terça-feira, 6 de outubro de 2009

::: Abananado para ficar bonito :::

À guisa de pitrolino (indivíduo que vendia porta-à-porta os mais variados produtos para uso doméstico, geralmente proprietário de uma carrinha sebenta e que se fazia anunciar por uma corneta), proliferam por aqui carrinhas comerciais de Pet Care, anunciando pelas estradas a globalidade dos seus serviços: assistência médico-veterinária, banhos, tosquias, hotel, passeios, treino e serviço fúnebre. Sem margem para dúvida: um serviço completo!

Indo adiante no que à assistência veterinária diz respeito, porque é indispensável, questionamos a natureza dos restantes serviços a prestar, porque alguns podem ser dispensáveis e outros contraproducentes. Mas como em terra de cegos quem tem olho é rei, a clientela não pára de aumentar e o negócio é rentável, graças à ignorância generalizada que sempre contribuiu para a fortuna de alguns. E como este Blog se destina ao esclarecimento e tem como objectivo o bem-estar canino, importa alertar para as situações que o possam pôr em risco.

Muitos dos cães sujeitos a banhos e a tosquias jamais necessitariam disso, se os donos cuidassem deles devidamente, porque não são burros ou ovelhas, carenciados de rapadela no final da Primavera ou no início do Verão. É evidente que existem raças que obrigam a esse cuidado, mas, para espanto nosso, já vimos Pastores Alemães sujeitos a esta “profilaxia”, assim como tantos outros cuja tosquia é ridícula e imprópria, causando mal-estar. Tudo isto seria evitável se os donos fizessem uso do “Trem ou Kit de Limpeza”, constituído por uma cardadeira, três pentes, uma luva, uma touca e um pano. E como a maioria dos donos não o tem ou não sabe fazer uso dele, sendo difícil de encontrar nas lojas ditas da especialidade, adiantamos a seguir o seu modo de utilização.

A limpeza deve ser feita da frente para trás e de cima para baixo. Primeiro limpa-se a cabeça, depois o dorso e a cauda, e finalmente os membros. A cabeça é limpa com o pente largo e com a luva, sendo posteriormente resguardada com a touca. Os tratamentos preventivos aos ouvidos devem a última coisa a fazer, quando o cão se encontrar finalmente limpo. No dorso e na cauda o trabalho começa com a cardeira e evolui gradativamente para os pentes, do mais grosso para o mais fino, de acordo com o pêlo deixado. Tanto no dorso como na cauda, a cardadeira trabalha a favor e contra o pêlo. Os membros, porque têm menos pêlos, são limpos com o pente largo e com a luva. No final, a luva deve ser passada pelo corpo todo, porque dá brilho e uniformiza o manto. O último retoque é dado pelo pano, que ligeiramente húmido, absorve os pêlos soltos. Em tempos idos, os cães eram inspeccionados, à boca das aulas, pelo passar de uma luva branca. O costume perdeu-se. A omissão do escovar diário, principal responsável pela tosquia indevida, é puro desleixo e pode ter sérias consequências. Muitas vezes resulta das dificuldades oferecidas pelos cães, que não param quietos e resistem à limpeza. Aqui o hábito faz o monge e é soberano. Depois de alguma insistência, os animais quase que suplicam pela limpeza, porque é do seu agrado e sentem-se bem.

Por outro lado, os cães dos donos menos asseados, são arregimentados para a tosquia, resistindo ao tratamento e sujeitando-se a administração de várias anestesias, calmantes ou relaxantes, por vias diferentes, consoante a resistência oferecida. Longe da vista; longe do coração, acabam abananados para sair bonitos! Se todos os anos a terapia for a mesma, será que a saúde dos bichos não sairá afectada? Há quem resolva o problema à morteirada, apertando os animais para a aceitação da sua autoridade. Que venha o diabo e escolha, não será de evitar isto? Quando se fala em banhos caninos, em particular no seu uso abusivo, importa saber que a sua pele apenas tem 1/3 das camadas existentes no homem e que apenas têm glândulas sudoríparas no plano nasal e nos coxins palmares e plantares, muito embora a sua renovação celular seja mais rápida: oito dias menos que o homem. No entanto, pode dizer-se que a pele dos cães é mais sensível do que a nossa, atendendo ao PH (5.5 contra 7.0). Entendemos nós, por estas razões, que os banhos sistemáticos devem ser evitados e ceder lugar à escovagem diária, até porque um champô que não nos é nocivo, pode sê-lo para o cão. À parte disto, a sua pele contém uma flora de microorganismos (bactérias, fungos e ácaros) saprófitas (inofensivos) que actuam como uma barreira de protecção contra microorganismos patogénicos. Assim, o recurso sistemático aos banhos tende a promover o crescimento da flora patogénica local, comprometendo a integridade da barreira de protecção e dando azo a lesões cutâneas. Não é isto visível nos cães citadinos? Agora já sabemos qual a sua causa maior!

Quanto aos passeios e ao treino, o interesse do serviço é relativo, talvez seja urgente para quem não quer ser incomodado, tenha atribuições em demasia ou uma reduzida disponibilidade. Em qualquer dos casos, não compreendemos o porquê da aquisição dos cães. Como não temos dúvidas sobre quem os deve passear, debrucemo-nos sobre o treino.

Entendemos, considerando a relação óptima entre tratamento e treino, que o adestramento deve ser operado pelo dono e de acordo com as suas características biológicas, com o seu particular instalador, familiar e social, porque a coabitação é o objectivo: o cão destina-se à casa. E graças aos vínculos afectivos domésticos, a maioria dos deficientes também pode, com maior ou menor dificuldade, personificar a figura do líder, porque ele, melhor do que ninguém, saberá quais as regras a instalar. Perante isto, nenhum aproveitamento escolar pode ser ratificado sem a inerente satisfação doméstica. O melhor dos adestramentos sempre sairá do grupo familiar de adopção, desde que cada um saiba o seu papel e a sua responsabilidade como agente de ensino. A intromissão alheia neste processo pedagógico, pode perigar a liderança e promover a desobediência, pela ambiguidade das normas, procedimentos e posturas. A instrução operada por um agente externo é perita na formação de meninos de coro, transformados em diabos à solta pelas paredes do seu aconchego. Cada um deve pegar no seu cão e levá-lo à Escola, tal qual pai que diariamente acompanha as tarefas escolares do seu filho.

Quer queiramos ou não, a maioria dos serviços oferecidos, está relacionada com o aumento generalizado da riqueza e com o aproveitamento de alguns, que debaixo do estatuto de profissionais, esperam avidamente o lucro. E no final das contas, os cães são meramente um pretexto, quer saiam abananados ou não. Quando o esclarecimento imperar, à imagem do pitrolino, esta gente vai ter muito que apitar, talvez evoluindo da corneta prà trombeta. Apesar de tudo, estamos perante um mal necessário, porque doutra maneira, os cães seriam ainda mais ignorados e desprezados.

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