Há um só Cão de Pastor Alemão, mas dentro da raça, como
sempre aconteceu, acontecem diferentes linhas de selecção, ligadas a predicados
tão distintos como são o trabalho e a beleza. Os actuais cães de trabalho, mercê das alterações de estalão, devem
mais aos cães recentes que aos ancestrais dessa categoria, apresentando uma
curva de crescimento mais próxima ou igual à dos cães de exposição, o que
nem sempre abona em seu favor e tem levado à sua substituição por exemplares
doutras raças, nomeadamente pelo Malinois. A discussão sobre as diferentes
linhas anda acesa por este mundo afora, sendo invariavelmente mais cardíaca que
razoável e por conseguinte mais apaixonada que objectiva. Como há muito fizemos
a nossa opção, não nos interessa alimentar polémicas, apenas revelar dados da
nossa observação e experiência ao longo de quatro décadas, no intuito de mais
valer a uns e a outros, para que todos melhor acompanhem o desenvolvimento dos
seus cachorros, os compreendam por aquilo que são e não segundo tabelas ou
modelos estereotipados que a uns beneficiam e a outros prejudicam.
Somos
obrigados a reconhecer duas linhas, uma anterior aos cães Von Arminius e
Wienerau, que aqui trataremos como “linha antiga” e outra advinda desses dois
canis que trataremos como “linha moderna”, muito
embora esta diferenciação não nos agrade de todo, porque sempre subsistiram
entre os Pastores Alemães exemplares muito mais rampeados que outros, o que
legitima os actuais numa mesma e só origem comum. E quem disso tiver
dúvidas, depressa as sanará pelas fotos dos primeiros exemplares da raça, onde
tal já era por demais evidente. Essa inclinação de garupa, caraterizada por uma
excessiva convexidade dorsal, sempre esteve associada a costelas mais planas,
ao desaprumo dos jarretes (jarrete de vaca), à menor abertura de peito, às mãos
divergentes e ao abatimento dos metacarpos, o que pela disposição dos eixos, ontem
como hoje, garante uma marcha solta e desenvolta, para a frente e nalguns casos
extraordinariamente suspensa, factores que têm contribuído para a proliferação
de exemplares mais leves e nalguns casos substancialmente mais pequenos, dentro
de um estalão que ainda aceita beneficiamentos entre progenitores com 10cm e
quase 20kg de diferença entre si, o que não elimina de imediato os indesejáveis
exemplares pernaltos. Entretanto, não se pode dissociar o trabalho nas linhas
de Walter Martin prá supressão da displasia coxo-femural e pró reforço da
caracterização lupina destes pastores.
Os cães
considerados de linha antiga, cuja diferença principal não é o tamanho, porque
também entre eles abundam exemplares pequenos, são cães mais arredondados de
costela e de dorso quase paralelo ao solo, com tendências ao selamento e com
mais facilidade na transição dos andamentos naturais. Grande número deles ainda
é flagelado pela displasia coxo-femural, muito embora raramente apresentem displasia
do ombro, bolsas de líquido sinovial nos codilhos, dificuldades digestivas ou
intolerâncias alimentares, fenômenos mais comuns nos cães tidos como de linha
moderna, a quem a endogamia e consanguinidade não são alheias. Foi a linha
antiga a responsável pelos louros grangeados pelos Pastores Alemães, enquanto
cães de trabalho, mais robustos, resistentes e equilibrados. Os actuais cães de
trabalho, pelo menos no papel, há muito que quebraram os laços de sangue com
eles, o que nem sempre é verdade e é por demais evidente na morfologia de alguns,
especialmente se forem lobeiros, pretos ou doutra variedade recessiva, uma vez
que estas variedades cromáticas foram, durante demasiado tempo, desprezadas ou
arredadas da criação pelos expositores da raça.
Aos exemplares provenientes
dos beneficiamentos entre as duas linhas, prática exclusiva dos criadores que
procuram cães de utilidade, se tem chamado de meia-linha. Esta opção, atendendo
ao fim procurado, tem-se revelado a mais capaz, muito embora o cão ideal ainda
esteja por chegar, aquele que juntará à extraordinária beleza a excelente
capacidade de aprendizagem. Chegará mais cedo se o adestramento específico ruir, o que parece não
tardar, ou se os critérios selectivos se alterarem, o que já está a acontecer
face à excessiva consanguinidade presente nesta e noutras raças. Os cães
tratados como de “meia-linha” seguem a curva de crescimento dos cães de
exposição e não a encontrada nos seus progenitores de selecção mais antiga, o
que só por si legitima a pureza das linhas actuais, uma vez que o regresso ao
atavismo não as desconsidera, contrariamente ao que alguns continuam a afirmar
pelos quatro cantos do mundo. Não obstante e reforçando o que já dissemos, os cães actuais, quando libertos do
calvário que apenas compreende o “vai-vem” da boxe para o ringue e vice-versa,
pelo aumento da massa muscular produzido pelo trabalho, tendem a amarrecar-se
menos, diferindo dos mais antigos somente pelas angulações traseiras e
particular das costelas, já que o seu dorso tende a nivelar-se pela linha do
solo (o que para muitos é um tremendo contratempo), isto se não forem
demasiado estreitos de peito, apresentarem mãos divergentes, significativo
abatimento de metacarpos, descodilharem em marcha ou forem “naturalmente”
famélicos ao ponto de espetarem os ossos. Quando isto acontece, é melhor
deixá-los à vontade e entregá-los ao exercício da sua preferência, para que não
agravem a sua frágil morfologia e vejam assim comprometida a sua saúde que já
não é muita!
Nenhuma
linha de selecção se pode gabar de só produzir bons exemplares, porque
subsistem em todas elas indivíduos bons, maus, excelentes e medíocres,
independentemente da sua genealogia ser mais ou menos chocalhada e das
expectativas criadas à sua volta. Apesar das diferenças entre elas, todas se
sujeitam ao mesmo estalão e perante ele são julgadas, mesmo que tenham
diferentes curvas de crescimento como é o caso. Os actuais cães de exposição crescem mais rápido que os seus congéres
de trabalho, podendo inclusive ver o seu peso aumentado, dos 2 para os 7 meses,
cerca de 25% em relação a eles, mas aos 8 meses estão praticamente formados e
pouco aumentarão de peso e altura, permanecendo no peso de estalão até aos 3 anos
de idade. Se houver aumento de peso (o que é natural), ele dificilmente
ultrapassará os 5%. Já os das selecções anteriores têm uma curva de crescimento
mais alongada, alcançando ou ultrapassando os outros até aos 12 meses. Uns e
outros irão respeitar tanto a altura quando o peso padronizados.
A que se
deverá tal diferença? Basicamente à escolha das linhas e aos pressupostos
selectivos de cada criador, ao diverso entendimento do cão desejável diante do
fim procurado, pois se antigamente se desprezavam os cães de costela demasiado plana,
hoje procura-se a sua proliferação. Os coeficientes de envergadura desejados passaram
de 2 e de 1.8 para 2.2 e 1.9, respectivamente para fêmeas e machos, entrando
algumas em ringue com 2.4 e machos com 2.2. Se no passado se procurava uma
ossatura forte, agora tal é um entrave, atendendo à flexibilidade dos cães
muito angulados, que mesmo sendo leves, sofrem horrores sobre os jarretes, já
que a exagerada convexidade os sobrecarrega pelo atraso do ponto gravitacional.
O crescimento acelerado dos actuais
pastores, que é mais célere do que o verificado nos lobos silvestres, ao
aproximar a maturidade sexual da emocional, dá aos adestradores menor espaço de
manobra e poderá condicionar a capacidade de aprendizagem desses cães, assim
como a sua recuperação morfológica, por vezes imperativa diante de desaprumos vários
mercê de uma fase plástica menor. Contudo, deste modo se conseguiu eliminar
o selamento do dorso, indesejáveis alterações morfológicas, maiores delongas no
uso dos cães e alcançar a sociabilização sem maiores dificuldades.
Convém não esquecer que o
estalão em vigor foi lavrado 13 anos antes da descoberta do genoma canino e que
futuramente, tudo leva a crer, conseguiremos eliminar menos valias físicas sem
suprimirmos as mais–valias psicológicas e cognitivas que engrandeceram a raça. A nossa referência às
linhas antigas, e que isto fique bem claro, desconsidera as “selecções” operadas
na década de 70 do século passado e reconhece a excelência do trabalho
selectivo operado nas três décadas anteriores, nomeadamente o efectuado nos países da Commonwealth, Estados
Unidos, Bélgica, Alemanha, França, Austria e no Leste europeu, particularmente
no mundo eslavo, apesar de nalguns casos a endogamia ter alcançado valores
nunca vistos por força do isolamento a que se viu votado e que foi agravada com
o passar dos anos.
As diferentes
tabelas de crescimento, provenientes da observação de distintos criadores, ao
não serem universais, não contemplam a globalidade da raça, as várias linhas de
selecção e as respectivas curvas de crescimento, sendo por isso mesmo inexactas
e apenas válidas para determinado grupo de indivíduos com a mesma origem, apesar de aos 12 meses
todos os cães se encontrarem debaixo do mesmo estalão, diferindo apenas na envergadura, valor encontrado pela divisão
da altura pelo peso e que deverá considerar o sexo, as diferentes ossaturas
e as distintas variedades cromáticas (a dominante e as recessivas), porque cada
uma delas se desenvolve mais ou menos em períodos diferentes, havendo umas mais
precoces do que outras segundo a herança genética de cada uma.
Porque
sempre nos dedicámos à utilidade dos Pastores Alemães e nunca isentámos nenhum
do trabalho, de acordo com os pesos e medidas manifestos no estalão, temos para
as cadelas 3 tabelas distintas de crescimento e o mesmo número para os machos,
considerando os exemplares maiores e os menores, os mais leves e os mais
pesados, atribuindo às fêmeas os valores de 2, 2.2 e 2.4 e aos machos de 1.7, 1.8 e 1.9. Abaixo ou acima destes valores, a prestação dos CPA’s
torna-se incaracterística e certamente terá como modelo um cão doutra raça, por
mais excelente que seja o seu desempenho ou a sua celeridade operativa. Estes
são os valores desejáveis aos 12 meses de idade, pois não estamos a falar do
peso intermédio (Ps.Int) que acontece a partir dos 3 anos ou do máximo (Ps.Mx)
que pode suceder dos 6 em diante, respectivamente mais 5 e 10%. Atendendo à longevidade e qualidade de vida
dos pastores, o ideal é que se mantenham por mais tempo dentro do peso indicado
pelo estalão (Ps.Est).
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