Quase sempre assim fizemos e continuamos a fazê-lo, talvez por nos sentirmos enjeitados, ocultos pela Espanha e emparedados contra o Atlântico. É-nos mais fácil seguir as tendências dos outros do que preservar a nossa cultura, o que é bom vem de fora e é inquestionável, o que é nosso: já teve o seu tempo. O fenómeno é por demais visível e está presente em todas as áreas, inclusive na canicultura, onde a excelência dos cães importados, relega para o desprezível as raças nacionais. E como o cão é objecto de adoração, o importado vira ícone e tudo à sua volta se transforma em dogma.
Estarão os cães nacionais obsoletos? Serão uma encarnação descarada do nosso chauvinismo? Não aprendemos com os demais? Se assim é, a quem caberá a culpa? Que rumo tomar?
Como introdução ao tema e à sua problemática, porque inevitavelmente continuamos a pensar no uso a dar cães, muitos dos nossos exemplares mais robustos e polivalentes, acabam “carne para canhão”, constituídos em legião, nas matilhas de caça grossa, tal qual “janízaros” e a troco de quase nada, diante das condições que lhe são oferecidas.
Durante uma década criámos e adestrámos Cães de Água Portugueses, Castro Laboreiros, Filas de S.Miguel, Podengos Gigantes, Rafeiros Alentejanos, Serras da Estrela e Serras d’Aires. E fizemo-lo depois da experiência dos Fuzileiros com os Cães da Serra da Estrela, conscientes das suas dificuldades e apostados no sucesso. A constituição de binómios, nunca foi fácil, considerando as três disciplinas clássicas da cinotecnia: obediência, guarda e pistagem. Os únicos que se comportaram de modo excepcional foram os Filas de S.Miguel, contudo com um problema: a sociabilização “inter pares”. Criámos ainda Perdigueiros Nacionais, especificamente para caça e o rendimento não foi o esperado.
Cá por casa, confunde-se “silvestre” com “rústico”, porque a maioria das nossas raças é mais instintiva do que rica em personalidade, mais entregue a si própria e menos prestativa. Isto aponta para uma selecção descuidada, baseada quase em exclusivo nas características morfológicas, em detrimento da componente cognitiva. Aqui, criadores e adestradores persistem em andar de costas voltadas, acusando-se mutuamente e avançando cada um por si. Nisto encontra o cão importado terreno fértil, porque uns deixam de criar e os outros vão continuar a importar. O problema passa também pelos Clubes de Raça, exclusivamente preocupados com a venda das ninhadas e nada apostados na divulgação da sua mais-valia. Porque não temos provas de pastoreio para o Serra da Estrela, Castro Laboreiro e Serra d’Aires? Será por causa do desaparecimento dos lobos? Devido à má selecção, ninguém sabe o que fazer com os nossos cães, que continuam, teimosamente, arrumados nas estantes da nossa história recente, pouco requisitados para animais de companhia e arredados do seu lugar ao sol.
Criador em Portugal, é todo aquele que tem uma cadela, mesmo que desconheça quais os impulsos herdados mais importantes. Toda a minha gente discute genealogias, pouco ou nada sabe sobre cães e manda para o fado as mágoas do seu insucesso. Não deveriam os criadores ter alguma formação? Não seria importante relembrar que todos os animais que não se adaptaram, perderam o direito à sobrevivência? Será que os actuais criadores, agarrados aos “seus” pergaminhos, apostam na conservação do museu vivo canino, dispensando assim o virtual que dá vida aos dinossauros?
À parte disto, a opção pelo cão da estranja, quer se queira, quer não, assenta sobre uma razão económica, porque é novidade, tem procura, garante o lucro e a sua qualidade é reconhecida. Graças a isso, paralelamente ao seu ofício, alguns adestradores são seus importadores, arautos da sua mais-valia e principais responsáveis pela sua proliferação. No mundo da cinotecnia, o santo, aquele que é objecto de veneração, é o super-cão, porque possui qualidades para além das comummente encontradas, ainda que as não tenha ou seja o “cabo dos trabalhos”. Infelizmente, nem tudo o que vem de fora é bom. Vale a pena dar ouvidos ao provérbio árabe: “ confia em Alá, mas prende bem o teu camelo”, ou como se diz em português: “ fia-te na virgem e não corras! “ Há que ter alguma cautela.
No nosso modesto entender, os cães nacionais necessitam de evoluir no sentido da procura, ser entregues a uma nova leva de criadores e sujeitos a uma selecção aturada. Se for necessário actualizar ou alterar os estalões, porque não? De uma forma ou de outra, o futuro encarregar-se-á de enterrar o passado. Com isto, não estamos a defender a ruptura histórica ou o abandono das nossas tradições cinófilas, mas a catapultar para as gerações vindouras aquilo que nos foi confiado, garantindo a sobrevivência dos cães portugueses pela parceria que poderão oferecer. E como a ruptura está aí, perguntamos: o Serra da Estrela actual aguentará o trabalho dos seus ancestrais? E quantos Cães de Água mergulham ainda em espiral? Assim como o dogma é aceite pela fé, os cães serão aceites pela sua mais-valia, enquanto companheiros de jornada e amigos omnipresentes.
Estarão os cães nacionais obsoletos? Serão uma encarnação descarada do nosso chauvinismo? Não aprendemos com os demais? Se assim é, a quem caberá a culpa? Que rumo tomar?
Como introdução ao tema e à sua problemática, porque inevitavelmente continuamos a pensar no uso a dar cães, muitos dos nossos exemplares mais robustos e polivalentes, acabam “carne para canhão”, constituídos em legião, nas matilhas de caça grossa, tal qual “janízaros” e a troco de quase nada, diante das condições que lhe são oferecidas.
Durante uma década criámos e adestrámos Cães de Água Portugueses, Castro Laboreiros, Filas de S.Miguel, Podengos Gigantes, Rafeiros Alentejanos, Serras da Estrela e Serras d’Aires. E fizemo-lo depois da experiência dos Fuzileiros com os Cães da Serra da Estrela, conscientes das suas dificuldades e apostados no sucesso. A constituição de binómios, nunca foi fácil, considerando as três disciplinas clássicas da cinotecnia: obediência, guarda e pistagem. Os únicos que se comportaram de modo excepcional foram os Filas de S.Miguel, contudo com um problema: a sociabilização “inter pares”. Criámos ainda Perdigueiros Nacionais, especificamente para caça e o rendimento não foi o esperado.
Cá por casa, confunde-se “silvestre” com “rústico”, porque a maioria das nossas raças é mais instintiva do que rica em personalidade, mais entregue a si própria e menos prestativa. Isto aponta para uma selecção descuidada, baseada quase em exclusivo nas características morfológicas, em detrimento da componente cognitiva. Aqui, criadores e adestradores persistem em andar de costas voltadas, acusando-se mutuamente e avançando cada um por si. Nisto encontra o cão importado terreno fértil, porque uns deixam de criar e os outros vão continuar a importar. O problema passa também pelos Clubes de Raça, exclusivamente preocupados com a venda das ninhadas e nada apostados na divulgação da sua mais-valia. Porque não temos provas de pastoreio para o Serra da Estrela, Castro Laboreiro e Serra d’Aires? Será por causa do desaparecimento dos lobos? Devido à má selecção, ninguém sabe o que fazer com os nossos cães, que continuam, teimosamente, arrumados nas estantes da nossa história recente, pouco requisitados para animais de companhia e arredados do seu lugar ao sol.
Criador em Portugal, é todo aquele que tem uma cadela, mesmo que desconheça quais os impulsos herdados mais importantes. Toda a minha gente discute genealogias, pouco ou nada sabe sobre cães e manda para o fado as mágoas do seu insucesso. Não deveriam os criadores ter alguma formação? Não seria importante relembrar que todos os animais que não se adaptaram, perderam o direito à sobrevivência? Será que os actuais criadores, agarrados aos “seus” pergaminhos, apostam na conservação do museu vivo canino, dispensando assim o virtual que dá vida aos dinossauros?
À parte disto, a opção pelo cão da estranja, quer se queira, quer não, assenta sobre uma razão económica, porque é novidade, tem procura, garante o lucro e a sua qualidade é reconhecida. Graças a isso, paralelamente ao seu ofício, alguns adestradores são seus importadores, arautos da sua mais-valia e principais responsáveis pela sua proliferação. No mundo da cinotecnia, o santo, aquele que é objecto de veneração, é o super-cão, porque possui qualidades para além das comummente encontradas, ainda que as não tenha ou seja o “cabo dos trabalhos”. Infelizmente, nem tudo o que vem de fora é bom. Vale a pena dar ouvidos ao provérbio árabe: “ confia em Alá, mas prende bem o teu camelo”, ou como se diz em português: “ fia-te na virgem e não corras! “ Há que ter alguma cautela.
No nosso modesto entender, os cães nacionais necessitam de evoluir no sentido da procura, ser entregues a uma nova leva de criadores e sujeitos a uma selecção aturada. Se for necessário actualizar ou alterar os estalões, porque não? De uma forma ou de outra, o futuro encarregar-se-á de enterrar o passado. Com isto, não estamos a defender a ruptura histórica ou o abandono das nossas tradições cinófilas, mas a catapultar para as gerações vindouras aquilo que nos foi confiado, garantindo a sobrevivência dos cães portugueses pela parceria que poderão oferecer. E como a ruptura está aí, perguntamos: o Serra da Estrela actual aguentará o trabalho dos seus ancestrais? E quantos Cães de Água mergulham ainda em espiral? Assim como o dogma é aceite pela fé, os cães serão aceites pela sua mais-valia, enquanto companheiros de jornada e amigos omnipresentes.
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