Há
histórias de outros que permanecem em nós silenciosamente e que acabam reavivadas
quando repetidas no nosso quotidiano. Tal é a “História do Carneiro”, uma
história verídica ocorrida na década de 50 do século passado nos campos circundantes
à Estrada Militar, lá para os lados da Calçada de Carriche, onde pastavam
rebanhos de ovelhas e ainda não existiam ali os horríveis prédios que hoje
desfeiam de sobremaneira esta entrada da Capital. Um grupo de três pessoas deslocava-se
calmamente pelos campos já ceifados tendo como pano de fundo um rebanho de
ovelhas, um casal de namorados policiado pela pai da moça. Inesperadamente,
enquanto o rapaz se insinuava discretamente para a moça, um carneiro correu na
direcção desta disposto a dar-lhe uma valente marrada. O perfumado rapazola, ao
invés de proteger a sua amada e com medo que sobrasse também para ele,
abandonou-a e pôs-se em fuga, acabando rapidamente em cima duma oliveira. Quem
acabou por valer à moça foi o pai, que enfrentou sem alarde a arremetida
daquele bicho cornudo, protegendo dessa forma a sua indefesa filha. Depois do
carneiro ter regressado para o rebanho, a moça interpretou o sucedido como um
aviso para não se casar com aquele jovem. Porém, acabou por casar-se com ele,
divorciando-se sensivelmente 15 anos depois.
Vi
este acto de cobardia repetido ontem, quando um jovem de 30 anos, ao ver uma
cadela solta avançar com os dentes à mostra na sua direcção, optou por
esconder-se atrás de um octogenário que acompanhava, servindo-se do corpo do
ancião como escudo, fazendo literalmente jus ao que muito se ouve por aí - “morrer
por morrer, que morra o meu pai que é mais velho!” O octogenário, um velho e
valente soldado nascido no Alentejo (uma amostra de gente), ao manter o
sangue-frio, conseguiu neutralizar as intenções da cadela, escapando à conta
disso ileso. Eu continuo a ouvir dizer por aí que “os nascidos ali e acolá é
que são valentes”, quando na verdade o que importa é ter valor,
independentemente do lugar onde se nasça.
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