segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

CANE CORSO: O CÃO QUE NÃO BRINCA EM SERVIÇO

ADVERTÊNCIA: O Cane Corso é um cão que exige um dono experiente, resoluto, persistente, disponível, robusto e apegado aos procedimentos, porque é por norma autoconfiante, possuidor de vontade própria, grande e poderoso, destruidor na sua juventude quando entediado e apresenta algumas dificuldades de sociabilização com pessoas, animais e outros cães, sendo considerado por muitos como uma das 10 raças caninas mais perigosas, muito embora não tenhamos sentido dificuldades adicionais junto daqueles que ensinámos, provavelmente por serem propriedade de donos que preenchiam em pleno as condições atrás requeridas ou que as adquiriram, cuja ausência leva-nos a não recomendá-lo como primeiro cão para os possíveis interessados. Importa salientar ainda que existe uma clara diferença de comportamento entre os exemplares que se fazem presentes nos shows de conformação e os seleccionados para o trabalho (guarda), sendo os primeiros particularmente mais amistosos que os últimos e, quando o não são, acabam relegados indeterminadamente para uma ignota box, a menos que sejam interessantes para reprodução, não tanto pelo carácter mas pela sua morfologia.
O Cane Corso é um impressionante molosso médio-grande, da categoria dos mastins, aparentado com o Mastim Napolitano, rectangular e mesomórfico, harmonioso quanto à forma mas desarmonioso de perfil, de focinho largo e profundo, cuja largura deverá ser igual ao seu comprimento, de comissuras labiais escuras, com o pescoço arqueado e por norma sem barbela. De linha dorsal paralela ao solo (por vezes a garupa é mais proeminente), apresenta uma pelagem curta, vítrea, densa mas não lisa, que se apresenta mais espessa no inverno. Cão extraordinariamente robusto e musculado (pode chegar aos 120 kg), mas ao mesmo tempo versátil, activo, disponível, célere e resistente, o Cane Corso apresenta as seguintes cores uniformes ou listradas: preto, cinza-ameixa, ardósia, cinza claro, azul acinzentado, castanho claro, cor de gamo, vermelho escuro e demais combinações cromáticas dentro destes tons. A sua ossatura é forte e é portador de “pé de gato”, o que o torna num “todo-o-terreno” e próprio para os pisos mais soltos (ver estalão da raça para apreciação doutros e maiores detalhes).
Crê-se que este molosso italiano remonte aos canix pugnax, antigos molossos de arena e guerra romanos, vindo depois da queda do Império Romano a ser usado como pastor, caçador e guardião até aos nossos dias. A industrialização e as Guerras Mundiais quase operaram o seu extermínio, vindo a ser salvo pelo entusiasmo de Giovanni Bonnetti e pela selecção operada pelo Dr. Paolo Breber na década de 70 do século passado. Viria a ser reconhecido pelo AKC em 1993 e pela FCI em 1996. A origem do seu nome tanto poderá dever-se à sua presença na Ilha da Córsega como ao facto ser um cão constantemente em curso, merecendo ainda designações como: Cane di Macellaio, Siciliano Branchiero e Mastiff italiano (Mastim Italiano).
Mas o que mais se destaca no Cane Corso é o seu temperamento, porque é de uma lealdade extrema, amigo de agradar aos seus donos (com os quais é muito afectuoso), é territorial (nunca se afasta de casa) e altamente protector, não se agrada de intrusos e é sossegado no lar (se sair diariamente para longos passeios), é equilibrado e tem noção da sua força, manifestando uma capacidade de aprendizagem superior que facilita o seu treino. Contudo, necessita de um líder alfa e de ser treinado desde tenra idade, para que não invente serviço, se submeta à liderança, respeite o agregado familiar e saiba identificar, sem margem de erro, quem são os seus inimigos e dos seus donos, detalhes que não dispensam o exercício físico e mental continuado, para reforço da unidade binomial, do seu escalonamento social e reavivamento das ordens ou comandos, exigindo em simultâneo árduo trabalho de sociabilização inter pares (com outros cães), já que naturalmente pouco ou nada se interessa por gatos. Outrossim, é obrigatório sociabilizá-lo com as crianças, tanto as de casa como as alheias.
Sem lobos para escorraçar e normalmente arredado da caça ao javali, actividade muito do seu agrado e para a qual parece haver nascido, o Cane Corso tem vindo gradualmente a ser usado como cão de guarda, ofício em que se tem notabilizado nos dois lados do Atlântico Norte. 
Comparando a sua prestação guardiã com o príncipe dos molossos alemães para esse efeito: o Rottweiler, podemos afirmar sem margem de dúvida que o molosso italiano, quando não assolado pela displasia e pela obesidade, é mais activo, célere e resistente, com maior força de mordedura e de impacto, denotando uma capacidade atlética pouco vista em cães similares, ainda que seja mais obstinado e o seu travamento careça de treino aturado, porque é um daqueles cães que “dá um boi para não entrar numa luta e que exige uma manada para sair dela”.
E porque a maldade dos homens não precisa de ser-lhes ensinada, está-lhes na massa do sangue, há sempre quem queira fazer mais mal e cães ainda piores. Noutras latitudes para além da portuguesa, em sociedades tradicionalmente menos fraternas e mais sectárias, o Cane Corso tem sido misturado com outras raças para a produção de híbridos mais bravos do que ele e para “melhoramento” de outras que se prestam à segurança de pessoas e bens. O cruzamento mais usado por indivíduos devotados à marginalidade é o de Cane Corso-Pitbull, já que o seu cruzamento com outros molossos tende a produzir indivíduos mais mansos. Também há quem se valha deste mastim italiano para a obtenção de falsos Pastores Alemães, gerando híbridos mais maldosos e letais, que uma vez virado o feitiço contra o feiticeiro, ou acabam mortos ou abandonados, vindo alguns deles a ser recolhidos pelos canis de abrigo. Na foto abaixo podemos ver parcialmente um híbrido destes.
Não se duvida da excelência deste cão, assim como não se põe em causa os cuidados que os seus criadores dispensam na sua selecção, uma vez apostados na sua continuidade, bom-nome e bem-estar de todos os cidadãos. Não obstante, não podemos dizer que o Cane Corso seja um cão para todos, considerando algumas das suas características particulares, o que exigem e o seu uso indevido, que podem transformá-lo num verdadeiro cão de guerra ou de guerrilha urbana. Há Cane Corsos amigáveis e sociáveis? Afortunadamente sim e estamos em crer que o seu número aumentará a cada dia que passa se os homens abraçarem a paz.   

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