Apesar de
serem considerados perigosos à luz da lei e de se encontrarem sujeitos às suas
penas, ainda continuamos a ouvir relatos sobre cães que atacam toda a sorte de
animais (ovelhas, cabras, gatos, coelhos, galinhas, patos, cisnes, aves de
ornamentação e daí por diante). E vamos continuar a ouvir se não tivermos o
cuidado de os sociabilizar com essas espécies. Se desprezarmos o momento certo
para o fazer, a tarefa revelar-se-á mais difícil e poderá não dispensar o
castigo que induz à inibição ou a paciente troca de alvos que não dispensa a
recompensa, isto se os cães em questão não se encontrarem devidamente
treinados. É curioso reparar, por ser caricato e não deixar de ser estranho,
que muitos desses ataques são efectuados por cães cuja primeira vocação é o
pastoreio, transformando-se assim em pilha-galinhas ou em lobos devoradores.
Quando averiguados, descobrimos tratar-se de cães que nunca se familiarizaram
com outros animais, por se encontrarem presos ou porque nunca lhes foram
apresentados.
A altura certa para se
familiarizar um cão com o gado ou com outro tipo de animal doméstico, porque a
sociabilização sem o contributo da familiarizarão é forçada, é logo em cachorro,
depois de desmamado e autónomo, antes dos 4 meses e pelo convívio diário
(quando tal for possível e daí não lhe resulte qualquer risco), altura em que
melhor aceita as diferenças pela sua fragilidade e necessidade de integração,
vindo posteriormente a considerar esse animais como membros do seu grupo
familiar e por consequência a protegê-los. E dizemos antes dos 4 meses porquê,
uma vez que os cachorros só a partir daí começam a seguir o seu bando, a
segui-lo e a escalonar-se dentro dele? Se o cão for de raça pequena essa
familiarização poderá acontecer até aos 6 meses de idade (antes da sua
maturidade sexual), mas se for um Serra da Estrela, um Pastor Alemão ou um cão
de igual tamanho ou maior, enfrentaremos as dificuldades advindas do seu
tamanho e porte, factores que poderão levá-lo a medir forças com os animais ao
seu redor e a identificá-los como presas.
É óbvio que o perfil
psicológico do cão deve ser considerado. Por vezes, devido ao distanciamento, rotulamos
os pastores de ignorantes e rudes, quando na verdade deveríamos aprender com
eles e tirar lições da sua experiência, porque bem cedo instalam os seus cães
no curral, prendendo com uma corda à cinta os maiores que não criaram e que
mais tarde utilizarão, familiarizando-os primeiro e adestrando-os depois,
contrariamente ao que acontece nas cidades, onde muitos cães chegam ao treino
sem qualquer tipo de sociabilização.
Como se depreende, a
familiarização e posterior sociabilização dos cachorros com os outros animais
não será automática, porque todos precisam de se habituar uns aos outros, o que
não os livrará de algumas pequenas bicadas, marradas ou arranhadelas, lições
que aprenderão para a vida e que os farão respeitar e não abusar das outras
espécies com quem coabitarão. Mesmo assim e considerando a salvaguarda dos
cachorros, no início desse processo pedagógico, a sociabilização a haver não
dispensará quer a presença quer a arbitragem dos donos.
Os cachorros destinados a
guardar capoeiras ou viveiros de aves, jamais deverão ser alojados dentro
desses habitáculos, considerando os riscos para a sua saúde, devendo por isso
ser instalados no seu exterior e nas áreas destinadas ao exercício e
robustecimento desses animais. Para além dos aspectos ligados á saúde dos
cachorros, há que considerar a ocorrência de ovos e pintos, menus muito
apreciados pelos cães, que alertados pelo cantar das galinhas e pelo piar dos
pintos, bem depressa os deglutirão. Também porque as aves entram em choco e
mudam o seu comportamento, tornando-se mais frágeis e apegadas ao ninho, o que
as torna mais vulneráveis e apetecíveis, convém deixá-las separadas dos
cães, para que não abandonem o ninho e acabem mortas (estraçalhadas).
Inicialmente, a habituação dos
cachorros às galinhas deverá acontecer com elas fechadas dentro da capoeira e
só depois com elas em
liberdade. Quando as aves se encontram à solta não convém ter
ração no prato dos cachorros, porque elas tendem a comê-la, atitude que desagrada
aos cães e que poderá levar à luta pela sua posse ou protecção, o que
desnecessariamente comprometeria de sobremaneira a sociabilização procurada. Os
cães guardam as capoeiras por quase dos assaltos perpetrados pelas raposas nas
zonas rurais do interior e não por causa dos comuns larápios, mas se o cinto
continuar a apertar, o regresso dos “pilha-galinhas” pode acontecer. Se
pretende construir uma capoeira e está em Portugal, vamos alertá-lo para um
perigo: o popular “saca-rabos”, um mangusto introduzido na Península pelos
árabes, cujo nome científico é “Herpestes ichneumon”, que por mão humana saiu
do Sul e do Sudoeste e invade agora todo o País, muito embora as doninhas
tenham a mesma preferência e produzam idêntico estrago.
O
“saca-rabos” é um predador diurno que ao encontrar comida fácil e na ausência
de coelhos bravos, está a alterar os seus hábitos de predador, caçando agora
também durante a noite. Quando consegue entrar numa capoeira, porque caça em
grupo, a “limpeza é geral” e raramente algum coelho ou ave se escapa. O seu
número tem vindo a aumentar porque o seu predador natural, o “lince” (Lynx
pardinus), se encontra em vias de extinção. Devido à sua morfologia, o
“saca-rabos é capaz de entrar pelas malhas das redes mais comuns e passar por
debaixo das portas das capoeiras, o mesmo acontecendo com as doninhas (Mustela
nivalis), que também caçam à noite e que são ainda mais cilíndricas e mais
pequenas (ver foto abaixo).
Diante destes
invasores, os cães deverão encontrar-se soltos para lhes dar caça. Por
precaução, as capoeiras deverão ter fundações com uma profundidade mínima de
50cm, o seu piso constituído em placa de betão com uma espessura mínima de 25cm,
portas metálicas inseridas em caixilho e redes rígidas de quadrados com 1cm de
lado. As áreas descobertas das capoeiras deverão também levar rede, para
impedir os ataques das aves de rapina (águias, milhares, corvos, mochos e
corujas). Para dificultar ainda mais a acção dos pequenos mamíferos predadores,
a área circundante à capoeira deverá ser iluminada à noite. Também à noite, nas
áreas mais isoladas ou rodeadas de matagais, para reforço da segurança, as
redes da capoeira poderão ser protegidas com cercas eléctricas, das vulgarmente
usadas para delimitar as áreas do gado bovino, podendo ainda haver lugar à
colocação de armadilhas próprias nos acessos à capoeira, que sendo específicas
para esses animais, não acarretam qualquer risco para os guardiões.
Nas áreas
onde existem gatos é possível que algum caia nas armadilhas, porque eles são
caçadores, apanham pássaros, caçam coelhos, matam pintos e também vão aos ovos
das galinhas quando têm fome. Como as armadilhas são simples gaiolas de captura,
não lhes causam nenhum dano, basta soltá-los e deixá-los ir à sua vida. E se
houver algum risco, esse será para quem os irá soltar, porque embravecidos pelo
cativeiro forçado e na ânsia de se libertarem, não hesitarão em morder ou
arranhar qualquer mão desprevenida, de atacar os olhos ou a cara, causando
escoriações incómodas e difíceis de sarar. Os cuidados a haver com os gatos são
os mesmos para o saca-rabos e para a doninha. Caso seja vítima do ataque de
algum deles, não hesite, dirija-se ao centro de enfermagem mais próximo e
solicite a aplicação duma injecção de soro anti-tetânico, caso a sua vacinação
contra o tétano não se encontre em dia.
Depois de sociabilizar os
cães, há que facilitar e optimizar o seu desempenho. Eis em síntese como melhor
sociabilizar um cão de pastoreio, como formar um guarda de capoeiras, quais os
invasores que terá pela frente e como ajudá-lo na tarefa. Para proteger um
rebanho dos lobos não há nada melhor que um molosso, para guardar capoeiras
qualquer bracóide ou vulpino servirá, desde que activo, caçador e
convenientemente sociabilizado. Se os ladrões de galinhas retornarem e os
javalis incomodarem, então os bracóides terão que ceder lugar aos lupinos ou
aos molossos, ainda que os lupinos sejam mais difíceis de sociabilizar com os
animais em cativeiro e os molossos sejam mais lentos a escorraçar intrusos,
apesar de mais temidos pelos javalis.
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