quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Viagem ao Portugal esquecido: o porto palafítico da Carrasqueira

Esta Terça-Feira optámos por treinar no exterior com os dois binómios presentes. O plano inicial apontava para o Jardim de Belém, mas acabámos na estrada para Alcácer do Sal, rumo à Carrasqueira, pelo caminho que nos leva a Tróia. Visitámos o Memorial aos Combatentes do Ultramar, ainda treinámos em Belém, mas de pronto nos fizemos à estrada. Como a hora ia adiantada, decidimos ir almoçar ao Restaurante “A Escola” na Comporta.
O Restaurante, como o próprio nome indica, encontra-se situado numa antiga escola primária, daquelas legadas pelo Estado Novo, mais graníticas no Norte mas de traça igual por todo o lado. As salas do repasto respeitaram a divisão das salas de aula e até as casas de banho permanecem no mesmo sítio: à ponta do alpendre para o recreio. As portas que davam acesso ao alpendre foram substituídas por dois arcos geminados de estilo mourisco, ainda que salteados com rectângulos ocasionais de granito. Foi aí que comemos, tendo como pano de fundo uma fotografia escolar do início da década de 50. A fotografia mostra uma professora e a sua classe, onde são visíveis traços negróides nalguns alunos. Na linha da frente alguns encontram-se descalços, mas o uso da bata a todos é comum. A foto, para além de relembrar o uso anterior do edifico, é um marco histórico que nos transporta ao Séc.XVI, altura em que um grupo de escravos negros para ali foi debandado, sendo posteriormente absorvido pela população maioritária. A canção das "Meninas da Ribeira do Sado” encontra-se ligada a isto, ao particular etnográfico da região.
A comida é para turistas, bem confeccionada e apresentada, mais próxima do gosto comum e mais distante dos sabores tradicionais. Vale a pena comer ali a “massada de cherne”, que no nosso entender é a melhor das suas iguarias. O serviço é pronto e eficiente, o cozinheiro aceita sugestões e a carta de vinhos é vasta, de bom gosto e excelentemente apresentada. O preço é acessível e o ambiente repousante, o asseio é inquestionável e a atmosfera prima pela simpatia dos empregados. Ainda que na Estremadura, estamos no Alentejo.
Depois de comidos e bebidos, rumámos à Carrasqueira, lugarejo fluvial e piscatório de pouco interesse, de ruas desertas que se perdem na vastidão do Sado. As casas são brancas, de piso térreo e com chaminés indefinidas, mercê da confusão de influências. Ainda ali persistem duas casas pertencentes ao passado, com paredes de cana e telhados de colmo, uma de cada lado da estrada, uma em uso e outra para venda ou aluguer. Continuámos em direcção ao rio e chegámos finalmente ao Porto Palafítico.

Em dia de sorte, apanhámos a preia-mar, porque se chegássemos com a maré vazia, só o lodo nos daria as boas vindas. Este é o último porto palafítico em Portugal, avança 300 metros rio adentro, o labirinto das suas passadeiras é sustentado por estacas, umas de pinho e outras de eucalipto, de modo desordenado e pitoresco. Pelo que nos foi dito, recentemente a Câmara gastou ali 15.000 euros, substituindo algumas estacas velhas por outras de madeira tratada. O número das pequenas embarcações rondará uma centena e as barracas de recolha metade disso. Existem algumas embarcações, poucas, para passeios turísticos, que laboram quase em exclusivo no Verão. Os pescadores, dos quarenta anos para cima, dedicam-se à apanha da amêijoa, da ostra e do caranguejo, não têm escritura de concessão e temem pelo seu futuro. Todos os dias rezam ao São Turismo, porque a ele devem a sua actividade e sobrevivência, enquanto pólo de atracção e museu vivo dos seus costumes. Ali também existe uma lota, uma das poucas casas de cimento e tijolo.
O Porto é antecedido por vários arrozais, agora de restolho, porque a colheita aconteceu recentemente. Os pescadores atribuem a morte das amêijoas, em determinada altura do ano, aos químicos usados nos arrozais, mas todos são unânimes: o Rio está melhor e mais limpo. Se para lá for, evite que o seu cão se molhe, pois dali sairá com um cheiro nauseabundo, que o digam os condutores que nos acompanharam. Contudo, nada que a secagem não resolva pelo contributo do pó talco. Por ali se vêem motorizadas EFS, algumas com mais de 20 anos, mas também “Pick-ups” e carros utilitários. Os homens da faina são gente boa, ainda que retraídos de início. A paisagem é paradisíaca e lembra um álbum de fotografias do início do século passado.

Trabalhámos os diferentes automatismos de imobilização sobre as estacas, fizemos dos arrozais círculos de obediência, desenvolvemos a condução em liberdade e efectuámos vários cruzamentos frontais. No meio dos trabalhos, o Zorro decidiu dar as boas vindas a um cachorro dali, caminhando com ele cerca de 1 km, regressando depois, para espanto do seu dono e evitando assim a reprimenda. Surpreendentemente, O Rex adoptou o Zorro e contribui para a sua capacitação. Regressámos por Tróia e apanhámos o Ferry-boat, contentes com a jornada e deslumbrados com a paisagem.

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