Deus deve ter os cães em
boa conta, porque se assim não fosse, muitos já teriam morrido envenenados,
nomeadamente os pertencentes aos ignorantes, confiados e descuidados. Como
sempre me interessei por botânica e floricultura, interesses que ainda
mantenho, deparei-me num site de vendas com a oferta de uma planta altamente
venenosa – o ACÓNITO (Aconitum
napellus), pertencente à família Ranunculaceae e muito usado em fármacos
homeopáticos. A planta é também conhecida por mata-lobos, devido a uma lenda
que a dizia ser capaz de enfraquecer lobisomens.
O nome genérico dos sais
derivados do ácido aconítico a partir desta planta recebe o nome de aconitato.
O veneno do Acónito foi o mais utilizado pelos arqueiros desde a Antiguidade
até à Idade Média. Todas as partes da planta são muito venenosas por possuírem
alcalóides distintos, sendo igualmente venenosas todas as suas variedades desde
que a sua semente se encontre madura. Para se ter uma ideia mais aproximada da
toxidade desta planta, basta dizer que 10g da sua raíz bastam para matar um ser
humano adulto, uma vez que é ali que se concentra a maior parte dos seus
princípios activos.
Depois de ter sido usado
para envenenar lobos e raposas, o Acónito é agora vendido como planta
ornamental para jardins. Os sintomas mais comuns do envenenamento por esta
planta são: sensação de angústia; perca de sensibilidade; falta de ar ou
respiração lenta; aceleração dos batimentos cardíacos; tremores; rosto
dormente, salivação excessiva, zumbido nos ouvidos e visão desfocada. Quanto
aos medicamentos homeopáticos e fitoterápicos feitos à base de aconitina,
somente os médicos podem prescrevê-los.
Como as crianças adoram ir
brincar para o jardim e os jardins costumam ter os cães como residentes habituais,
na hora de adquirir uma moradia já ajardinada, informe-se sobre as plantas que
preenchem o jardim e decoram os seus canteiros, que naturalmente não deverão
ser tóxicas. De igual modo, quando pensar em adquirir uma nova planta,
certifique-se primeiro da sua toxidade, já que é a vida das suas crianças ou
dos seus cães que estão em causa.
Continuo a não perceber
por que razão se continuam a plantar flores, arbustos e árvores tóxicas em
infantários, escolas, moradias e lares. Faltará aos profissionais da área formação
específica? Quem tem cachorros pequenos sabe que não pode descansar quando eles
se encontram soltos, porque tendem a roer tudo à sua volta, tanto dentro de
casa como no quintal, mesmo depois de advertidos e de modo mais incidente dos 3
para os 5 meses de idade. Igual ou maior perigo correm as crianças com idade
inferior aos 4 anos.
Estamos fartos de dizer,
mas não cansados, que os cães só devem ser soltos no exterior depois dos donos
baterem minuciosamente o local onde pretendem soltá-los, para não serem vítimas
do ataque de outros cães; de engodos; de substâncias químicas ou corrosivas; de
restos industriais lesivos e da ingestão de plantas tóxicas capazes de
eliminá-los. Uma dessas plantas é a Figueira-do-Diabo (Ricinus communis L.),
espécie invasora que segundo um protocolo adaptado do Australian Weed Risk
Assessment (Pheloung et al. 1999), ocupa um nível de risco de 22 em termos de
comportamento invasor em Portugal. Segundo o mesmo protocolo os valores acima
de 6 já implicam num comportamento invasor, o que na prática significa que
temos Figueira-do-Diabo por todo o lado.
Apesar do óleo desta
planta se prestar para vários usos industriais e até como laxante, a sua
semente, quando purificada, é tóxica devido principalmente a uma proteína
chamada ricina, que é mortal quando ingerida mesmo em pequenas doses. Três sementes
podem matar uma criança, oito um adulto, onze um cão e oitenta um pato. Os
primeiros sinais da intoxicação acontecem logo nas primeiras horas depois do
envenenamento e traduzem-se em ardor nos olhos e na garganta, dores abdominais,
diarreia e vómito com sangue. O processo, que dizem incontrolável, só termina
quando a vítima falece por desidratação.
Para além disto, a planta
possui ainda uma potente proteína alergénica chamada CB-1A ou albuminas 2S nas
suas sementes e pólen. Um terceiro elemento nela presente é a ricinina, um
alcalóide que pode ser encontrado em todas as partes da planta, que afecta o
sistema nervoso central e poder ter vários efeitos, entre eles: convulsão,
melhoria de memória e falta de equilíbrio. As maiores concentrações de ricinina
encontram-se nas flores e nas folhas jovens. Infelizmente não são só o Acónito
e a Figueira-do-diabo que são tóxicas entre nós.
Com isto não queremos
semear o pânico ou ser mensageiros de fortes calamidades vindouras, somente
alertar os proprietários caninos para os riscos a que expõem os seus amigos de
4 patas ao pô-los em contacto com plantas que são nocivas para ambos, neste
país onde a informação é escassa sobre o assunto e povo é por norma
desinteressado. Em síntese, há que inventariar as flores, arbustos e árvores
dos nossos jardins e expulsar deles as que são tóxico e/ou venenosas. Debaixo
do mesmo cuidado, antes de soltarmos os nossos cães no exterior, devemos
primeiro observar minuciosamente a sua flora e só depois soltar os animais, o
que só será possível se previamente tivermos obtido a informação necessária.
E como por vezes todos os
cuidados são poucos e as distracções acontecem, é bom ter memorizado ou ter na
memória do telemóvel o número do CIAV (Centro de Informação Antivenenos) do INEM,
que é o 808 250 143.
Escusado será dizer que as
crianças entre o primeiro ano de vida e o quarto, devido ao seu particular
etário, incorrem nos mesmos riscos que os cães quanto expostas ao mesmo tipo de
plantas. Há muito que se deveria proceder a um esclarecimento nas escolas sobre
o assunto, o que de imediato levaria ao arrancar dos Oleandros (Nerium oleander)
presentes em inúmeras delas, obra de algum inteligente que nos julgou todos
burros. E já agora, por que carga de água é que as plantas tóxicas presentes
nos nossos jardins públicos não têm junto delas uma placa identificativa da sua
toxidez? Seremos porventura cidadãos de segunda? Não se esqueça: amar o nosso
cão, antes de tudo, é protegê-lo dos perigos que o cercam, independentemente do
serviço que nos preste, porque se o amamos, não podemos contribuir paulatinamente
para o seu extermínio, reflexão que estendemos também àqueles que se dizem
treinar cães para guarda e que os podem condenar à morte pela previsibilidade
dos seus ataques (felizmente raro é o cão que virá a ser solicitado para o
efeito).
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