Não pretendemos com este
artigo, porque o problema excede em muito a nossa competência, explicar as
causas e muito menos a solução para a panosteíte e para a mielopatia
degenerativa (porque não somos investigadores, veterinários ou magos), doenças
por norma atribuídas como próprias dos Pastores Alemães, somente divulgar os
casos em que constatámos estas afecções, mais frequentes num determinado grupo
de indivíduos dentro da raça, com características próprias e ligadas a priori
ao tempo dos “alsacianos”, muito embora o seu aparecimento lhes seja anterior,
por razões pouco conhecidas devido à ausência de estudos e à omissão deliberada
destes problemas pelos criadores, que inevitavelmente se estenderam até aos
dias de hoje, apesar de pontuais e por isso mesmo pouco comuns. Adiantámos o
caso dos alsacianos porque em cima deles se construiu a linhagem histórica da
raça em Portugal, precursora dos actuais “Arminiuis”, “Wienerau’s” e “Checos”, apesar
destes problemas subsistirem ao tempo por outras partes da Alemanha. Também não
temos como estabelecer qualquer relação entre estas duas afecções, nem sabemos
se ela existe, muito embora saibamos que elas são comuns no mesmo grupo de
indivíduos, onde surgem com mais frequência, mediante os milhares de Pastores
que até hoje produzimos, treinámos, acompanhámos e observámos ao longo das suas
vidas, das variedades dominante e recessivas, oriundas de diversas partes,
beneficiadas entre si ou isoladamente.
Justiça lhes seja feita, apesar de não morrermos de amor por elas, nas
actuais linhas do Pastor Alemão a incidência destas afecções é menor,
particularmente nas de exposição, talvez porque os seus criadores sejam menos
ousados, privilegiarem quase em exclusivo a morfologia e esses cães tenham
agora uma curva de crescimento mais curta. A panosteíte, designada aqui a
grosso modo por “doença das dores de crescimento”, apesar de poder atacar os
cães mais velhos, cientificamente também conhecida como osteomielite juvenil,
enostose, panosteíte eosinofílica e panosteíte canina, flagelo mais comum nos
machos do que nas fêmeas, é uma doença que normalmente ataca os cães das raças
maiores entre os 5 e os 18 meses de idade, de causa ou causas ainda por
comprovar (se de origem genética ou não), geralmente associada ao stress, a anormalidades
transitórias vasculares, a distúrbios do metabolismo, hiperestrogenismo e a
alguma infecção viral, caracterizada pela inflamação dos ossos longos que leva
os animais a coxear tanto dos anteriores como dos posteriores, cessando
geralmente quando termina o seu crescimento, o que tem levado alguns criadores
a cruzarem as suas cadelas precocemente para a supressão do problema,
resultante da escassez óssea que ataca os ossos mais longos e que leva à
produção de um novo osso a partir da cavidade formada (maiores e melhores
explicações ser-lhe-ão dadas pelo seu veterinário assistente).
A mielopatia degenerativa é uma
doença degenerativa neurológica crónica e lentamente progressiva da medula
espinhal que acomete com maior frequência nos cães de grande porte em idade
adulta mais avançada, principalmente no Pastor Alemão entre 5 e 14 anos
(podendo atingir também outras raças) e cuja causa ainda não foi esclarecida,
que leva os cães à dificuldade de se manterem de pé, ao cruzamento dos seus pés
quando caminham, obrigando-os a cambalear, como se houvessem perdido a
coordenação motora, que na verdade perderam, impossibilitando-os numa fase mais
adiantada (crónica) de urinar ou defecar, pela ocorrência de atrofia muscular e
paralisação da sua região posterior (quadril). A doença só poderá ser
confirmada através de necropsia. Nenhum tratamento é eficaz e consegue debelar
esta doença, já que os tratamentos clínicos e medicamentosos não têm obtido
grande resposta, pelo que a maioria dos animais acometidos por ela acabará mais
cedo ou mais tarde por ser eutanasiada. Tem-se apostado na fisioterapia para
retardar o seu avanço e melhorar a qualidade de vida dos cães afectados,
trabalho de reabilitação que visa exercitar e recuperar as estruturas que não
foram comprometidas. Contudo, é adiar o inevitável por mais algum tempo.
Onde nos deparámos com casos destes? Curiosamente fomos encontrar as
duas doenças no mesmo grupo de indivíduos ou num grupo de indivíduos com as
mesmas características, exemplares com curvas de crescimento maiores (acima dos
68cm de altura), tendencialmente pernaltos ou obesos, fracos de ossatura ou com
ela deficitária em relação à sua envergadura, geralmente com abatimento de
metacarpos e descodilhados em marcha, que na fase de crescimento divergiam de
mãos e que posteriormente viriam a evoluir para o passo de andadura, não
conseguindo recolher os posteriores nas transposições mais baixas ou
ultrapassando-as exageradamente de pernas hirtas, alinhando-as pela linha do
ânus ou acima dele. Muitos dos cães que vieram a sofrer de panosteíte, tiveram
irmãos noutras ninhadas que não conseguiram levantar as pernas, lembrando
mamíferos aquáticos e que acabaram por ser abatidos. Apesar da doença ser mais
incidente nos exemplares demasiado alto ou gigantes, alguns dos seus
descendentes padronizados vieram a manifestar o mesmo problema, o que alvitra a
hipótese duma propensão ou razão genética.
Como tivemos a
oportunidade de criar, acompanhar e treinar Pastores de todas as variedades
cromáticas, verificámos que na variedade negra as duas doenças raramente se
manifestaram, mesmo quando esses indivíduos resultaram de progenitores de cor
diferente e eram excepcionalmente grandes, que existe uma relação, para nós sem
explicação, entre nanismo e gigantismo para a ocorrência destas enfermidades,
algo para além do dimorfismo sexual e que por vezes lhe era contrário.
Constatámos por outro lado que a mielopatia degenerativa acontecia mais cedo
nos exemplares menos trabalhados ou nos indivíduos privados do exercício
regular, geralmente confinados em canis ou a maior parte do tempo fechados em
casa. Foi entre os lobeiros e os cães com menos máscara que encontrámos maior
incidência destas doenças, que como já dissemos disputavam o mesmo grupo de
indivíduos. Estarão os factores branco e azul associados a esta enfermidade?
Gostaríamos de saber! Alguns dos cães que vieram a ser afectados por uma ou
outra doença, haviam resultado de beneficiamentos extraordinários, já que a
diferença de altura dos seus progenitores oscilava entre os 12 e os 15cm. Nada
do que adiantamos pretende ser conclusivo, apenas adiantamos aquilo que nos foi
dado a observar.
Nesse grupo de indivíduos, por estranho que pareça e para nós é um
mistério, nas ninhadas onde nasciam cachorros de pelo duro e de pelo comprido,
eram os últimos que concorriam em maior número para o aumento destas doenças.
Tanto a panosteíte como a mielopatia degenerativa, sabe-se lá porquê, acabavam
por ser extensíveis aos mestiços de pastor alemão, mesmo que um dos seus
progenitores fosse de raça indefinida (rafeiro), não ocorrendo nenhuma das
enfermidades nos seus descentes quando este era cruzado com um cão igual ou de
outra raça. Não é certo que alguma destas doenças seja de origem genética mas é
certo que se fazem mais presentes no seio do Pastor Alemão, o que para alguns
parece indubitavelmente ligado, muito embora outras raças possam igualmente ser
afectadas por elas, o que eventualmente nos transportará para os primórdios da
raça, quando surgiu como resultado de vários cães.
Como a razão genética não está provada mas também não foi ainda
descartada, na tentativa de evitarmos estas doenças nos nossos Pastores, temos
por hábito inquirir do histórico clínico dos exemplares que adquirimos (quando
nos dizem a verdade, não a omitem ou mentem), isentar da reprodução os
exemplares que tenham tido ou tenham na sua ascendência indivíduos fustigados
por estas enfermidades e incapacidades dolorosas, evitar os beneficiamentos
entre os cães excepcionalmente grandes, valermo-nos de exemplares negros prá
construção dos nossos cães, nunca beneficiar progenitores cuja diferença de
altura ultrapasse os 4cm, reduzir ao mínimo indispensável o número de
exemplares de pelo comprido e de fraca máscara na reprodução (por norma produto
de exemplares unicolores não negros) fazer uso de reprodutores de excelente
ossatura e isentar da reprodução indivíduos desaprumados ou com uma biomecânica
imprópria ou comprometedora.
Quem sabe se estes cuidados não evitariam a proliferação destas
incapacidades? A nossa experiência parece afirmá-lo, já que entre nós raros
foram os casos, resultando esses de um reprodutor cinzento bicolor, descendente
de cães importados da Alemanha, comprado a um alemão e que tivemos que
eutanasiar. Tanto a panosteíte como a mielopatia degenerativa são mais comuns
nas linha de trabalho do que na estética (a quem não faltam múltiplos
problemas), quiçá porque os adestradores são menos precavidos e por demais
ousados, quando desconsideram a morfologia e supervalorizam a prestação laboral.
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