Quando
em 1991 começámos a treinar cachorros a partir dos 4 meses de idade,
contrariamente à maioria que só os aceitava depois da maturidade sexual, por
volta dos 8 meses, por conselho de alguns veterinários e seguindo a tradição
que até ali reinava, para além de sermos incompreendidos, fomos rotulados de
oportunistas, de agiotas e até de “matadores de cães”, mimos que não nos
afastaram das razões que nos assistiam e que tornaram excelentes os cães que
treinámos, mercê do “Método da Precocidade” preconizado por Trumler, um
cinólogo infelizmente ainda pouco conhecido entre nós. Recentemente, ao repararem
nalguns textos publicados neste Blog, vários alunos nos disseram que estamos a
“abrir-nos demais”, a transmitir conhecimento de mão beijada para quem não nos
merece. E nisto concordamos com eles, muito embora seja esse o nosso objectivo,
porque muitos dos que saíram das nossas fileiras são hoje treinadores ou com
aspirações para isso, uns melhores e outros piores, gente que tem ao seu
encargo vários cães e que deverá amá-los, respeitá-los e aproveitá-los de modo
condigno, visando a sua salvaguarda, longevidade, bem-estar, utilidade e
coabitação harmoniosa na sociedade. O nosso objectivo é mais abrangente e
estende-se também àqueles que, não sendo nossos alunos, precisam igualmente de
ajuda, funcionando esta publicação como um manual de ensino à distância. Dando
seguimento a esse propósito, o de valer aos cães, vamos tentar aqui desfazer equívocos,
explicando as razões objectivas que nos levaram a aceitar cachorros na idade da
cópia, prática que mantemos até à presente data.
Pensou-se
e disse-se, não fossem a inveja e a má-língua instituições nacionais, que
começávamos o treino canino mais cedo para mais cedo o alcançarmos, o que nunca
objectivámos, porque bem depressa rebentaríamos os cachorros dos pontos de
vista físico, cognitivo e social, mercê da sua fragilidade estrutural, do
condicionamento abusivo e dos efeitos dele resultantes, castradores em absoluto
da versatilidade canina que abraça um número cada vez maior de usos e
disciplinas, sabendo-se que do exercício precoce da obediência resultaria a
total apatia defensiva dos cachorros, pelo rebentamento do seu sentimento
territorial, forçado pela a sobrecarga da liderança, assim alicerçada num
travamento lesivo e injustificado, efeitos completa e totalmente antagónicos ao
primeiro objectivo do adestramento: a salvaguarda dos cães, que considera como
primordial o seu bem-estar. A somar isto, convém recordar que na década de 90
aconteceu o “boom” dos cães de guarda, altura em que os bancos ofereciam
dinheiro pelo telefone e ele parecia nunca mais acabar, o que levou muitos,
fatidicamente, à compra de segunda habitação, à aquisição de carros novos, à
novidade de equipamentos e consequentemente a um exagerado endividamento familiar.
Nós como outros, vivemos dos clientes e naquele tempo não podíamos produzir
cordeiros, quando se procuravam lobos, o que desde logo tornou injustificados
os ataques ao nosso método e fez dos seus detractores mentirosos, nomeadamente
os que o consideravam nocivo para os cães de guarda (nessa altura chegámos a
ter 48 Rottweilers em treino e que se revelaram excelentes na Disciplina de
Guarda).
Quer se brinque ou se exija, se ludibrie ou se estimule, se procure o
truque ou se domine a técnica, o treino canino sempre será mais anaeróbio do
que aeróbio, por força da preparação específica que garante a complementaridade,
pelo que importa contrabalançá-lo com exercícios aeróbios que suportem e
minimizem o desgaste indutor às lesões. E essa é a primeira das preocupações do
“Método da Precocidade”, que ao decidir acompanhar os ciclos infantis dos
cachorros, garante-lhes por mais tempo os exercícios aeróbios necessários à
prática anaeróbia. Por outro lado, esse aumento do tempo de treino,
sensivelmente mais 3 meses, irá ajudar os donos menos aptos e deixá-los em
igualdade de circunstâncias com os demais condutores, para além de levar todos
a uma melhor relação binomial, mercê do trabalho conjunto e assim prolongado, o
que será também excelente para o estabelecimento de rotinas visando o bem-estar
dos cães, tarefas relativas ao seu entendimento, higiene e necessidades específicas.
Não trabalhamos mais cedo para mais cedo alcançarmos, começamos mais cedo para
melhorar a futura prestação dos animais, dotando-os de uma experiência variada
e rica que melhor os sociabilizará e os capacitará prós diferentes serviços. O
aumento do tempo de treino irá ainda possibilitar, pela observação detalhada, o
acerto nas carreiras a atribuir a cada cão, de acordo com as suas capacidades,
qualidades e propensões (físicas, cognitivas e psicológicas).
Em síntese, o “Método da Precocidade” promove o impulso ao conhecimento
canino, pode operar a correcção morfológica dos cachorros (aprumos), melhor
capacita e responsabiliza os condutores, reforça o carácter dos cães, melhora
as sua performances atléticas e torna a sua sociabilização mais fácil, porque
irá acontecer antes da maturidade sexual e dos seus entraves. Dos 4 aos 6 meses
de idade, do ponto de vista cognitivo, os cachorros encontram-se na “idade da
cópia”, aprendendo por exemplo e imitação as lições dos cães adultos, vindo a
escalonar-se socialmente por volta dos 6 meses. Neste período a plasticidade
física acompanha a cognitiva, tornando possível a correcção morfológica,
através de aparelhos que para isso concorrem, suprimindo ou suavizando
desaprumos tais como: pé-chato, abatimento de metacarpos, mãos divergentes,
peito estreito, dorso selado e jarrete de vaca. Essa correcção irá ser possível
pela obediência dinâmica, que a partir de aulas colectivas, estimulará os mais
novos a seguirem os cães adultos sobre os obstáculos próprios para a sua idade,
que sendo baixos e pouco extensos, são por natureza mais aeróbios do que
anaeróbios, causando-lhes apetência e livrando-os da saturação. A exemplo da
musculação, também a correcção morfológica canina acontece da parte para o todo,
o que a torna também anaeróbia, porque jamais se corrigirá o dorso selado se
não vencermos primeiro as suas possíveis causas (mãos divergentes, dedos
abertos, abatimento de metacarpos, peito invertido e descodilhamento
locomotor).
No nosso modesto entender, ratificado pelos resultados que sempre
obtivemos, todos os cachorros deverão ser convidados para os obstáculos e
usufruir dos seus benefícios, obstáculos que nunca deverão ser superiores à sua
apetência e capacidade de resolução. Como subsídio para a prática dos
obstáculos, sempre usámos a marcha como pré-requisito, numa toada de 3km
horários dos 4 para os 5 meses e de 5km horários daí para diante, enquanto
andamento musculador por excelência, que garante a transição segura e natural
prós restantes andamentos. À marcha atrelada sempre dedicámos 3/4 das aulas e aos obstáculos a parte restante. Explicámos algumas das
razões relativas ao método que aperfilhámos, seguimos e recomendamos, apesar de
ainda sobrarem muitas (temos consciência disso). Esperamos que assim nos
compreendam melhor, isto se não nos houvéssemos já feito entender ou se ainda
nos houvessem compreendido. Voltaremos à temática sempre que o esclarecimento
se justificar.
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