O mais exímio e infalível cão de pistagem, quer ele
se destine à busca, à perseguição, ao resgate ou ao salvamento, jamais
dispensará a leitura correcta das suas acções pelo seu condutor, porque apenas
segue indícios e não consegue estabelecer raciocínios, sendo por isso mesmo
facilmente ludibriado ou induzido em erro. A má leitura das acções caninas, a
sua desconsideração ou desprezo, têm sido responsáveis pela maior fatia de
insucesso nos cães pisteiros.
Exemplo
disto foi o ocorrido com um jovem desaparecido, cuja família solicitou os
préstimos de cães pisteiros para o encontrar. Os animais, depois de
identificarem o odor do desaparecido, rumaram mais do que uma vez direito a um
poço tapado. A conclusão dos seus acompanhantes, depois de haverem levantado a
tampa do poço e verificado que dentro dele nada havia para além de água, foi a
de que o jovem teria andado por ali. Passados dois dias, a família angustiada
pediu auxílio a um binómio amador, que com alguma relutância anuiu ao seu
pedido, já que outros mais qualificados não haviam resolvido o problema. Tal
como os outros, o novo cão dirigiu-se de imediato ao poço, o seu dono levantou
a tampa e surpreso viu o corpo do jovem desaparecido a boiar.
Recentemente,
uma senhora a rondar os sessenta anos, vítima de alzheimer, desapareceu de sua
casa. Estranhando a demora, a família recorreu aos bons ofícios de cães
pisteiros, nomeadamente a cinco equipas de diferente procedência e gabarito. Os
cinco cães apanharam o mesmo trajecto, o que ia de casa da senhora para um
local ermo e de difícil acesso. Como o trabalho dos cães foi inconclusivo, até
hoje nada se sabe da senhora. Será que os cães apanharam o rasto uns dos
outros? Seria o percurso de retorno e não de evasão? A supressão de rasto mais
para diante teria ficado a dever-se a condições climatéricas particulares? Teriam
os cães tomado outra direcção por força dos ventos dominantes na área? A
procura empreendida pelos populares teria impossibilitado a busca por
eliminação de indícios ou marcadores? Teria a senhora saído noutra direcção ou
ter sido transportada à saída de casa? Empreendido outro trajecto depois do
indicado pelos marcadores? Deveriam procurar-se outras direcções a partir da
casa ou até do seu exterior?
O
trabalho dos cães é invariavelmente complementar e preenche um todo da
investigação, procura ou resgaste. Raramente é exclusivo e peremptório, mas não
dispensa a leitura correcta de quem os segue e tão bem os conhece para o
alcance do sucesso. Interpretar os cães torna-se assim fundamental, o que nos
projecta para a qualidade, acuidade técnica e inteligência dos seus líderes.
Temos por norma dar razão aos cães, porque a experiência tem-nos revelado que
raramente se enganam. Os equívocos na pistagem são ordinariamente humanos e
resultado duma má leitura do trabalho desenvolvido pelos cães. Se procuramos
neles uma excelente máquina sensorial, esperamos dos homens que os acompanham o
exercício da inteligência.
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