quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

O ARTISTA DOS TERRORISTAS: UM CONTO INCONTÁVEL (PORQUE SE REPETE E NÃO DEVIA SER CONTADO)

Comecemos pelo “17”, um sabujo de 10 anos, trôpego e sarnento, abandonado e alimentado pela vizinhança num determinado bairro citadino. A sua história é muito fácil de contar, admiti-la é que é difícil. Nasceu numa aldeia remota entre as fragas, o seu pai foi cão-pastor e a sua mãe caçadora, veio ao mundo num curral e numa noite de invernia. Com ele nasceram mais cinco irmãos, só ele e outro sobreviveram, porque os outros iam sendo chapados contra a parede à medida que iam nascendo, porque eram cadelas e havia um muito enfezado. Aquecido no bardo, foi alimentado pela mãe, fraca de leite mas esmerada nos cuidados.
O Celso Gouveia nasceu serrano, fadado para a agricultura e pecuária, exactamente na mesma aldeia do 17, lugar que amava mas para ele sem futuro. Os seus pais sempre rataram por uma economia de sobrevivência, fortemente marcada pela austeridade e por vezes a rasar a fome, mercê da impiedade climática e da falta de meios. Anualmente matavam um porco e ele tinha que durar até ao ano seguinte, permanecendo cobiçado na salgadeira como o melhor dos bens. A carne do bicho era racionada, guardada para ocasiões especiais ou para alguém da família quando estava doente. O toucinho também não escapava à regra e o pão de centeio durava uma semana. Mesmo assim havia folar na Páscoa e broa quando iam à feira. Não raramente entremeavam o azeite com a banha e aguentavam-se com legumes, batatas e castanhas, ingredientes sempre presentes no caldo, por vezes enriquecido com alguns ossos. À medida que ia crescendo, e sem os pais darem por isso, o Celso sonhava em sair dali e vir trabalhar para a cidade. Tinha Lisboa como preferência e a referência foi-lhe alimentada por um primo, estabelecido no Lumiar e proprietário duma mercearia. A ocasião chegou com a ida para a tropa e ele nem queria acreditar, porque foi parar à Ajuda, ao Quartel dos “Lanceiros da Rainha”. Apesar da recruta ter sido dura, dois meses depois de instalado na Capital, já tinha engordado 6 quilos e nunca tinha sido tão bem tratado. Como era brioso e de poucas falas, acabou impedido de um tenente que sempre o amparou. Graças a ele, quando chegou à disponibilidade, arranjou trabalho numa fábrica, passando de camponês e cabo 17 a operário.

Mesmo depois da morte dos seus pais, que ainda lhe deixaram as casas velhas e um pedaço de pinhal, sempre voltava à terra que o viu nascer. Ia matar saudades e de lá sempre saía borracho, pelas agruras do passado e pela vitória na vida. Numa dessas deslocações, depois de bem comido e bebido, provavelmente mais bebido do que comido, porque se escapou para as bandas do rio, deu de caras com uma cadela e dois filhotes, todo eles famintos e de pêlo arrepiado. Pegando no cachorro que mais lhe agradou, disse: “ Tu hás-de ser como eu, hás-de ir para Lisboa comigo. Chamar-te-ás “17”, porque aqui o comandante sou eu e hei-de fazer de ti um bom cabo”. Com a mala do carro atulhada de batatas e garrafões de vinho e azeite, o cachorro viajou por entre as alcofas de castanhas que enchiam o banco traseiro do automóvel. Nessa altura já o Celso era viúvo, encontrando-se aos cuidados esporádicos de uma das filhas, mais amiga de reparos e menos dada a consolos. A patrulha viveu 10 felizes anos, até que o homem morreu e o cão foi posto na rua, à revelia do finado e para desgraça do animal.

A adaptação do cão não foi instantânea e os outros cães vadios também não ajudaram muito, porque o mordiam impiedosamente e jogavam-no para o pior dos territórios, arredavam-no da comida e sujeitavam-no aos piores abrigos. Breve virou uma carga de ossos e viu-se apoquentado pela sarna. A expulsão pela matilha levou-o à procura das pessoas, das conhecidas e desconhecidas, movido pela sobrevivência e cativo à sua experiência anterior. Valeram-lhe os bons ofícios dos vizinhos, conhecedores da sua história e amigos do seu dono. Mas outros fizeram o mesmo e todos lhe davam comida, o “17” virou mascote e tornou-se pertença do bairro, património colectivo e um amigo de toda a gente.

O Alexander, Alexandre para os de casa e prós amigos, quiçá primo daquele “Tony Silva” tantas vezes satirizado pelo Herman, é um cantor da berra, debaixo de bom astral e portador de boa onda, daqueles a quem é comum ouvir-se: “ stress out, tá-se bem! Estamos numa curte, man!” Sem compreender bem porquê e porque a vida tem destas coisas, a sua popularidade aumentou e os seus fãs crescem a cada dia que passa. Precocemente viu-se atirado para a ribalta, uma estrela na constelação cadente que é a vida dos artistas. Apesar da fama, continua um puto birrento e “engalinha-se” com tudo e todos, porque a idade não ajuda e não é fácil ser vedeta. A máscara “in love” que evidencia nos concertos, não se coaduna com a sua pessoa, porque tem imensas dúvidas, deseja mais poder e quer um lugar perpétuo ao sol. Como qualquer jovem é um contestatário, um revolucionário etário afogado no mundo dos negócios, condenado à imagem e ao politicamente correcto. Mas ao chegar a casa, descalça as botas e joga-as para o tecto, prega dois urros e atira-se sobre o sofá. Ali sim, ali está o verdadeiro Alexandre, distante dos microfones e das luzes, desobrigado dos sorrisos e igual si próprio. Deus no palco e rei em casa, adquiriu recentemente como súbditos três Pit Bull, em tudo idênticos aos que proliferam pelos bairros marginais. Apresenta-os como a sua “Trindade” e não tem sobre eles qualquer controle, deixando-os entregues ao seus instintos e acima do bem-estar e direitos dos demais, como três “alexanderzinhos” que todos têm que gramar. Não serão eles os filhinhos do sucessor do Júlio Iglésias? As estrelas têm destas coisas!

Alheio a tudo isto, o “17” descia a praceta do bairro, depois duma soneca e na procura dos últimos raios de sol, porque o frio o incomodava e ainda tinha que suportar a noite. Ia descontraído, sem pressas e sem “dar cartucho a ninguém”, no caminho rotineiro rumo ao lugar habitual. Inesperadamente, vindos não se sabe donde, 3 Pit Bull caiem-lhe em cima, atacando-o ferozmente e cortando-o indiscriminadamente, sem razão ou pré-aviso. Impedido de se defender e tardando o auxílio, a sua vida escoava-se pelo sangue que ia vertendo. Está internado entre a vida e a morte, perante a raiva e indignação dos seus protectores que não vão em cantigas. Parece que acidentalmente alguém se esqueceu de um portão aberto e os cães, tal qual terroristas, aproveitaram a ocasião para a prática do crime. Gostaríamos que o “17” sobrevivesse. Infelizmente não sabemos ainda o desfecho desta tragédia, comum entre nós e fardo do nosso quotidiano. Dezassete é um número que não queremos ver multiplicado. Diz-se que a mudança dos tempos traz consigo a mudança das vontades e a nossa é a de acabar, de uma vez por todas, com aquilo que nos liga às arenas do circo romano. A Lei em vigor é branda com os donos em termos de incriminação, os cães não podem pagar as favas e os donos esconderem-se atrás da simples responsabilidade civil.

Esta história é fictícia, mas podia ser real; fruto da nossa imaginação, mas possível de acontecer. Não se pretende aqui incriminar ninguém, apenas salvaguardar o direito canino à existência, porque tudo acontece pelo beneplácito humano. E bem vistas as coisas, os cães são os menos culpados, quer sejam terroristas ou não. Sabemos educar cães e estamos cá para isso, para aconselhar os donos e aliviar o sofrimento dos seus parceiros, nascidos por consentimento e aprimorados para além da sua vontade.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O NOME DO CÃO

O nome que atribuímos a um cão é algo que o acompanhará para toda a vida e que o diferenciará dos outros, permanecendo inclusive para além do seu desaparecimento. Geralmente atribuímos nomes que nos são gratos ou que vagueiam no nosso imaginário pelas mais variadas razões ou motivos, já que o nome do cachorro acaba por reflectir as expectativas que nele depositamos. Também se põem nomes por despeito; zombaria; antropomorfismo; local de nascimento; por reposição e por sentimentos ou desejos inconfessos. Quando isto acontece é tão clara a autoridade do dono sobre o animal quanto a sua visão especicista sobre o relacionamento a haver entre ambos. Assim, o nome do cão acaba por melhor identificar o dono e o mundo ao seu redor do que a individualidade animal desejada. É verdade que um proprietário canino se desnuda quando trata ou chama o seu cachorro pelo nome. Esse endeusamento humano acaba por evidenciar a sua tacanhez e não raramente a sua cegueira em tal matéria.

Como é do nosso conhecimento o mundo do cão é composto maioritariamente por sons e odores, o que nos obriga à escolha de palavras cuja sonoridade não atente contra a sua integridade psíquica e desaproveite o seu rendimento físico. Mais, o nome deve levar ao conserto daquilo que a genética desacertou e adequar-se às necessidades ambientais ou laborais que o cão terá pela frente. Estamos aqui a falar de bem-estar animal que começa também pela escolha do seu nome, o que nos leva ao estudo e reparo das consoantes que o constituem, já que consoantes labiais; dentais; guturais ou sibilantes despertam diferentes emoções e por isso mesmo respostas diferentes e ninguém quer que elas se tornem inesperadas ou desapropriadas.

Como se conclui, antes da aplicação do nome, importa conhecer as características psíquicas do cachorro e só depois proceder à sua escolha. Aqui pode surgir o primeiro problema: quando eu não tenho como identificar o perfil psicológico do cachorro. Neste caso importa atribuir-lhe um nome querido aos mamíferos que passa pela sonoridade labial e pela tranquilidade das vogais mudas agregadas num dissílabo. Nomes extensos e demora no cumprimento das ordens teimam em separar-se, podendo relegar para depois a salvaguarda da integridade e da vida animal. Convém não esquecer que o primeiro comando de obediência a instalar num cachorro é a atribuição do seu nome e o consequente chamamento. Assim, os nomes devem ser curtos para não se perder tempo nas acções ou haver quebra da sua intensidade ou clímax.

Os sons sibilantes operam travamento e de todo devem ser evitados, porque tendem, geralmente, a funcionar como comandos inibitórios. É catastrófico colocar tais nomes em cachorros cujas maturidades sejam precoces ou tardias, porque nos primeiros podem operar a castração dos seus impulsos à luta e à defesa e por consequência à perca da agressividade desejada e nos segundos, gerar tal confusão e temor até ao total afundamento do binómio, já que o cão virá a “morrer de medo pelo dono” e dificilmente ousará mostrar as mais valias da sua individualidade. Em suma, um nome sibilante sempre carrega o pesado fardo do travamento.

Para melhor compreensão do assunto, reportemo-nos ao caso dos Pastores Alemães. A necessidade da homogeneidade que só os factores dominantes podem oferecer foi o primeiro dos remédios encontrado, o que levou quase à extinção das variedades recessivas por exigirem diferentes formas de travamento. Trabalhar em quadro aberto, numa raça com nove variedades cromáticas diferentes e tirar delas o máximo rendimento possível não é tarefa fácil e exige delicados cuidados e não pouco conhecimento. Por causa disso, nunca se aconselha um cão negro ou de manto vermelho a quem nunca teve experiência anterior com um da variedade dominante, tal é o caso e a prática nos Pastores Alemães. Entre eles e segundo métodos já em desuso, procurava-se a proliferação da variedade dominante e estabelecia-se a altura do treino (por volta de 1 ano de idade) e a maioria dos comandos era de entoação sibilante. Como facilmente se antevê, muitos cães foram considerados inaptos e a selecção foi operada com base nos de maior aptidão. Com isto perderam-se para sempre singularidades e qualidades inerentes àquilo que se eliminou. Estamos a falar do excelente olfacto dos lobeiros ancestrais; do equilíbrio dos cães negros e da ferocidade dos de manto vermelho. A perspectiva militar e a reclamada uniformização dispensaram as diferenças individuais, cativas aos diferentes momentos das suas maturidades. Na verdade, um nome sibilante só faz sentido quando aplicado a um cão muito dominante ou a um inibido, ao primeiro porque lhe estabiliza e regra o impulso ao poder e ao segundo porque só um medo maior o fará arrepiar caminho e levar de vencida os seus fantasmas.
Deixemos agora a história e passemos ao quotidiano. Se o seu cachorro tem um nome sibilante, como evitar os malefícios dele advindos? Evita-se o nome e cria-se um diminutivo de acordo com as características psicológicas do animal, (Jazz » Jazzito » Ito). É de todo desejável que isso aconteça bem antes da sua maturidade emocional, porque os benefícios serão maiores. Em síntese, os nomes guturais devem ser usados nos cães de guarda, os labiais para os de companhia e os dentais para os toys, para os mais carinhosos ou para aqueles que necessitam de uma dose extra de tolerância e carinho. Os nomes guturais transmitem energia e força e serão mais recomendáveis se forem aspirados. Mas que fique bem claro: o nome do cão é sagrado! Só o dono o deve conhecer, ele deve ter dois nomes, um para a rua e outro para a indivisibilidade binomial (intimidade); respectivamente: o de registo e o de tratamento operacional. Assim procederam os treinadores afamados do passado, cuja memória é ainda relembrada através das façanhas operadas pelos seus cães.

Porque dizemos que o nome do cão é sagrado?
Porque só o dono o deve saber e dizer, ele é como um código “pin”, pois é um comando que dá acesso a outros comandos, substituindo facilmente as ordens de “quieto” e “aqui”, o comando de “atenção” e operar a cessação indesejável de qualquer acção. Tudo isto se torna mais fácil, infeliz e erroneamente, quando os donos antecedem os comandos com o nome do cão. Nunca se deve juntar um comando inibitório ao nome do cachorro, já que o animal ao ser chamado de imediato se submete. A isto chama-se uso indevido do nome do cão. Que ninguém tenha dúvidas: para que a resposta animal rapidamente aconteça, não há necessidade de salpicar os comandos com o nome do cão, porque ele não irá melhor obedecer por causa disso!

Na via pública e entre estranhos, perante gente suspeita e meliantes o cão é um “no name”, uma vez que os ladrões rondam e os vizinhos tendem a falar demais. A propósito de vizinhos e para se evitar males maiores, eles só devem conhecer o nome oficial do cão, que de nada lhes vale e é importante não esquecer que as paredes têm ouvidos. Muito cuidado com o uso e abuso do nome do cão! Desejamos que doravante, quanto tiver de escolher um nome para o seu cachorro, não o faça como os demais, que navegam pela Internet à procura de nomes de cães ou o fazem através das mais variadas revistas caninas. Primeiro estuda-se o cão e só depois se aplica o nome, porque importa ressalvar a individualidade biológica do cachorro que lhe cai em mãos.

A CASOTA DO CÃO

O mercado dos acessórios para cães é constantemente invadido por retalhistas franco-atiradores, gente que desconhece qual uso dos seus produtos e que ali se instala para se desenrascar. Outros há que aumentam os seus serviços e enveredam por uma secção de pet shop, vendendo trelas ao lado de grãos, pesticidas, regadores e comida para canários ou periquitos, ignorando de igual modo as necessidades da canicultura e da cinotecnia. E o mercado das casotas não escapa à regra, quer elas sejam de madeira ou cimento. O aumento da procura levou à industrialização das barracas, ainda que no início fossem fabricadas pelo aproveitamento dos caixotes das peças destinadas ao comércio automóvel, fazendo jus ao provérbio: “ no aproveitar é que está o ganho”. Mais tarde surgiram as casotas de cimento, vendidas nas olarias e nos viveiros de plantas, como complemento da decoração dos jardins, graças ao concurso das moradias. Em simultâneo, um “fenómeno” generalizou-se: os cães preferiam ficar à chuva do que entrar dentro das casotas!

Isso aconteceu porque os bichos não se sentiam lá bem, porque ficavam emparedados e tinham que sair de gatas, o que lhes dificultava tanta a saída como a entrada, porque naturalmente não rastejam sem presa à vista e apreciam uma evasão célere e segura. Nas propriedades onde havia gatos e galinhas a utilidade das barracas ainda se fez sentir, perante o olhar indiferente dos cães que procuravam outros abrigos. De vez em quando assistia-se à troca de casotas, porque alguns proprietários caninos ignoravam qual a curva de crescimento dos seus pupilos, nomeadamente aqueles que possuíam cães não padronizados. Para que isso não volte a acontecer, nos cães rectangulares que crescem até ao 1 ano idade, um cão que mede 48 cm de altura aos 4 meses, terá aos doze 65 cm. A partir deste valor, o recurso à regra “dos 3 simples” elucidará qual a altura média de cada cão. Voltemos às casotas.

Já existem no mercado algumas apropriadas, muito embora a sua variedade seja escassa e a abertura das suas entradas seja imprópria. Não lhes restando outra hipótese, muita gente acabou por adquirir casotas para outros fins, desde casas de jardim até casas para crianças à venda no “Toys “R” Us”, no “Aki” ou no “Leroy Merlin”. No nosso entender, a casota indicada para qualquer cão é aquela que considera o seu particular e é feita à medida. A comodidade das casas de madeira não pode ser substituída pela humidade das de cimento e nem pode ser comparada com a aspereza das de plástico. Somos defensores do modelo clássico, com um telhado impermeável de 2 águas e num ângulo de 45º, com uma abertura em arco e com o fundo destacado dos pés (pelo menos 5 cm elevado do solo). Todas as medidas da casota devem ser tiradas a partir da altura do cão em adulto, considerando em simultâneo a sua morfologia (se quadrado, se rectangular). A abertura da porta deve permitir a entrada e saída do cão sem se agachar, a largura da casota deve possibilitar a inversão de sentido ao animal, o seu comprimento deve permitir-lhe metade da área livre e a altura da barraca deve possibilitar-lhe a permanência de pé. A frente da barraca deverá estar orientada a Nascente e nunca a Norte.

Adiantamos as medidas de uma casota para um cão de 60 cm de altura, com mais 15% de comprimento sobre ela:
1. ALTURA – 129 cm
2. COMPRIMENTO – 133 cm (altura do vértice do telhado)
3. LARGURA – 94 cm
4. ALTURA DA ABERTURA – 86 cm
5. LARGURA DA ABERTURA – 45 cm
(As conversões poderão ser encontradas a partir da “regra de 3 simples”)

O CANIL

Em primeiro lugar, entendemos todo e qualquer canil como local de resguardo e descanso, não como habitáculo permanente e análogo a um viveiro ou coelheira. Sempre optaremos pelo canil em detrimento da casota, porque consideramos a vulnerabilidade canina e a necessidade da recapitulação dos comandos de sobrevivência. No entanto, continuamos a dizer que o cão está melhor ao lado do dono, que o canil é uma medida de emergência e visa a salvaguarda do animal na ausência do dono, servindo também para separar o cão das visitas ocasionais, passíveis de lhe causar dano ou entrave operacional. O seu desenho e disposição devem garantir a ocultação do cão e o seu policiamento, o bicho deve ver tudo e não ser visto. Analisaremos a seguir, detalhadamente, os pormenores relativos à sua construção segundo o nosso parecer.

1. Disposição Geográfica: Num local dissimulado, panorâmico, a meio caminho entre a habitação e os limites da propriedade, protegido dos ventos dominantes e virado a Nascente.
2. Desenho: Deve respeitar a arquitectura da casa ou do jardim, aglutinando-se com o ambiente adjacente e de acordo com as suas linhas. Não deve ser visível de imediato.
3. Barreira de Protecção ou Ocultação: Constituída por um canteiro de sebe anterior ao canil, com uma largura mínima de 25 cm e uma altura máxima de 1 metro.
4. Geometria: Qualquer polígono é aceitável, assim como a sua disposição circular. O seu formato não deve constitui-se em destaque e estar sujeito à geometria da propriedade.
5. Área: Havendo essa possibilidade, o seu limite mínimo recomendado é de 10 m2 e não deve exceder os 25 m2, porque o seu tamanho deve possibilitar a transição de todos os andamentos naturais e não constituir-se em estância de lazer.
6. Divisão Interna: Constituída por câmara e antecâmara, constituindo a primeira um 1/3 da segunda, a terminar no telhado e com uma abertura de alto abaixo, sem porta e com uma largura de 80 cm.
7. Câmara: revestida com rodapé em madeira com 1 metro de altura e isolada do piso pela colocação de um estrado amovível. Com uma área nunca inferior a 2 m2.
8. Colocação de Comedouros e Bebedouros: Devem ser colocados na parede externa da câmara, distantes entre si 60 cm. A sua altura dependerá da altura do hóspede ( - 5 cm). Sustentamos o uso de bebedouros automáticos e doseadores de ração.
9. Piso: Antiderrapante e elevado em relação ao solo 5 cm na sua parte mais baixa (à entrada). A inclinação do chão deve ser de 15º deste a câmara até à porta de entrada.
10. Escoamento Sanitário: Para a parte mais baixa do piso e nunca junto à câmara ou à porta de entrada.
11. Frente: Composta por um muro de 80 cm de altura, um gradeamento de 120 cm e uma porta de ferro de 200x80 cm.
12. Porta de Entrada: A abrir para dentro e desenfiada em relação à saída da câmara. Aplicada com moentes, com um fecho interno e dois fechos de culatra exteriores, inclinados para a sua ponta 45º. Se os donos permanecerem muitas horas fora de casa, a porta pode ser completada com duas argolas para cadeado, uma na armação (ombreira) e outra na porta propriamente dita.
13. Gradeamento: Constituído por barras de ferro circulares de 15 cm de diâmetro e distantes entre si de 8 cm, unidas ao centro e nas extremidades
14. Altura do Canil: No mínimo de 2 m, considerando a altura do tratador e o transporte da ração e outros utensílios.
15. Instalação Eléctrica: Composta por tomadas na câmara e antecâmara, interruptor interno e externo, iluminação interna e externa.
16. Telhado: Não havendo a possibilidade de camuflagem com as áreas ajardinadas (bunker), deve ser idêntico ao da habitação, revestido internamente por placa isolante, rematado por algeroz., tombado para a frente e inclinado de acordo com o prédio familiar. Atendendo ao risco de envenenamento não aconselhamos antecâmaras descobertas, particularmente se os canis se encontrarem nas extremas da propriedade.
17. Luz Natural: O canil deve usufruir dos benefícios da luz natural. Por vezes, quando isso não acontece, recorremos à distribuição de telhas brancas pelo telhado.
18. Muros Laterais: Garantida a última condição do nº 1, devem ser compostos por muros de 80 cm que suportam gradeamentos com 120 cm de altura (iguais ao da frente do canil).

Estamos disponíveis para responder a dúvidas e prontos para esclarecimentos complementares. Existem canis que se abrem automaticamente por feixe luminoso e outros típicos para a defesa de pessoas e bens, quando anexos à habitação principal e a desembocar dentro dela, garantindo em simultâneo a protecção e o efeito surpresa. O modelo indicado destina-se a um só cão ou guardião e não abrange actos como o coito e a maternidade, muito embora possa ser adaptado para tal.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O RISCO DE SER PEQUENO

Entre os proprietários e criadores de cães de cães pequenos, os ditos toy ou miniatura, existe alguma relutância relativa ao treino dos seus companheiros, porque são animais típicos de companhia e a sua perigosidade é quase nula., a sua fragilidade é notória e a sua dependência absoluta. Não obstante, nem todas as raças são iguais e existem algumas bastante belicosas, provocadoras por excelência e que se comportam para além da sua fragilidade, apesar de pesarem menos que os coelhos e serem menores que os gatos. Apesar do seu tamanho reduzido e deficitária envergadura, são cães como os demais e produzem indivíduos diferentes, sendo oriundos de uma utilidade desprezada ou dum processo selectivo antinatural, fortemente ligado ao sedentarismo e dominado pelo antropomorfismo, factores que geralmente atentam contra ao seu bem-estar e longevidade. Os rafeiros pertencentes a esta categoria, enquanto mestiços, são geralmente mais saudáveis, apresentam maior vigor e vivem mais anos.

A substituição da autonomia pela dependência leva ao aumento das suas capacidades cognitivas, o que acelera a constituição binomial e potencia a cumplicidade, assistindo-se facilmente à transferência física e anímica do dono para o cão, coisa difícil de alcançar entre cães de maior porte, ávidos de rua e sedentos de marcar território, menos fixados no dono e propensos a outros desafios. Por causa disso, a adopção de um cão miniatura é aquela que oferece maiores garantias de sucesso, porque acontece para além da disponibilidade física dos donos, é própria para a divisão dos espaços exíguos e as suas exigências são diminutas, porque o bicho assimila facilmente a filiação e evolui sem delongas pela relação de paridade. O número de cães miniatura é maior nos espaços urbanos e é comum vê-los nas mãos dos mais idosos ou entregues aos cuidados das donas de casa, como parte integrante do seu bem-estar social ou em substituição dos filhos que já partiram.

Transformado em “rei da casa”, enquanto objecto de maior tolerância e da constância de mimos, o cão miniatura facilmente é invadido pelo ciúme, detesta intromissões e defende com os dentes o seu lugar social, raramente se agrada das visitas e resiste a maiores intimidades. Acaba por sair à rua debaixo do mesmo espírito e faz da antipatia a sua toilette de eleição, tratando os outros cães como subespécie de si próprio, como gentalha inoportuna que se cruza no seu caminho. Arvorado em Leão nas mãos do dono, associa o tratamento ao instinto e tenta afugentar os outros cães, ainda que o faça por medo e confiado nas costas de quem o conduz. E debaixo dessa pretensa autodefesa pode atacar qualquer um, independentemente do seu tamanho, sexo ou idade, mesmo que ali chegue debaixo das melhores intenções. Apesar deste comportamento ser mais visível nos machos, já vimos cadelas a comportar-se do mesmo modo, espelhando idêntica impiedade. Se em determinado bairro ou jardim o cão miniatura for o seu residente mais antigo, é mais do que natural que domine sobre os cães mais recentes, particularmente se ali chegaram em cachorros, por força da vantagem e da experiência directa que garantem o predomínio.

Mais tarde, e isto acontece vezes sem conta, desagradados, os donos dos outros cães atiçá-los-ão contra ele, ainda que o façam de modo premeditado e dissimulado, debaixo de uma capa angelical e denotando falsa surpresa. E quando isto acontece, o “rei” regressa a casa com o manto rasgado e dificilmente quererá sair de lá outra vez. Quando um toy se põe em fuga, depois do insucesso das suas advertências, torna-se numa presa de eleição para os demais, certos do sucesso e impelidos pelo impulso ao movimento que despoleta os inerentes à captura. Se ninguém vier em seu socorro: “rei morto”. Todo o cão, independentemente do seu tamanho, idade ou sexo, necessita da sociabilização. No caso dos miniaturas ela é tão imprescindível quanto para os cães perigosos, para que não se constituam em vítimas e concorrentes a um destino fatal. A sociabilização é para eles o melhor subsídio de autodefesa e grande parte dos seus donos ignora ou despreza o seu benefício. Como diz o povo: “quem anda à chuva, molha-se!”

Em síntese, os cães miniatura devem ser inscritos e concorrer às classes escolares, porque não são gente e a sua vida corre grande risco, porque causam desacatos e necessitam de sociabilização. Ainda que o seu apetrechamento normativo seja à parte devido ao particular morfológico, uma vez instalados os códigos, devem participar junto com os outros nas actividades ao seu alcance, mormente nos exercícios de obediência e nos momentos de evasão, constituindo-se parte integrante da matilha heterogénea escolar. O tamanho de um cão não o dispensa da escola, porque pequenos cães podem causar grandes disparates. Não correm os mesmos riscos que os outros? Quem estará mais sujeito à morte? O cão mais pequeno que treinámos na Acendura foi um caniche anão, media sensivelmente 15 cm e pesava 1,5 kg, foi matriculado em 1993 e em tudo foi aprovado.

A CEGONHA JÁ CHEGOU

A cegonha já chegou e entregou à Rita Rua e ao Carlos Esteves um linda menina. Chama-se Leonor e nasceu às 15H25 do passado dia 26 (por pouco não nascia no dia da Joana). A menina, pelo que nos foi dado a observar, é muito parecida com o pai, evidenciando em demasia os traços fisionómicos do seu progenitor. A Rita encontra-se bem e retornará a casa amanhã, dia 29. Desejamos aos três as maiores felicidades e aguardamos a vinda dos futuros irmãos da Leonor (a Rita que não nos oiça!).

DA TERRA DOS DINOSSAUROS AO PARAÍSO

Este fim-de-semana laborámos os 4 turnos e enfrentamos a invernia. Trabalhámos dentro e fora da Escola, variámos os ecossistemas e dedicámo-nos às diferentes áreas da cinecultura. Houve tempo para as diferentes induções e recebemos algumas visitas. Trabalhámos o carrossel na Lourinhã e acabámos no Palácio da Vila em Sintra. O Francisco vestiu o fato pela 1ª vez e o Zorro agradou-se do facto.

A Carla Ferreira não compareceu porque ficou a reparar os estragos causados pelo temporal. O Roberto ficou retido em casa por causa das suas obrigações paternais. A Pescadinha foi para Lamego e o Gonçalo foi apanhado pela gripe. O Rui Ribeiro foi trabalhar e coube à Ana a condução da Babel. O supermercado não deu folga ao Tiago e a Elisabete foi para o Porto visitar a mãe.

A família Ferreira & Veiga Santos foi para o Portugal profundo e a Costa para paraíso incerto. A Isabel Silva não compareceu e o Carlos Santos participou nos trabalhos com a Fortuna. A Joana trabalhou os 4 turnos e a Ana tomou conta da criançada. Almoçámos nos “Grelhados da Aldeia” e no “ João da Vila Velha”. O Sr. António da Cunha compareceu aos trabalhos de Domingo e deixou o Zorro no Hotel. Deu também entrada no hotel o “Mike”, um CPA negro de características guardiãs.

Participaram nos trabalhos os seguintes binómios: Ana/ Babel, Isis & Loki, António Cunha/Zorro, Bruno/Pepe, Carlos Santos/Fortuna, Eduardo/Micks & Vega, Francisco/Luna, Joana/Flikke, Jorge/Juvat, Luís Leal/Teka I, Rodrigo/Tarkan, Vítor Hugo/Yoshi e Zé Gabriel/Master & Menina.

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

MENSAGEM NATALÍCIA DE ÁFRICA

Recebemos do Rui Santos, condutor do CPA Red, o seguinte e-mail:
“ Venho por este meio desejar Boas Festas a todos os alunos e ex-alunos da Acendura, em especial ao Sr. João e família, Dr. José Gabriel e família, Octávio e família, Xana (princesa) e família, e a todos os outros que não são mencionados. Tenho visto o Blog e pontuado, eu estou em Angola, pensei que fosse do vosso conhecimento porque eu falei na Escola que iria voltar. Tive conhecimento do Jantar de Natal através do Blog, desejo que tudo corra bem como é costume, eu não vou poder ir por estar em Angola, só voltarei pró ano, se tudo correr bem como esperamos. Dia 2 de Fevereiro estaremos em Portugal. Beijos e abraços para todos. Rui Santos.”
Retribuímos-lhe os mesmos votos, desejamos trabalho profícuo e bons proventos.

A FESTA DOS CONDUTORES

Como já vem sendo hábito, realizou-se no dia 22 deste mês o tradicional Jantar de Natal da Acendura. O evento teve lugar no Restaurante Típico Beija-o-Boi, no lugar do Barro, Loures. Cerca de 40 condutores de cães fizeram-se presentes, sendo acompanhados pelas suas famílias e preenchendo meia centena de cadeiras. As entradas foram várias e muito apetitosas, destacamos algumas: presunto, queijo curado, salada de orelha, pimentões recheados e ovos com farinheira. O menu constou de dois pratos, um de peixe e outro de carne, respectivamente: bacalhau assado com couves e batatas a murro e carne de porco assada. As sobremesas foram variadas e cativas à doçaria ribatejana, os vinhos de proveniência regional e o serviço foi esmerado. Foram ainda servidos cafés e diferentes digestivos.

A Carla Ferreira e a Elisabete (rapaqueca) celebraram ali o seu aniversário, sendo depois convidadas para o tradicional beijo ao boi, devidamente uniformizadas e de acordo com a circunstância. 85% dos condutores que se fizeram presentes são recentes e os restantes mantêm o nosso espírito e dividiram com os demais as suas experiências. Nota de destaque para o Eduardo Ramos que inundou de alegria a sala. A Família Castanheira ( Luciano, Ana e filho) fez-se presente e com ela convivemos agradavelmente. A Joana usou da palavra e bem, deu-se a palavra aos condutores menos extrovertidos e todos foram apresentados. O jantar terminou com dois fados e sem acompanhamento à viola. O guitarrista e o cantor foram a mesma pessoa: o Dr. Zé Gabriel, que a todos espantou pela sua voz maviosa e excelente execução técnica, emprestando à noite emoção e poesia. O nosso amigo Luís Filipe de Sousa Matos esteve entre nós e finalmente conhecemos o marido e o filho da Carla Ferreira. Os miúdos souberam comportar-se e cedo adormeceram.

No meio da confraternização houve lugar à paródia e o Carlos Veríssimo esteve inexcedível e irrequieto, como é seu hábito e tendência, sendo nisso único e dando azo à diferença. Participaram no evento os seguintes condutores: Afonso, Alexandra, Ana Castanheira, Ana Pinto, António Cunha, Bruno, Carla Ferreira, Carlos Veríssimo, Cristina Alberto, Eduardo, Eduardo Ramos, Elisabete, Francisco, Francisco (T), Gonçalo, Gonçalo Leal, Joana, João Franco, João Garrido, João Moura, João Ramos, Lila, Luciano Castanheira, Luís Franco, Luís Leal, Luís Matos, Manel, Maria, Octávio, Pedro Costa, Pedro Rocha, Princesa, Roberto, Rodrigo, Rui Ribeiro, Susana, Tiago, Virgílio, Vítor Hugo e Zé Gabriel.

O ÚLTIMO DOS VADIOS: O HOMEM-CÃO

Nas sociedades organizadas o número de cães vadios tem diminuído significativamente, apesar da adopção ser deveras inferior aos ofícios da injecção letal. O lugar outrora ocupado por esses cães, é agora disputado pelos sem abrigo, tão vadios quanto os primeiros e sujeitos à mesma sorte. A tendência generalizada daqueles que gostam de animais é atribuir-lhes qualidades ou prerrogativas humanas, mas nós não fomos por aí, tomámos exactamente o rumo inverso e fomos à procura de homens com características caninas. A tarefa não foi difícil e deparámo-nos com o homem-cão: o sem abrigo, um rebola contentores que se barrica em cartões e caixotes e que se abriga em espaços próprios para animais abandonados. Tal qual cão de igual fado, o sem abrigo vive arredado do grupo e distante da família, vê encurtado o número dos seus dias e convive diariamente com a morte. Como cão geneticamente impróprio, sobrevive pelos instintos e despreza os impulsos mais comuns e necessários à sua aceitação. Apesar de nele ainda existir a esperança, adormece agarrado ao passado e teima em acordar, como rafeiro que se esconde para não ser incomodado. Talvez se encontre doente e a doença seja crónica ou congénita, talvez seja um incapaz, um impróprio, um cobarde ou um suicida, mas não deixa de ter um nome e ser um irmão ao nosso lado. Se na arcada de um teatro clássico se encontrarem dois vadios, mesmo no Natal, e um for homem e outro cão, qual dos dois será mais facilmente adoptado?

O Natal, para além de uma evocação, é uma celebração de agradecimento a Deus, que através do nascimento do Seu Filho se tornou homem, habitando entre nós para nos trazer a Paz, uma manifestação inequívoca do Amor Divino sobre a decadente fraternidade humana, inebriada de rituais e distante dos propósitos seu Criador, que a todos pretende salvar. O Natal induz-nos à Páscoa e nela se revela a essência da Fé Cristã: um Deus que morre por nós, ao contrário de outros que obrigam à morte dos seus seguidores. O Deus revelado em Cristo coloca-nos a todos e em exclusivo debaixo do Seu sacrifício vicário, como único caminho para a ressurreição e para a comunhão celeste. O natal ocidental tornou-se numa festa do consumismo, num preceito distante do seu sentido original, numa ocasião de barriga farta perante aqueles que nada têm para comer e que são tratados abaixo de cão, esquecidos pelo encerrar das janelas e pelo ribombar dos cânticos. Não podemos mudar o mundo, mas podemos suavizar o sofrimento de alguns, dar mostras do que recebemos e torná-lo extensível aos mais próximos, porque assim cresceu a Igreja Primitiva, quando à Eucaristia sucedia a divisão dos bens. Quando ao Natal se tira a perspectiva escatológica, o carácter transitivo da nossa vida aqui, morre a Fé e a porca volta ao seu chiqueiro.

Os cães recebem presentes no natal: uma nova coleira, uma trela brilhante, iguarias do seu agrado e são objecto de maior tolerância. Alguns deles sentam-se à mesa com os donos e são os seus únicos companheiros, recebem capas para o frio e são convidados para o seio familiar, tornam-se gente e isso agrada-lhes, ainda que o desconheçam a causa da honraria e ignorem o que é natal. Entretanto, lá fora, o sem abrigo continua vadio e ainda há quem lhe atice os cães, como se fosse um lobo esfaimado prestes a atacar. Só a cegueira pode garantir a supremacia do antropomorfismo sobre a fraternidade, a menos que vivamos em matilhas ou alcateias e nisso nos sintarmos esplendidamente. De qualquer modo, o preço usual de um brinquedo canino garante duas refeições económicas a um sem abrigo, carenciado delas e incapaz de as alcançar; o preço médio de uma saca de ração de qualidade dá para sustentar um sem abrigo durante uma semana. Daqui apelamos à generosidade, aos nossos condutores e leitores, a todos aqueles que tendo cães, não vivem de costas voltadas para os homens.

Quando falamos sobre este assunto, lembramo-nos de uma história verídica, a acontecida a um comandante de polícia dos Palop’s. O Sr. Brigadeiro fulano tal veio a Portugal comprar-nos 2 casais de Pastores Alemães, aproveitando a ocasião para adquirir também alguns veados. Como os Pastores eram cachorros, adiantamos-lhe a receita do “reforço” e como por lá não existia qualquer distribuição de ração, ensinámos-lhe a confecção dos diferentes pensos, coisa que muito agradeceu e prometeu levar à risca. Passado um ano voltou a visitar-nos, o que muito nos alegrou. Pensávamos nós que os cães tinham sido aprovados e que vinha à procura de mais. Infelizmente a realidade foi outra, os cães acabaram envenenados pela população, que não raramente lhes roubava a comida, porque a fome grassava e não tinham o que dar às crianças. Temendo pelos cães, não lhe vendemos mais nenhum. Apesar de triste é verdade: nas cidades os sem abrigo e os cães vadios lutam entre si pela sobrevivência, assistindo-se ao combate entre bípedes e quadrúpedes de idêntica condição, fora de horas e ao redor dos caixotes do lixo. Ainda que não o queiramos, este Natal não irá ser diferente, porque haverá fartura de sobras e o frio aperta.
* PS: Ainda não nos deparámos com nenhum sem abrigo chinês, budista ou muçulmano.

O ANIVERSÁRIO DA JOANA

A Joana Moura chegou-nos com 10 anos, franzina e irrequieta, difícil de aturar e muito mimada, não fosse filha única e o tesouro dos seus pais. Ao longo deste quatro anos cresceu e amadureceu, tornando-se uma referência da Escola e uma condutora de créditos firmados. Transformou o egoísmo em amizade e desenvolveu um extraordinário espírito de equipa. Foi ela que tornou possível a condução da Xita pelo pai e sempre se prontifica para ajudar os condutores recém-chegados. O Binómio Joana/Flikke está condenado ao sucesso e tem-nos acompanhado por toda a parte, evidenciando a nossa filosofia e preocupações, participando nos diferentes eventos para os quais somos solicitados. Ontem trabalhou connosco na Cruz Quebrada, entre os rios Jamor e Tejo, executando diferentes automatismos direccionais sobre um pontão ali existente. Hoje faz 14 anos e desejamos-lhe as maiores felicidades, queremos manifestar o nosso agradecimento pela sua dedicação e estamos certos que o futuro lhe sorrirá, porque é uma vencedora e tem sido treinada para isso. O seu exemplo enche-nos de alegria e dá-nos alento, dá sentido ao que fazemos e leva-nos para diante. Parabéns miúda, para ti e para o teu super-pai.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

UM CONTO DE NATAL

O Sr. Armindo Martins detestava o Natal, há anos que vivia sozinho e há mais de vinte que era viúvo. Raramente o passava com a única filha que tinha, isso só aconteceu uma vez, quando ela era ainda solteira. Depois de casada nunca mais, porque sempre passava a consoada com o marido e a filha na Ilha da Madeira. Sem ninguém por perto, o reformado foi endurecendo o seu coração, ao ponto de abominar as iluminações que anunciavam a época natalícia, porque acusava a solidão e via-se um inútil, ausente de qualquer préstimo e arredado de qualquer solicitação. Farto de passar natais à frente da televisão, até porque os filmes eram sempre os mesmos ano após ano, decidiu fazer um diferente, pegou no seu velho “Simca” e fez-se à estrada, sem destino determinado e pela orla marítima. Circulava sozinho pelo breu da noite, pela estrada deserta e infinda, com o murmúrio das ondas à esquerda e o troar da água nas valetas. Chovia quanto Deus o dava e a carripana resvalava invariavelmente, apesar da marcha lenta e das cautelas do ancião. Sem ninguém com quem falar, ia ocupando a cabeça com memórias, com pequenos flashes da experiência vivida agora retratados na noite. O reviver mantinha-o acordado e a distracção breve se fez sentir, rumo ao norte e para parte incerta, estrada acima e sem horizonte à vista.

Subitamente, vindo do nada, eis que um cão se atravessa à sua frente. Instintivamente, o Armindo carrega desalmado no travão, o carro derrapa e vai parar a escassos centímetros do bicho, não lhe causando qualquer dano. No meio do susto solta: “ Oh alma do diabo, filho de mãe nada virtuosa e de pai desconhecido!” O bicho nem se mexeu, com os olhos a brilhar contra os faróis, molhado que nem trapo encharcado, surpreso e tolhido de medo. Não se avistava vivalma naquele lugar de ninguém, o silêncio cortava mais do que a chuva e o vento tinha parado. Sem pensar, o homem dirigiu-se à berma e pegou uma pedra, queria correr com o cão dali, não que tivesse alguma pressa ou que alguém o esperasse. Perante a ameaça, o cão virou-se de barriga para cima, com os olhos hirtos e com as orelhas estendidas sobre o asfalto. As suas malhas não escondiam as costelas e a cauda não parava de abanar. “Só me faltava esta, um taliban de quatro patas! Será que também andas à procura de virgens no céu?” A pedra voltou para a valeta e por breves momentos ficaram olhar um para o outro, sem saber o que fazer, especados no meio da estrada, sem testemunhas e indiferentes à invernia. A exaltação cedeu lugar à ternura e o homem compadeceu-se do animal por força do destino comum. Depois de algum pensar, o Armindo colocou o cão dentro do carro e disse: “ de pobre já não passo e a rico já não chego, aqui está a minha prenda de Natal!”

Pelo caminho ia olhando para o bicho, procurando indícios para lhe aplicar um nome. O cão rapidamente se enroscou e adormeceu, alheio ao pormenor e comodamente instalado. Depois de muito matutar e porque estávamos no Natal, entendeu chamar-lhe “ Mago”, em alusão aos reis que transportam os presentes e que são figura obrigatória em todos os presépios. Ao chegar à porta de casa, arrumou o carro à pressa, com um pneu contra o passeio e não se importou, escondeu o Mago debaixo do sobretudo e entrou em casa de mansinho, para que ninguém desse por eles e obrigasse a maiores explicações. Depois de secar o cão, foi ao congelador buscar umas postas de bacalhau, descascou umas tantas batatas e pôs a comida ao lume. Foi à sala e pôs a mesa, lançando mão de uma velha toalha de linho, a de sempre e há muito arrumada, própria para a ocasião. Comeram com alegria e desfrutaram da companhia um do outro como dois convivas em festa maior. Lá fora chovia e nenhum deles se importou com isso, porque a casa ganhou vida e os seus corações alento. Por volta da meia-noite a filha ligou e obteve esta resposta: “Estou melhor do que imaginas, fui visitado por um mago, ceei com ele e agora dorme ao meu lado!”

YOU’LL NEVER WALK ALONE

Apesar do título acima ser tema duma canção de claque no futebol britânico, ele também espelha o nosso cuidado com os cães e desnuda os nossos propósitos nas áreas da canicultura e da cinotecnia, porque fazemos da sobrevivência canina o nosso primeiro objectivo, formando para isso condutores e criadores debaixo de árduos critérios selectivos, porque os cães necessitam de quem os ensine e jamais sobreviverão sozinhos. Os nossos condutores são formados a partir do sentimento que os leva à procura destes animais, mediante subsídios que possibilitam a mensagem clara e oferecem a comunicação interespécies. Obrigam-se, entre tantos outros deveres, à aquisição de uma postura e mímica próprias para o salutar exercício da liderança, ratificado pela resposta animal e dirigido à coabitação. Optámos pelo termo “condutor” em prejuízo do já existente “tratador”, porque cada homem é em simultâneo proprietário e tratador, abrigando debaixo do mesmo tecto o seu cão, enquanto parceiro omnipresente com direitos e obrigações. Os condutores da Acendura ou dela advindos são reconhecidos por um conjunto de procedimentos dos quais adiantamos alguns:


1. Exemplar instalação doméstica canina (o cão é um membro da família adoptiva).
2. Aplicação de regras domésticas que garantam a perfeita coabitação.
3. Operação do desenvolvimento cognitivo animal pela cumplicidade que leva à interacção.
4. Distribuição de penso adequado à idade e ao desempenho do cão.
5. Robustecimento do carácter canino pela presença, incentivo e exemplo do dono.
6. Limpeza diária do animal e tratamentos preventivos (medição da temperatura inclusive).
7. Constituição Binomial.
8. Inscrição escolar canina partir da idade da cópia (4 meses), segundo o Método da Precocidade.
9. Recapitulação doméstica dos conteúdos de ensino ministrados em classe.
10. Prática diária da excursão canina à trela, na distância de uma légua ou no período de uma hora.
11. Sociabilização canina entre iguais e interespécies.
12. Desempenho binomial em diferentes horários, situações e ecossistemas.
13. Aumento da resolução canina face aos desafios que lhe são colocados no quotidiano.
14. Instalação e reavivamento dos automatismos de sobrevivência.
15. Uso de 3 linguagens na transmissão das ordens.
16. Batida prévia dos territórios destinados à evasão canina.
17. Gozo de férias conjuntas.
18. Escrupuloso cumprimento do calendário de vacinação e check-up anual canino.
19. Doseamento do esforço animal de acordo com as suas características e estágio etário.
20. Respeito pelas regras em uso na sociedade, nomeadamente pelos direitos individuais.

  • Os procedimentos enunciados podem servir de teste aos condutores que desejem aquilatar e quantificar a sua prestação binomial. As contas são fáceis de fazer!
Esta breve resenha de procedimentos só é possível pela excelência de serviço dos condutores, apostados no bem-estar dos seus cães e ávidos de novos conhecimentos ou subsídios, movidos pelo amor consequente que busca a perfeita parceria, graças à humildade que os leva a querer compreender e à responsabilidade das suas opções, porque adestrar é um acto inteligente e dependente da liderança, um conjunto de exercícios que visa a capacitação ambivalente de homens e cães. Continuamos a defender que o cão não nasceu para estar só e daqui não arredamos pé. Como começámos em inglês e porque sempre defenderemos o mesmo, apraz-nos dizer: “ never surrender!”

O CÃO DIVINO

Há gente que idolatra os seus cães, que vê para além daquilo que tem na frente e se distancia da realidade, interpretando defeitos por virtudes e manhas como mais-valias, disposta a suportar tudo como se os eles fossem deuses. Não raramente a “divindade” aproveita-se disso e os donos levam vida de cão, condenando também os mais próximos aos seus arrufos. Já houve casais que se separaram por causa disso e alguns nem podem chegar-se ao seu cônjuge. Geralmente o caso toma maiores repercussões entre aqueles que apenas têm como companheiros os seus cães, porque lhes atribuem prerrogativas impróprias e pensam agir acertadamente, ainda que sejam suas vítimas, ataquem os veterinários ou ponham os vizinhos pra correr. Se entendermos a matilha como grupo social, facilmente compreendermos qual o papel nos cabe e como proceder, já que ela não subsiste sem regras e cada individuo tem nela um lugar próprio. Os deuses só subsistem pela “fé” dos seus crentes e quando eles acabam, levam consigo as suas divindades (que o digam os deuses greco-romanos da antiguidade). Exceptuando os casos mais graves que têm uma origem genética, a maioria dos cães torna-se agressiva por incúria ou consentimento, por razões ambientais que reflectem a ausência de uma liderança activa e o despreparo dos seus proprietários. Assim, a convivência canina carece de ser regrada e qualquer cão deve ser construído e aprovado diante da regra, a menos que queiramos sujeitar-nos às dele e arcar com as suas consequências. Par melhor ilustrar o que aqui dizemos, vamos contar-vos a história verídica do “Xau Pi” e da sua dona, um Sharpei duma senhora de meia-idade e reformada.

O Xau Pi era o terror dos veterinários e não hesitava em atacá-los, ainda que pequeno para a sua raça. A sua última veterinária, farta de ser mordida, aconselhou a dona a treiná-lo, para adquirir boas maneiras e ser mais fácil o seu maneio. A dona abraçou a ideia, informou-se de várias escolas e acabou por nos encontrar. Entravam na escola desvairados, varrendo tudo e todos, com o cão a rebocar a dona e ela correndo descalça, com os sapatos de salto na outra mão. O cão e a dona eram um verdadeiro cocktail molotov, uma combinação explosiva que não poupava ninguém e que obrigava à debandada. Nas primeiras lições, porque o cão resistia à colocação do estrangulador e a dona era incapaz de o pôr, coube ao Adestrador essa tarefa que sempre acontecia pelo afastamento da condutora. Certo dia, convicta do seu sucesso, decidiu ser ela a realizar esse trabalho, apesar das sucessivas advertências para não o fazer. Afastou-se dos demais e correu para um canto. De repente ouve-se um rosnar gutural e prolongado, secundado pela seguinte exclamação: “ Xau Pi, filhinho, está descansado, o sangue que corre não é teu, é do braço da mamã!” Fizeram meia dúzia de lições e desapareceram. Mais tarde houve quem visse a dona com mais 3 Sharpeis, em tudo iguais ao Xau Pi, para martírio dos veterinários e receio dos vizinhos. Um deles, o do 1º andar, só saía à rua de moca alçada e com as virilhas contraídas.