Sabia
que uma das raças caninas que mais facilmente se constitui em matilha é o
Pastor Alemão? É verdade, por vezes bastam dois, independentemente do género e
desconhecidos entre si, para se constituírem em oposição a outra heterogénea de
número igual ou superior, podendo ao mesmo tempo carregar violentamente sobre
cães isolados de grupos somáticos diferentes, particularmente molossos, porque
os entendem como uma provocação e ameaça. É também comum não se agradarem de
cães caçadores ou de outros demasiado enérgicos, tanto dentro como fora do seu
território. Graças a este escalonamento social quase automático não é difícil formar
matilhas operacionais com Pastores Alemães para os mais diversos fins.
Estranha
um amigo nosso, agora proprietário de duas cadelas Pastor Alemão, uma com mais de
dois anos e outra agora a rondar 5 meses de idade, em coabitação plena há um
par de meses, que a mais velha se tenha tornado demasiado agressiva com os cães
estranhos e com outro que possui, um bracóide sem raça definida, castrado e a
dividir com elas o mesmo espaço, fenómenos que não se verificavam antes da
chegada da cachorra à sua casa. Para melhor se entenderem os meandros da
situação, adianta-se que as Pastoras Alemães treinam em conjunto, servindo a mais
velha de mestra à cachorra, evoluindo a par e passo pelos mais variados
ecossistemas.
Para além do inevitável escalonamento social,
que naturalmente existiria com cães de outra raça por força da diferença
etária, fica claro que a cadela reage assim para proteger a cachorra, porque a
sente vulnerável e é movida pelo instinto matriarcal, o que a ninguém espanta,
pois não é raro subsistirem cadelas que criam leite quando em contacto directo
com cachorros, protegendo-os vivamente diante doutros cães, sendo as suas
arremetidas de indubitável carácter instintivo-defensivo.
Estarão
a sociabilização da cadela e seu uso irremediavelmente comprometidos? Terá o
problema solução? E se tem, como proceder? Nada está comprometido, o problema
tem solução e aponta para o desempenho da liderança, já que nunca foi tarefa
árdua escalonar cadelas dentro de uma matilha, apesar delas serem por vezes
demasiado cruéis umas com as outras. No caso particular do nosso amigo, que tem
um cão que não lidera por ser castrado e que invariavelmente anda com os cães todos
á solta, esperando da sorte o que não faz cumprir, ao não demarcar
atempadamente o território, os direitos e deveres inerentes a cada cão, urge
transformar aquela desnorteada matilha animal numa escalonada matilha
funcional, trabalho que até aqui não encetou.
No
que concerne à salvaguarda do outro cão residente na casa do nosso amigo, que
será cada vez mais periclitante se a situação não se alterar, votado à exclusão
por incúria do seu proprietário, que o deixa sempre em casa quando sai com as
pastoras por tempo indeterminado, debaixo do pretexto de deixar ali um cão de
guarda ou por ser de difícil controlo, é de todo conveniente que o leve a passear
com as cadelas, todos juntos ou com uma de cada vez para ajudar na sua
assimilação, porque doutro modo, reforçadas pelos vínculos afectivos com o
dono, as cadelas tudo farão para o expulsar da casa e territórios comuns,
vendo-o como um intruso. E se assim não fizer, não lhe sobrará outro remédio do
que encerrar o cão antes das cadelas entrarem.
É
evidente que o cão velho deverá também ser educado convenientemente para evitar
a exposição e pôr-se a jeito, esforço pedagógico que não dispensará o por vezes
incómodo trabalho à trela. Trabalho à trela que deverá também ser retomado
amiúde com as pastoras para que entendam a quem devem obediência e venham a ser
subordinadas quando em liberdade (um passarinho disse-nos que o nosso amigo e a
trela não gozam de grande intimidade).
E
porque importa libertar a pastora adulta dos ataques instintivos,
inconciliáveis com o ofício guardião dela esperado, animal neste momento com os
alvos trocados, urge em simultâneo convidá-la para o ataque a intrusos humanos
e inibir-lhe os perpetrados contra iguais. Esta inibição, atendendo ao seu
género, deverá ser operada pelo condicionamento à trela com o concurso da
recompensa, porque doutro modo, por força da repreensão nua e crua, a cadela
poderá vir a desusar os dentes para aquilo que é preciso, ficando assim também
castrada para o desempenho da sua missão.
Ser proprietário de vários cães é uma tarefa que
aumenta proporcionalmente com o seu número, porque o natural escalonamento social
canino pode não dispensar a violência para o seu estabelecimento, o que raramente
é desejável diante da capacitação individual de cada cão e do seu próprio
bem-estar, imperativos que só a liderança humana poderá garantir pelo
estabelecimento de rotinas adequadas. “Todos ao molho e fé em Deus” e “eles
entendem-se” são práticas e expressões que denotam um profundo desrespeito pela
salvaguarda e integridade dos cães, próprias de ignorantes que mais cedo ou
mais tarde acabarão por mandar castrar os seus cães, dispensá-los ou abatê-los.
Se eu tenho 3 cães, sou três vezes líder; se tenho 5, sou cinco vezes e se
tenho mais de 10, sou um super líder, a menos que os tenha todos enjaulados que
nem coelhos! Mãos à obra!
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