Celebrámos no passado dia 22 do corrente mês o Dia
da Terra e essa evocação deixou-me triste, com
uma sensação de paraíso perdido e preocupado quanto ao futuro, porque
nada é como dantes e não sabemos como será daqui para a frente. Penso nas
gerações vindouras e tenho pena delas, porque não terão o eu que tive e só virtualmente
experimentarão aquilo que vivi. Quando eu era menino, na terra onde nasci,
corriam dois rios e cinco ribeiros a céu aberto, mais caudolosos no Inverno mas
que nunca secavam no Verão, autênticos mananciais de águas calmas, límpidas e
cintilantes. Na garganta dum deles havia uma azenha e em todos havia vida em
abundância. Os ribeiros vinham da serra, brotavam das rochas, rompiam o saibro
e atravessavam a localidade, engalanados pelos canaviais e rodeados de uma
vegetação há muito desaparecida. Nos pequenos charcos à sua volta, os girinos
multiplicavam-se e cresciam a olhos vistos, as libelinhas vermelhas pareciam
não ter fim, ouvia-se o cantar do pintassilgo, do verdilhão, do chamariz, do
tentilhão, do lugre e de tantos outros passarinhos, numa sinfonia cuja
partitura o tempo levou. Ao cair da tarde, quando o calor apertava e as aves
iam beber, os garotos mais graúdos, sempre “a pau” com a Guarda, armavam redes
e punham visgo nos ramos mais finos dos freixos. Os mais pequenos faziam navios
com rolhas, provavam as suas primeiras azedas e aprendiam a fazer gaitas com os
rebentos mais tenros das canas. E disso tudo o que sobrou? Nada!
Os rios desapareceram da face da terra, sepultaram-nos
em manilhas de cimento e correm agora para uma estação de tratamento, pastosos
e com um cheiro nauseabundo. Por cima deles assentaram casas, garagens e
barracões, as linhas de água deram lugar a calçadas e pavilhões, os girinos
desapareceram e as libelinhas também, os passarinhos fugiram para os montes e
do verde original só resta o musgo que insiste em se agarrar ao betão. Os
miúdos de agora, mais limitados, stressados e gordos como nunca, brincam em
parques sintéticos com pisos de borracha reciclada, num emaranhado de jaulas
cercado por carrocéis e baloiços de plástico, distantes do salutar contacto com
a mãe natureza. Se o Homem não mudar de atitude e não sabemos se ainda vai a
tempo, pode ser que a água se revolte e torne ao seu lugar, agora tóxica,
putrefacta, saturada em bactérias, imprópria para consumo e própria para acabar
com todos nós.
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