terça-feira, 18 de maio de 2010

Carta aberta a uma leitora

Nunca tomámos esta opção, não ambicionamos protagonismo, privilegiamos a confidencialidade e respeitamos as dores alheias: toda a gente merece da nossa parte o mais profundo respeito. Apesar da relutância inicial, optámos por responder desta forma a uma leitora assídua das nossas publicações, no intuito de a ajudar e de solicitar ajuda. A senhora em questão ronda os 40 anos de idade, está divorciada, desempregada, tem uma filha maior, recebe tratamento anti-depressivo, vive com os pais e não tem carta de condução. Deseja dedicar-se à recolha de animais e ao adestramento, sem experiência prévia, tendo-nos contactado amiúde na procura de subsídios para realizar os seus desejos. Já nos visitou uma vez (a rogo nosso) e inteirou-se do trabalho por nós desenvolvido, demonstrando muito interesse e particular empenho. Tem sentido na pele as dificuldades relativas a quem concorre à canicultura e tem sido vítima da indiferença daqueles que nela se encontram já estabelecidos, quiçá pelo espectro da concorrência e pelo cada vez mais reduzido leque de clientes.

Em primeiro lugar queremos dizer à senhora”Y” que não desanime e ouse em ir adiante, muito embora as suas escolhas não sejam economicamente estáveis ou lucrativas, porque cães e gatos não são produtos de primeira necessidade e os seus direitos são continuamente ignorados, especialmente diante da crise económica que por aqui grassa e que tende a agravar-se, o que não nos isenta de facultar-lhe qualquer subsídio técnico-prático ao nosso alcance. Contudo, é bom estar ciente dos riscos que envolvem essas opções, para que a procura de novos proventos não resulte num maior endividamento. A única actividade lucrativa, ainda que sazonal, relativa aos animais de companhia é a relacionada com a sua hospedagem (hotéis para cães e gatos) e partir dela se podem implementar com sucesso outras relativas ao adestramento, à criação e ao pet care, apesar de muitos animais acabarem “esquecidos” para sempre nesses locais de acolhimento provisório, o que aumenta os encargos, diminui os lucros e dá azo a fortes dores de cabeça. A legislação em vigor é muito exigente e a fiscalização é deveras incisiva sobre projectos deste tipo, quando abraçados por particulares sem o aval autárquico ou doutras entidades relacionadas com ele. Ainda que esta actividade possa ser objecto de subsídio, ela não dispensará um estudo de viabilidade económica a apresentar à instituição credora, pelo que aconselhamos que tal seja feito e por quem se encontra creditado para isso.

Por exigências legais, os locais destinados a este tipo de actividade são geralmente afastados das grandes urbes, pela defesa dos direitos de cidadania, o que pode não ser mau atendendo a baixa de preços. No entanto, não havendo transportes públicos, face a situações emergentes, não vivendo no local, não havendo a disponibilidade de qualquer familiar para o efeito e na impossibilidade de pagar a terceiros, a carta de condução irá fazer-lhe muita falta, mais-valia que imediatamente deveria adquirir. Com a carta de condução na mão, ser-lhe-á mais fácil alcançar emprego nessa ou noutra actividade, quer venha a responder por ela ou nela venha a encontrar o seu salário. Entretanto continue a sua busca, saia de casa, informe-se e visite várias explorações dessa actividade, tome contacto com essa realidade e não se remeta exclusivamente à Internet, local preferencial para a burla e onde pouco ou nada transparece, na diferença que vai do virtual para o real.

À parte disto, importa que se sinta bem consigo própria, para evitar a sobrecarga e adquirir a disponibilidade físico-anímica inerente ao que pretende realizar, porque qualquer prestação de serviço exige uma imagem própria e de fácil identificação. Recupere e cuide da sua saúde, faça exercício físico e prepara-se para o esforço que a aguarda, porque lidar com animais, para além de gratificante, é uma tarefa que provoca grande desgaste. O tempo concorre contra si, a vida não pára e porque é farta em contrariedades, importa estar preparado para elas e levá-las de vencida.

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