sexta-feira, 26 de abril de 2013

TERRA SEM ÁGUA

Celebrámos no passado dia 22 do corrente mês o Dia da Terra e essa evocação deixou-me triste, com  uma sensação de paraíso perdido e preocupado quanto ao futuro, porque nada é como dantes e não sabemos como será daqui para a frente. Penso nas gerações vindouras e tenho pena delas, porque não terão o eu que tive e só virtualmente experimentarão aquilo que vivi. Quando eu era menino, na terra onde nasci, corriam dois rios e cinco ribeiros a céu aberto, mais caudolosos no Inverno mas que nunca secavam no Verão, autênticos mananciais de águas calmas, límpidas e cintilantes. Na garganta dum deles havia uma azenha e em todos havia vida em abundância. Os ribeiros vinham da serra, brotavam das rochas, rompiam o saibro e atravessavam a localidade, engalanados pelos canaviais e rodeados de uma vegetação há muito desaparecida. Nos pequenos charcos à sua volta, os girinos multiplicavam-se e cresciam a olhos vistos, as libelinhas vermelhas pareciam não ter fim, ouvia-se o cantar do pintassilgo, do verdilhão, do chamariz, do tentilhão, do lugre e de tantos outros passarinhos, numa sinfonia cuja partitura o tempo levou. Ao cair da tarde, quando o calor apertava e as aves iam beber, os garotos mais graúdos, sempre “a pau” com a Guarda, armavam redes e punham visgo nos ramos mais finos dos freixos. Os mais pequenos faziam navios com rolhas, provavam as suas primeiras azedas e aprendiam a fazer gaitas com os rebentos mais tenros das canas. E disso tudo o que sobrou? Nada!
Os rios desapareceram da face da terra, sepultaram-nos em manilhas de cimento e correm agora para uma estação de tratamento, pastosos e com um cheiro nauseabundo. Por cima deles assentaram casas, garagens e barracões, as linhas de água deram lugar a calçadas e pavilhões, os girinos desapareceram e as libelinhas também, os passarinhos fugiram para os montes e do verde original só resta o musgo que insiste em se agarrar ao betão. Os miúdos de agora, mais limitados, stressados e gordos como nunca, brincam em parques sintéticos com pisos de borracha reciclada, num emaranhado de jaulas cercado por carrocéis e baloiços de plástico, distantes do salutar contacto com a mãe natureza. Se o Homem não mudar de atitude e não sabemos se ainda vai a tempo, pode ser que a água se revolte e torne ao seu lugar, agora tóxica, putrefacta, saturada em bactérias, imprópria para consumo e própria para acabar com todos nós.

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