sexta-feira, 29 de março de 2013

A ROUPA DOS FILHOS E OS ACESSÓRIOS DOS CÃES

Nesta filiação extraordinária que leva os homens à adopção de cães, sem espanto, temos reparado que muitos animais acabam tratados como filhos, a despeito da sua condição canina e extrapolando algumas das suas necessidades mais básicas, mercê do exagero antropomórfico que desconsidera as diferenças e que apenas procura aquilo que deseja ver. Os proprietários de vários cães, à imitação dos pais de famílias numerosas que fazem transitar a roupa dos filhos mais velhos para os mais novos, acabam por adquirir acessórios ou brinquedos para o grupo e não para cada indivíduo que o constitui, o que de todo é reprovável diante do acompanhamento e tratamento individual exigido por cada cão.
Arredados de preocupações metafísicas, os cães agarram-se ao que têm e vivem daquilo que alcançam, sendo tanto ou mais felizes consoante o espólio que escolhem, conservam, lhes é doado ou consentido, guardando zelosamente o que lhes pertence, lutando pela sua posse e não vendo com bons olhos a sua repartição, sendo isso fundamental para o seu equilíbrio emocional e bem-estar, pois necessitam de se sentir seguros e essa segurança sempre virá daquilo que consideram seu, uma vez que os ostracizados pouco têm ou nada possuem. À parte disto e denunciando a mesma necessidade, os acessórios caninos, enquanto meios eficazes para a comunicação interespécies e para o estabelecimento dos vínculos afectivos que ela não dispensa, devem ser exclusivos e não usados indistintamente em todos os cães, porque mais depressa se agradará um cão duma trela que considera sua, que breve carregará, do que de uma outra que é obrigado a dividir.
O mesmo se passa com os brinquedos, que para além de subsídios pedagógicos de valor inestimável, são utensílios que enriquecem o património individual dos cães, funcionando muitas vezes como autênticos troféus. Perante tamanha importância, é errado e contraproducente sujeitar vários cães à divisão de brinquedos, particularmente em grupos instantâneos, esporádicos ou heterozigóticos, porque tal recriaira o escalonamento da matilha animal e serviria de pretexto para a hegemonia dos mais fortes e para o afastamento compulsivo dos mais fracos, fenómenos que à partida ninguém deseja e que poderão comprometer a sociabilização desejável. Experiências negativas destas, se ocorrerem até aos seis meses de idade nos cachorros, podem levar ao seu desinteresse pelos brinquedos, acontecendo o mesmo àqueles que se viram privados deles até igual ciclo infantil, já que há uma idade para tudo e os cães depois da maturidade sexual tendem à novidade de interesses.
É evidente que nós, por razões sobejamente conhecidas, procuramos nos cães um carácter forte, impoluto e incorruptível, que tudo fazemos para que não sejam ludibriados, incorram em acidentes, corram riscos desnecessáros ou coloquem a sua vida em cheque, requisitos intrinsecamente ligados à nossa vocação e à paixão que nutrimos pelos cães considerados territoriais. Por isso não consentimos, para além dos aspectos ligados à higiene e à saúde, que os nossos cães bebam dos bebedouros alheios ou comam sem ordem expressa, porque não queremos vê-los escorraçados, fragilizar o carácter de outros ou a todos sentenciar a uma morte anunciada. Debaixo dos mesmos pressupostos e agora justificados de sobremaneira por razões ligadas à saúde dos animais e à possível ocorrência de doenças, entendemos que cada cão deva possuir o seu próprio trem de limpeza. O asseio, a saúde e a integridade de carácter de um cão são tarefas obrigatórias para o seu dono, que o vê como indivíduo, aposta no seu bem-estar e que tudo faz para que seja forte e viva por mais tempo.

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