domingo, 5 de janeiro de 2020

COM OS MALQUISTOS ENTRE AS GENTES

Os cães com pedigree, atendendo ao exagerado número dos que há por adoptar, são hoje tão mal vistos que acabam por ser desprezados, como se a sua uniformidade fosse apenas sinónimo de problemas ou desgraça. Como sabemos que não e conhecemos as suas especificidades, assim como as suas mais-valias, tomámos como objectivo da aula de ontem apresentar os nossos a quem connosco se cruzasse, para que mais gente experimentasse como é agradável e bom ter um cão assim, seja em que idade for.
Ao contrário do que muita gente pensa, porque a ignorância somada ao medo não é boa conselheira, os cães territoriais, sumariamente descritos como “de guarda”, são excelentes companheiros de crianças, tornando-se invariavelmente seus cúmplices de brincadeiras e protectores, pelo que a sua coabitação é possível e até desejável. A foto que se segue pretende demonstrar o que acabámos de dizer.
A lealdade e seriedade de certas raças caninas, quando adequadas para o efeito, ao participarem nas brincadeiras com as crianças, conseguem gradualmente libertá-las das cinofobias e traumas oriundos da sua própria natureza ou que lhe foram infligidos pelo peso sociocultural.
A interacção entre gente adulta e cães, surpreendentemente, é por vezes mais difícil de alcançar. E quando assim é, o melhor que há a fazer é integrar os adultos receosos num grupo que está perfeitamente à vontade com os cães, para que se sintam mais seguros e confortáveis (a terceira pessoa a contar da frente, uma afro-brasileira de óculos, confessou-nos que tinha medo de cães).
E como o destino é pródigo em surpresas, acabámos por providenciar um encontro entre uma madeirense e uma açoriana, ambas a residir no Continente (Portugal não podia ter sido melhor representado). A garota, agora a frequentar o 5º ano de escolaridade, é madeirense e a açoriana é Nasha, uma Fila de São Miguel que constituiu binómio com a menina. Vale a pena reparar nos olhos da cadela, como que a perguntar ao Adestrador: “ o que é que eu faço com esta?”
Nestas andanças da sociabilização canina e da integração harmoniosa dos cães na sociedade, já tem o Afonso com a Nasha vasto traquejo, muito embora o miúdo seja por natureza, tímido e introvertido, só se mostrando quando solicitado, o que acaba por surpreender muitos atendendo à sua técnica e ao desempenho da cadela.
Esta vontade indómita e necessária de levar os cães às pessoas, afinal tão natural em nós, nem sempre corre bem à primeira, porque há gente que quer pegar nos cães, mas que não tem jeiteira nenhuma. Com empatia e paciência, conforme é-nos exigido, conseguimos vencer os contratempos e transmitir alegria às pessoas.
Da parte da tarde tivemos a companhia do binómio Nuno/Boris e acabámos por deslocar-nos a uma feira de antiguidades que rivalizava com um grupo de carrosséis, que disputavam entre si os poucos clientes com um barulho ensurdecedor, local ideal para acostumar o pequeno Boerboel aos exagerados ruídos urbanos. Não conseguindo ficar ali sozinho sem a ajuda do dono, o Nuno permaneceu a seu lado para confortá-lo (dentro em breve já não será preciso).
Aos cães adultos presentes pedimos um pouco mais e colocámo-los junto a um carrossel pouco concorrido, onde algumas crianças gritavam de excitação. Mesmo com o carrossel pelas costas, os dois cães permaneceram quietos e impenetráveis, seguros no cumprimento das ordens (a mímica das suas orelhas denuncia a presença de pessoas na sua retaguarda).
O CPA Bohr, que é tradicionalmente desconfiado com as pessoas, muito por culpa do Paulo que consente que ele se deite debaixo das suas pernas, operando dessa forma, indevidamente, o robustecimento do sentimento territorial do cão, acabou por encontrar uma senhora que o acarinhou e à qual lambeu a cara (alguém dirá que não era preciso tanto).
Depois daquele “quebrar do gelo”, a dita senhora dispôs-se a passear o Bohr, que apesar da ternura daquela condutora eventual, estava mais interessado em regressar para o seu dono, “pendurando-se desalmadamente à esquerda”, que é o que os cães fazem quando não sabem andar à trela ou não lhes agrada a companhia.
Ao abandonarmos a feira de antiguidades e o parque de diversões, na procura de mais uma foto para o álbum do Ben, colocámos o velho Fila e grande companheiro enquadrado entre duas violas, onde o olhar do cão já não consegue disfarçar o peso dos seus anos, pormenor que não o impede de ser um grande companheiro.
Com cinco horas de caminhada em cima das pernas, demos alguma pausa de descanso aos binómios, convidando os condutores para uma bebida quente ou fresca numa esplanada onde o sol espreitava. Uma das garotas que servia às mesas, indiferente ao frio que se fazia sentir (não há como a mocidade), acabou por acariciar o Ben e dizer-nos que também ela tinha um cão.
Ainda com decorações de Natal, que só serão recolhidas depois do Dia de Reis, dia 6, deparámo-nos com uma loja com uma rena à porta, cenário ideal para colocarmos a seu lado o CPA Bohr. O cão posou para a foto irrepreensivelmente e a rena parece transtornada com tal companhia (estávamos a treinar o “quieto” numa rua movimentada na baixa da cidade).
Apesar de não sabermos se os chineses são imortais ou se acabam no “Pato à Pequim” (raramente encontramos a sepultura de algum), certo é que o seu número tem aumentado entre nós, ao ponto da sua segunda geração se fazer presente no secundário e nas universidades, onde alcançam a reputação de disciplinados, interessados e esforçados. Também nos nossos jardins é comum ver-se miúdos chineses a brincar e, se eles estão cá, nada como acostumá-los aos cães, que foi exactamente o que fizemos quando encontrámos um.
Depois de deixarmos o pequeno chinês em paz, que voltou a dar chutos numa bola, reparámos num multibanco ao nosso redor e acostumámos os cães presentes a permanecer junto dele, para que futuramente guardem os donos por ocasião de possíveis levantamentos.
Como o frio afiava o nariz e não era conveniente ficarmos parados, encontrámos mais adiante uma senhora que se encantou com os nossos cães. Sem querer abusar da sua paixão, pedimos-lhe que conduzisse o Ben, desejo que cumpriu com natural desembaraço e com a anuência do cão.
Mais adiante, a usufruir dos últimos raios de sol do dia, com uma cachorra refilona, minúscula e recentemente adoptada, que parecia querer comer este mundo e outro, reparámos numa jovem avó que se encontrava sentada num remate de canteiro. Ao ver-nos, a senhora pegou na cachorra temendo o pior. Para acalmarmos ambas, colocámos junto delas o Bohr deitado, estratégia que fez retornar o silêncio e a paz.
Entretanto, vinda não se sabe de onde, acerca-se de nós a filha desta senhora, que apesar de jovem, já tem um filho bem crescidinho. Simpática como a mãe e manifestando a mesma capacidade de diálogo e disponibilidade, predispôs-se prontamente a conduzir o velho Ben com a jovialidade própria das suas poucas primaveras.
Já de regresso a casa, cruzámo-nos com um casal luso-francês que se fazia acompanhar de uma filhinha com 10 anos de idade, que de imediato correu a acariciar os cães. Sensibilizados com o seu gesto, deixámo-la conduzir o Ben por momentos, o que muito agradeceu.
Participaram nos trabalhos os seguintes binómios: Adestrador/Blaze; Afonso/Nasha; Jose António/Ben; Nuno/Boris e Paulo/Bohr. As fotografias ficaram entregues ao José António e ao Paulo. A Família Gonçalves, sénior e júnior, veio visitar-nos. A Professora Fernanda perguntou pelo José Maria que foi seu aluno e que devido aos seus múltiplos afazeres, por demais cansativos, diga-se, viu-se obrigado a ficar em casa. Para a semana daremos conta das actividades que iremos realizar. Um Bom Ano para todos!

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