sábado, 31 de maio de 2014

ESSE FLAGELO CHAMADO DISPLASIA AMBIENTAL

Sempre se ouviu falar que a displasia coxo-femural pode ter outra origem que não a genética e resultar também de razões ambientais, normalmente ligadas ao desrespeito pelo particular de cada raça e dos indivíduos, ao seu tamanho, à sua curva de crescimento, à qualidade das suas dietas e ao tipo de exercício solicitado aos cães enquanto cachorros. Ainda que a “displasia do cotovelo” seja um termo generalista, porque engloba quatro patologias de desenvolvimento (osteoncondrite dissecante, fragmentação do processo coronóide, desunião do processo ancóide e incongruência articular), também ela pode ser despoletada pelas mesmas razões ambientais que acima manifestámos. Como o tema excede em muito a nossa competência e tem sido objecto de várias teses por toda a parte, remeter-nos-emos apenas aos casos mais comuns e por nós observados, uma vez comprovados pelos veterinários que nos assistiram, relativos às relações entre a dieta e o exercício (trabalho), ao tipo de instalação doméstica, ao concurso de brinquedos impróprios, à ausência de passeios diários e ao desrespeito pela morfologia dos distintos grupos somáticos caninos, no período compreendido entre os 4 e os 18 meses de idade dos animais.
A relação dieta pobre e exercício exagerado ou inadequado. Primeiro há que considerar se os cães são de raça grande ou pequena, se quadrados ou rectangulares, porque os estragos são maiores e mais visíveis nos cães grandes e rectangulares, devido à sua curva de crescimento, a uma maior plasticidade e à consequente morosidade do seu processo de ossificação, apesar ambos poderem vir a ser vitimados pelo nanismo, o que não é absoluto, mas que implicará em menor tamanho, na diminuição da densidade óssea e na perca substancial de envergadura. Nos casos que observámos, esta relação mais contribuiu para a displasia do ombro do que para a coxo-femural, estando também associada a fenómenos como: pernaltismo, peito estreito, joelhos para dentro, mãos divergentes, pé chato, abatimento de metacarpos, dorso selado, descodilhamento e jarrete de vaca.
A relação dieta rica e exercício precário. Esta é a relação que mais contribui para más formações ou deformações ósseas, que induz ao crescimento exagerado, ao aumento de peso e à sobrecarga das articulações, produzindo nelas alterações anómalas ou indesejáveis. Tanto as displasias do cotovelo como a coxo-femural encontram aqui razão para a sua origem ambiental, porque o aumento de peso, ao ultrapassar o processo de robustecimento natural do esqueleto canino, acabará por condená-lo à deformação.
Particular da instalação doméstica. Pisos duros e escorregadios, percursos de um só sentido, excesso de enclausuramento, inactividade e exiguidade dos espaços, tudo somado ou cada um em particular, de modo continuado e durante a fase de crescimento, podem contribuir para as displasias ambientais, porque propiciam por necessidade ou desuso, assentamentos ortopédicos extraordinários que produzirão alterações articulares nos cães, vulgarmente entendidos como ausência de convexidade e desaprumos.
Brinquedos impróprios para a idade. Antes dos cachorros atingirem os sete meses de idade, não lhe deverão ser entregues ou repartidos brinquedos multi-direccionais, porque contribuem de sobremaneira para a luxação dos ombros e concorrem de modo substancial para a displasia do cotovelo, já que obrigam os cachorros a repentinas mudanças de direcção sobre a espádua, ombros e cotovelos em formação. É importante lembrar que os cães não têm clavículas e caso o cão persista em coxear de uma das mãos, deverá de imediato ser levado ao veterinário, para que a possível luxação de um dos lados não leve à sobrecarga do outro e venha a comprometer ambos.
A ausência ou impropriedade dos passeios diários. Cachorro que não se mexe acaba por definhar e sofrer alteração no seu esqueleto, crescendo de forma anómala e de acordo com o seu modo de vida, desusando músculos e comprometendo articulações. Nos passeios diários deverá evitar-se, sempre que possível, os pisos duros (alcatrão, calçada, cimento, etc.) e dar-se à preferência aos de terra. Também os de areia solta deverão ser evitados, para que o esforço que requerem não venha a ofender o esqueleto dos cachorros em formação. Assim, nas idas à praia, os passeios deverão acontecer onde a areia que encontra mais compactada, geralmente junto ao leito dos rios ou próximo da água do mar.
Desrespeito e abuso da morfologia canina. Mais do que a inactividade, o esforço é a causa que mais contribui para a displasia de origem ambiental e acontece geralmente por desrespeito à curva de crescimento dos cachorros, à sua morfologia e andamento preferencial. Os cães rectangulares demoram mais tempo a galopar que os quadrados, tendo como andamento preferencial a marcha ou o passo de andadura. Os cães mais pequenos galopam mais cedo que os grandes, que normalmente galopam periclitantes (“à coelho”) até aos sete meses de idade, com os membros posteriores a reboque da espádua e paralelos entre si. Muitos cachorros acabarão rebentados, tanto atrás como à frente, pelo desafio das bolas que os convidam a galopar precocemente ou a saltar amiúde na sua procura, graças ao esforço empreendido. A persistência neste tipo de exercícios inusitados tem favorecido a ocorrência de displasias de origem ambiental. Também a descida atabalhoada e constante de escadas antes dos sete meses de idade tem concorrido para igual incapacidade. A existência da displasia de origem ambiental não desculpa e não esconde a de origem genética, porque é menos frequente e sujeita a casos extraordinários.
Cães acorrentados. Não tínhamos previsto falar deste caso mas como entre nós ele persiste, não nos restou outro remédio, porque o acorrentar de cachorros também contribui para o aparecimento de displasias, tanto por inactividade como por esforço, já que provoca alterações no esqueleto dos animais, levando-os a um desenvolvimento atípico e inibidor da sua propensão atlética. Basicamente, a dita displasia de origem ambiental nos cães resulta de fenómenos ligados à sua instalação, à qualidade das suas dietas e ao tipo de esforço que lhes é requerido na fase plástica, podendo acontecer por inactividade, desgaste ou esforço. Adiantámos sete casos, muito embora hajam muitos mais, que outros melhor apetrechados manifestaram e continuarão a manifestar. Debruçámo-nos sobre o tema para esclarecer que a displasia é uma enfermidade multi-factorial e que não se deve apenas à carga genética.
Alguns conselhos. Dê uma dieta adequada para a idade que o seu cachorro atravessa, evite hospedá-lo em locais escorregadios, passeie com ele várias vezes ao dia por pisos de terra ou jardim, não lhe entregue brinquedos multi-direccionais e não o obrigue ao galope sistemático antes dos sete meses de idade, respeite a curva de crescimento do seu cachorro e não o sobrecarregue com exercícios impróprios para a sua idade. Quando forem à praia leve-o a circular onde a areia se encontra mais compactada e jamais o acorrente. Se tiver em conta estes cuidados, dificilmente contribuirá para o aparecimento da displasia de origem ambiental. Diz-se que “quem nasce torto tarde ou nunca se endireita”, mas nunca se ouviu dizer que quem nasce direito não se pode entortar. Para que isso não aconteça, todo o cuidado é pouco! 

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