raras, raríssimas, as ninhadas constituídas apenas por valentes, sobrando ao
invés muitas constituídas somente por cachorros submissos, fenómeno em parte
ligado à sobrevivência da espécie e ao seu viver social.
O facto do cachorro ser
precoce levou-o a aceitar mais cedo o peso da hierarquia a que já se havia
acostumado e a estranhar tanto nova liderança como o escalonamento social que
encontrou junto dos seus actuais donos, mostrando-se inseguro e por conseguinte
confuso, não querendo dar mais um passo que o afaste ainda mais do seu criador,
à sombra do qual se sentia seguro e feliz! Que fique claro: estou a falar para
o entendimento dos homens sem ter a intenção de humanizar os cães.
Identificado o duplo
problema, que é de cariz individual e social, importa encontrar-lhe outra
solução para além do retorno do cachorro ao seu criador, solução que seria sem
dúvida do agrado do animal. Como se depreende, o problema é transitório e mais
cedo ou mais tarde desaparecerá, não necessitando para isso de maior empenho
dos donos. Porém, como estamos a lidar com um animal precoce e importa
aproveitar os seus ciclos de maior plasticidade anatómica, que nele acontecem
mais cedo e mais rápido, e sabendo-se que o crescimento físico é acompanhado
pelo crescimento cognitivo, urge resolver o problema quanto antes face ao
bem-estar psicossocial do cachorro e à parceria dele esperada.
Já se está a ver que a
solução virá da interacção entre os donos e o cachorro, interacção que deverá
ser descontraída e não forçada, através de dissimuladas manobras de estímulo,
que independentemente do seu resultado imediato, deverão ser repetidas até ao
resultado esperado. Entretanto, importa manter as rotinas domésticas para que o
cachorro as conheça, saiba com o que conta e se adapte ao seu novo lar quanto
antes. Neste período de adaptação do animal deverão ser evitadas acaloradas
discussões na sua presença e manifestações ruidosas de revolta ou de júbilo
(compreende-se porquê). Com persistência e paciência, mais depressa do que o
esperado, o cachorro largará a tristeza da separação e abraçará o seu novo
grupo, porque sente necessidade dele e detesta ser ostracizado.
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