Durante algum tempo
procurámos explicações para certos factos, dúvidas relativas ao maior sucesso
das senhoras no adestramento, ao cumular das dificuldades entre os jovens nesta
actividade e à dificuldade generalizada de extroversão, característica
indispensável a quem pretende comunicar e transmitir emoções, serenar para
ensinar e apoiar quando é preciso. Pensámos a princípio que a supremacia das
senhoras ficava a dever-se ao facto de serem por norma menos agressivas, que o
menor sucesso dos jovens se remetia em exclusivo à sua imaturidade e que a
ausência de extroversão ficava a dever-se a razões sociais e ao particular
laboral de cada um. Pouco a pouco dissipámos todas as dúvidas e compreendemos
que o exercício da maternidade e da paternidade resultam como o melhor dos
subsídios para o adestramento, o que transforma os pais zelosos em excelentes
adestradores, enquanto pais pedagógicos dos animais que adoptaram. A nossa
certeza é também reforçada por aqueles que, nunca tendo filhos mas sendo
naturalmente vocacionados para isso, acabam por tratar os seus cães como se os
houvessem gerado.
Salvo as devidas
diferenças, cuidar de um filho não difere muito de educar um cão, porque ambos
necessitam de idêntica atenção e de um acompanhamento a par e passo, de serem
compreendidos e de verem satisfeitas as suas necessidades básicas. O bebé
apresenta uma vantagem em relação ao cão: chora quando alguma coisa não está
bem e não se cala até se sentir confortável, quer necessite de atenção,
socorro, carinho, descanso, comida ou higiene. Diante das mesmas necessidades,
o cão manifestará alguma inquietude e ansiedade, podendo ladrar ou gemer,
alterando em simultâneo as suas expressões mímicas (há cães que enfiam a cabeça
por debaixo dos braços dos donos para que estes lhe façam festas). O particular
do comportamento canino irá obrigar-nos ao seu conhecimento e à interpretação
das suas expressões mímicas, para que prontamente sejam compreendidos,
socorridos, apoiados na altura certa e assumam as regras sem maior dificuldade,
mercê do seu conhecimento e da aquisição das rotinas que tomarão como suas.
Vezes sem conta temos
assistido à impropriedade e invalidade dos apoios e incentivos dos condutores
aos seus cães, que parecem pouco à vontade, com medo da exposição ao ridículo
ou incomodados quando convidados a felicitá-los, menor empenho que o reforço
positivo tende a substituir e a consertar à falta de melhor, ainda que não
gratuitamente. Se entendermos o adestramento como uma arte, então ela será
baseada no amor que opera a transfiguração dos condutores, que tudo fazem para
melhor serem compreendidos. Urge trazer para o treino a relação binomial íntima
e afectuosa alcançada no lar, que é o melhor dos subsídios e estímulo para o
progresso escolar. Carregar para o treino uma postura diferente da alcançada em
casa é promover a desconfiança canina, lançar os cães na confusão e criar
barreiras ao seu ensino, já que resistirão ao treino na ânsia de chegarem a
casa.
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