Conhecemos um
médico que era capaz de tudo prescrever aos seus pacientes mas que se negava terminantemente a tratar dos seus familiares e amigos mais chegados por
recear vê-los ou fazê-los sofrer, endereçando-os sem qualquer pejo para os bons
ofícios doutros clínicos. Igual dilema sentem os proprietários caninos que são
obrigados a treinar os seus cães, por serem em simultâneo seus líderes e
companheiros de brincadeira, no conflito entre a exigência e a tolerância que a
razão e os vínculos afectivos sustentam. E como o dever e a disciplina esmorecem
diante da afeição, à imitação do médico atrás citado, alguns proprietários
caninos optam por incumbir a educação dos seus cães a outros, que por norma se
fazem pagar muito bem e que nem sempre alcançam os resultados acordados e expectáveis.
Nas relações de
paridade absoluta entre homens e cães, modelo que todos dizem seguir por ser
agora politicamente correcto e do agrado das mentes mais ingénuas, perde-se a
liderança e ganha-se o amigo, assistindo-se invariavelmente ao suborno mútuo: o
dono tenta subornar o cão para que ele faça algo e cão lança mão da chantagem
emocional para não o fazer, particularmente diante de exercícios mais complicados
ou de maior exigência. Para que isto não suceda, importa separar os momentos
lúdicos dos dedicados ao trabalho objectivo, ainda que os primeiros subsidiem e
facilitem de sobremaneira o alcance dos últimos, estabelecer uma clara
diferença entre os momentos de supercompensão e os pedagógicos propriamente
ditos, tendo o cuidado de os equilibrar para que os cães não resistam ao
trabalho e alcancem com alegria os desafios inerentes à sua capacitação.
O adestramento
canino não dispensa o são equilíbrio entre a razão e a emoção, o domínio do
inteligente sobre o irracional, que mediante estratégias adequadas, aproveita o
potencial individual de cada cão para fim útil, transformando assim as suas
respostas naturais em mais-valias. Quer queiramos ou não, a qualidade de um cão
sempre espelhará a maior ou menor qualidade dos seus mestres.
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