Se há hábito que o português
não perdeu e dificilmente perderá, o de comer no campo é um deles, muito embora
tenha trocado o nome de “merendar” por “piquenicar” e aligeirado as refeições,
porque as cozinheiras doutrora já cá não estão, o garrafão de vinho caiu em
desuso e as sandes substituem os afamados pratos tradicionais. Contudo, ainda
se grelham sardinhas, bacalhau e febras, normalmente acompanhados das mais
variadas saladas que vão do tomate aos pimentos, passando pela alface e pelo
pepino (agora já muitos usam também rúcula). Depois de “bem aviados”, soltam as
crianças e embalam para uma grande soneca, debaixo das árvores e estendidos no
chão, acordando lá pràs 5 ou 6 da tarde, suados, tolhidos e vermelhos que nem
leitões.
Infelizmente estamos no
pique dos incêndios e todo o cuidado é pouco, os fogos florestais sucedem-se de
Norte a Sul do País e é preciso estar de sobreaviso, para que não acordarmos no
meio de inesperadas labaredas, tantas vezes espevitadas por veraneantes
descuidados. Melhor será assentar arraiais junto a uma estrada do que mata a
dentro, deixar o carro à beira da estrada do que trazê-lo para o meio da
floresta, porque mais vale andar mais um pouco do que agravar a situação e
comprometer o socorro. Nas matas ou parques que não têm assadores próprios, é
contraproducente fazer fogueiras, porque raramente são limpas e têm à sua volta
mato seco com fartura. Se você é fumador, não se deite de cigarro na boca, não
deixe garrafas de vidro à torreira do sol e escolha locais mais arejados e sem
mato, preferencialmente junto a rios ribeiros, porque “o seguro morreu de
velho”.
Curiosamente são os
proprietários caninos que correm mais riscos nas matas, porque procuram as
menos concorridas e menos acessíveis, para que os seus cães não incomodem e
possam correr à vontade, já que a lei os proíbe de circular no exterior sem
trela. Todavia, as áreas menos apelativas para os viandantes são habitats e
lugares de passagem para as espécies silvestres, que ali se sentem seguras pela
distância que as separa dos intrusos. Uma dessas espécies a ter em conta é o
Javali (Sus scrofa), cada vez mais numeroso nas nossas matas, que como se sabe
é omnívoro e tem o faro extraordinariamente desenvolvido, podendo cheirar
comida a 5 km de distância. A época estival marca o início do desmame dos
leitões, que começam a procurar comida debaixo da alçada das matriarcas, que ao
menor sinal de perigo darão a sua vida pelos filhotes, atacando violentamente
quem se aproximar deles, ataques que não raramente deixam marcas profundas e
que poderão ser letais para pessoas e animais.
Para diminuir os riscos de
confrontação, provocados pela avidez de alimento dos leitões, aconselha-se que
tanto as sobras da comida quanto os restos sejam ensacados e devidamente
guardados, as primeiras em caixas isotérmicas estanques e os últimos em sacos
de plástico ou em baldes com tampa, devendo ambos ser guardados dentro das
viaturas. Se porventura tal não se tornar prático, a comida deverá permanecer
junto das pessoas e os restos afastados delas no mínimo a 50m, estabelecendo
assim um perímetro de segurança, para que os leitões roubem os sacos do lixo e
não importunem ninguém, já que são naturalmente atrevidos na presença das suas
matriarcas, desaparecendo por norma com os sacos na boca. Pela mesma razão,
evite acampar perto dos recipientes de lixo nos parques de merendas. Se por
acaso se vir cercado de leitões, não os acaricie, não fuja ou corra atrás
deles, evite gestos bruscos, acalma-se e aja como se não os houvesse visto,
adquirindo uma mímica passiva e desinteressante, porque bem perto dos leitões,
ainda que não seja visível, está a sua mãe, que por ser extraordinariamente
protectora, não é para brincadeiras. Apesar da sua actividade poder decorrer
durante todo o dia, os javalis são mais activos ao crepúsculo e durante a
noite, ocasiões em que o risco de confrontação é maior e mais frequente, o que
pode tornar perigosa a permanência em matas, soutos e pinhais depois do sol se
pôr.
Desejamos umas óptimas
férias para que aqueles que se encontram a descansar e a retemperar as forças,
que usam o Verão para disfrutar da natureza e que o fazem na companhia dos seus
cães. Apostados no seu regresso a casa sem novidades, escrevemos este artigo
para os precaver de possíveis acidentes e contratempos.
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