A ansiedade canina continua a ser procurada nas
ninhadas, aproveitada e potenciada no adestramento, porque carrega
desconfiança, suscita agressividade e induz ao ataque. Por causa disto, um bom
figurante não tem preço e sempre acabará bem sucedido. Quando a ansiedade é
genética e de alguma forma sempre o é, com meia dúzia de "toques”, saiem os
cães a morder nas estrelas! A ansiedade
que provoca a avidez da explosão, também tem sido utilizada noutras modalidades
caninas distantes do propósito guardião, porque o stresse que a acompanha
acabará por ser aproveitado. Existem raças mais ansiosas que outras e aqui a
morfopsicologia e a fisiognomia poderão ajudar-nos de sobremaneira na sua identificação,
melhor do que na compreensão das pessoas. Todos sabemos que os lupinos e os
vulpinos são mais voláteis que os molossos, por exemplo. E depois, a ansiedade
não consegue esconder o medo atávico que leva à defesa, o que a muitos faz
jurar, que um casal de cobardes, mais facilmente gerará uma prole de valentes.
Até quando ensinaremos os cães debaixo de stresse e perpetuaremos a sua
ansiedade? Ansiedade e disparate não andarão de mãos dadas? Será a ansiedade
boa conselheira ou levará a acções mecânicas previsíveis para quem as conhece e
de grave consequência para quem as ignora? Que qualidade de vida terá um cão
dominado pela ansiedade?
Muitas
vezes sem repararmos, inconscientemente, contribuimos de modo eficaz para o
aumento da ansiedade nos nosos cães, tanto no convívio diário como quando
intentamos adestrá-los. Como são inúmeras as situações em que isso acontece e
não podemos aqui contemplar todas, vamos remeter-nos ao caso do cão que resiste
ao comando de “quieto” e que executa o “aqui” num ápice, desnecessitando de ser
chamado. O comando de “aqui” acontece naturalmente nos cães, como uma resposta
natural por força do seu sentimento gregário. Já o comando de “quieto”, por ser
uma resposta artifical, carece de condicionamento e recapitulação para a sua
assimilação, porque os cães, tanto os lobos como os familiares, preferem o
trabalho em grupo e não se sentem confortáveis quando isolados. O isolamento de
um canídeo, sem a interferência humana, sempre resultará da expulsão que induz
ao exílio forçado e nenhum cão gostará de se ver ou sentir nesses “assados”. Os
cães que mais resistem ao “quieto” são os medrosos e os mais activos, sendo
ambos assolados pela ansiedade da separação, ainda que uns sejam movidos pelo
medo e outros pela “incompreensão” da inércia.
Determinada
senhora, desgostosa com a prestação do seu cão no comando de “quieto” (fica) e
apostada na sua melhoria, valendo-se de um parque ao redor da sua habitação,
treinava o seu companheiro nessa imobilização, a uma distância de 50 mt,
chamando-o ciclicamente de dois em dois minutos. Contrariado, o bicho lá se ia
aguentando, quando se aguentava, porque de tudo fazia para fugir da posição
inicial, quer levantando-se quer ainda rastejando, não resultando do empenho da
dona qualquer benefício, já que o animal se comportava cada vez mais ansioso,
aguardando em sobressalto a hora da chamada e do reencontro. Em que estaria ela
a errar?
Em primeiro lugar, as respostas artificiais não
dispensam a comodidade dos animais na sua execução e obrigam ao trabalho
gradual para o seu alcance, o que torna exagerada a distância havida entre
ambos. Depois, o princípio escolhido atentava contra o fim procurado, uma vez
que a imobilização sugerida era de pouca duração e obrigava à chamada quase
constante, impedindo assim a assimilação e concentração do cão. Quando assim se
procede, apesar das boas intenções, todo e qualquer processo pedagógico atinge
a rotura, que é exactamente aquilo que ninguém quer. A senhora estava a ir
depressa demais e a aumentar significativamente a ansiedade no seu cão, ainda
que sem dar por isso.
Apesar de ser mais fácil ensinar correctamente do
que eliminar vícios, não nos resta outra solução do que regressar à 1ª fase - à
fase inicial, tratando o animal como se desconhecesse por inteiro o comando que
executa parcialmente ou de modo deficitário. Assim, o “quieto” deverá ser
primeiro tirado ao lado do dono, com algum pertence do cão e por tempo julgado
conveniente, enfatizando-se em simultâneo o comando e a recompensa, pois os
cães gostam de ver o seu esforço recompensado e de serem aceites. Sempre que
possível, e nem sempre é, podemos valer-nos doutro cão para nos auxiliar na
assimilação do comando, dum que já o tenha assimilado peremptoriamente, porque
os cães aprendem por imitação e o melhor exemplo para eles virá doutro igual.
Por vezes, raramente, perante animais extremamente teimosos, mais vale tê-los
presos pela trela ou prendê-los a algo, do que desatar aos gritos sobre os seus
ouvidos, o que seria uma tremenda estupidez!
Nesta ocasião, debaixo do comando, podemos ler um livro ou ouvir música,
transmitindo-lhe a calma que geralmente lhe falta, corrigindo-o quanto for
necessário, pacientemente e de modo coloquial, porque importa que se sinta à
vontade e assim permaneça por mais tempo.
Pouco a
pouco, vamos aumentando a distância entre ambos e a permanência no comando,
para que o animal não confunda o “alto” instantâneo com a ordem de “quieto”,
que se deseja até um período de duas horas, sabendo-se que, quem isso aguenta,
sem dificuldade permanecerá no comando pelo dobro do tempo ou por muito mais. O
segredo no “quieto” sempre passará pela certeza do cão em não estar só, que o
seu dono está por perto e que jamais o abandonará. As respostas artificiais
fornecidas pelo condicionamento exigem amor, paciência e tempo, muito embora
possam ser alcançadas por outros meios, cujas marcas serão por demais visíveis
considerando a mímica presente nos seus executantes.
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