Por estranho que pareça,
quando mais conheço os cães, melhor compreendo os homens, mormente aquilo que
lhes é comum e que os induz a comportamentos idênticos, identidade que, quando constituída
em equipa, tanto pode levar à rotura entre ambos como a uma verdadeira simbiose
de natureza perigosa e anti-social. Os cães dominantes e os homens poderosos
nasceram para a tomada do poder, uns por impulso inato e os outros pela ambição com que nasceram. Infelizmente sempre será mais fácil regrar os primeiros que
os últimos, facto que fica a dever-se à dependência canina que facilita a assimilação
de regras e ao maior atavio dos homens que os leva a contorná-las.
No que à fidelidade diz respeito, ambos são mais fiéis a si próprios do que
aos outros, os cães dominantes resistem ao condicionamento e tentam impor a sua
vontade e os homens poderosos julgam-se acima das convenções e criam o seu
próprio código de conduta, já que os dois nasceram para liderar, os primeiros
pela lei do mais forte e os segundos por maior engenho, não diferindo nisso uns
dos outros. Se os cães, ao atingirem o lugar mais alto na hierarquia social e por
razões ligadas à sobrevivência da sua espécie, não dispensam o concurso de
várias fêmeas, os homens também procurarão os favores de várias mulheres, eles
por necessidade de afirmação e elas por admiração, desejo de protecção e
conveniência. Cães e homens usam a poligamia para consumarem a sua incontida dominância,
resultando esta dum impreterível apelo animal que necessitam de ver satisfeito
satisfeito e que alcançam pelo seu status social. Antes que nos acusem dum
crime “lesa-majestade”, perguntamos: quantos reconhecidos e badalados
filantropos, tornados comendadores, mantêm um séquito de mulheres ou várias
relações extraconjugais? Quantos reis, presidentes, patrões, clérigos e chefes
de tabanca incorrem no mesmo comportamento? Hoje homens e mulheres, em
igualdade de circunstâncias e oportunidade, não concorrem para a mesma prática?
É evidente que a monogamia é uma convenção social, por vezes reforçada
por preceitos religiosos, o que não impedirá os poderosos e os mais instintivos
de desrespeitá-la, ainda que de modo dissimulado quando importa salvaguardar as
aparências, dando seguimento à poligamia visível na maioria dos mamíferos, dos
quais os cães não são excepção. Se deixarmos copular um cão com forte impulso
ao poder antes de estar devidamente adestrado e controlado, teremos uma dificuldade
acrescida, porque a consumação do acto reforçará a sua tendência natural,
poderá criar mais entraves à sua submissão e dar azo a confrontações. Não é por
acaso que a castração canina é prática corrente, muito embora seja gratuita e
abusiva quando aplicada sobre animais manifestamente submissos, ainda que a
coberto de pretensas razões tangentes à medicina preventiva.
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