O facto
do Brasil ter sido um sonho português, não implica que seja um pesadelo para os
brasileiros, que apesar de independentes há quase dois séculos, ciclicamente vêem
agravadas as suas condições de vida, a despeito do tamanho, recursos naturais e
possibilidades do País, que o tornam numa potência mundial e numa das terras
mais promissoras do Globo. E perante isto, vale a pena perguntar: como pode uma
Nação tão rica ter tanta gente tão pobre? Antes de tentar responder à pergunta,
quero esclarecer que o faço como estrangeiro, sem pretensões imperialistas ou
debaixo de qualquer sentimento paternalista, unicamente como admirador dessa
Terra e amigo dessas gentes, Nação que bem conheço e povos com quem tenho
trabalhado lado a lado. E digo isto porque já senti na pele o peso de ser
português em Terras de Vera Cruz, ao ser responsabilizado pela escravatura e
caricaturado como “Manuel e Joaquim”, particularmente no Sul do Brasil. Exemplo
disso (entre tantos) foi o que me aconteceu em Curitiba, cidade onde as pessoas
têm fama de serem “grossas”, numa Escola Secundária e na Sala dos Professores,
onde fui apresentado a alguns deles. Mal disse que era português, a
coordenadora pedagógica daquele estabelecimento de ensino, uma afro-brasileira,
em tom amargo e sentencial logo soltou: “vocês são responsáveis pela
escravatura!”, o que em termos de boas-vindas não foi a melhor das recepções.
Mais do que ligar para o passado, inalterável e nem sempre bem contado, importa
que os brasileiros construam já hoje o Brasil do futuro, mais fraterno, mais
justo e por consequência menos miserável.
Que bem
calharia à Presidente Dilma Roussef, se a Selecção Brasileira de Futebol tivesse
ido à final e ganhasse a Copa do Mundo, porque pela alegria dos simples
sufocaria, mais uma vez, as vozes de descontentamento e as reformas que tardam
em chegar, inevitáveis e mais do que justas. Infelizmente para ela e para todos
os que transpiram futebol, tal não aconteceu e o “escrete canarinho” sofreu uma
derrota inesperada, desusada, histórica e humilhante frente à Selecção Alemã
(7-1), a mesma que deu 4-0 à Selecção Portuguesa, resultado mais do que justo
diante da prestação dos nossos jogadores, que mal se sustinham nas pernas
(Ronaldo inclusive). Com o afastamento da Selecção Brasileira, o Governo do
País perdeu o melhor dos seus aliados e vê comprometido o cumprimento do seu
mandato, a soldo não se sabe de quem e manifestamente contra os interesses dos seus
cidadãos, outra vez manietados, ignorados e espoliados.
O
descontentamento social, visível nas ruas de várias cidades brasileiras, deverá
continuar e até agravar-se, porque os milhões destinados ao futebol deveriam
ter como destinatários os que vivem no limiar da pobreza, mas que apesar disso
ainda sentem orgulho em ser brasileiros. Por detrás dessas manifestações
espontâneas, velhos algozes desalojados espreitam oportunidade, em tudo iguais
àqueles que hoje governam, que devolvem em porrada as promessas feitas ao povo,
a quem tratam como massa inerte e desprezível. Assim como a selecção não podia
viver só de Neymar, também o Brasil não necessita de um iluminado, mas de se
unir em torno do que é essencial: a melhoria das condições de vida dos brasileiros,
direito alienável que deverá ser discutido por todos, sem excepção, já que o
País necessita de um amplo consenso nacional e não de ser fraccionado.
Como
tenho vivido com o “povão” e visitado amiúde o Brasil, ouvindo todos e
deslocando-me de Norte a Sul, conheço razoavelmente as suas assimetrias e
choco-me com a xenofobia que grassa um pouco por toda a parte, apesar de
condenável à luz da Lei, como se o País ainda vivesse debaixo de um regime
colonial e as pessoas fossem melhor ou
pior aceites de acordo com a sua raça ou origem. Termos pejorativos como
“baiano”, “cabeça-chata”, “alemão-batata” e “carcamano” (o léxico é imenso e
não se esgota aqui), parecendo inofensivos, são adjectivos que pretendem
estabelecer diferenças a partir de estereótipos, entraves para a unidade que o
Brasil necessita. Algum dos nossos assíduos leitores brasileiros poderá
justamente dizer: “Com que direito fala este portuga dos nossos problemas, já
que Portugal se encontra na bancarrota?”. Infelizmente, queira Deus que esteja
enganado, mais depressa se livrará Portugal da bancarrota do que o Brasil do
racismo e da xenofobia.
Esse desrespeito mútuo,
expoente máximo de sectarismo, vício antigo e bastante enraizado, reaproveitado
pelos “novos senhores”, tem colocado todos os brasileiros na mão de políticos
corruptos e nada escrupulosos, independentemente da sua origem, raça ou credo, sendo
tratados como indigentes ou casta de intocáveis (vulgo pé rapado), até porque
as desigualdades sempre foram terreno fértil para toda a casta de usurários,
fazendo jus à célebre máxima de “dividir para reinar”. A incapacidade de cada
um se rever no outro, só tem agravado a miséria global e a política do “Deus
por todos e cada um por si”, jamais conseguirá erigir uma nação, por maior que
ela seja como é o caso do Brasil, cuja sociedade sente as diferenças e
sobrevive pela indiferença. No dia em que índios, caboclos, pardos, amarelos,
negros e brancos deram as mãos, os políticos corruptos debandarão para outras
paragens e o Brasil será finalmente terra abençoada por Deus, saindo das
margens do Ipiranga para o Mundo com a maior das lições de vida: a fraternidade,
contribuindo desse modo para a paz universal.
Gostaria que isso
acontecesse, pois o meu ADN está mais próximo dos brasileiros do que dos
europeus a que pertenço, o que me põe o Brasil a circular nas veias e me faz
amá-lo como se fosse também meu. E como a verdadeira revolução começa dentro de
cada um de nós, recomendo como estudo e reflexão, a quem me der ouvidos, lute pela
paz entre os homens e aposte num Brasil melhor, a leitura da obra “Sumário da Doutrina Cristã” de Edward
Koehler, da Editora Concórdia (BR), porque se o cristianismo acabou com a
escravatura no Império Romano, também conseguirá libertar este grande País das
desigualdades que ainda o fazem vacilar, não pela espada, pelo ódio ou pela
vingança, mas pela Paz que Cristo trouxe ao mundo, Amor reconciliador que estende,
de igual modo e com a mesma intensidade, a todas as raças e nações da Terra.
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