Sempre se ouviu falar que a displasia coxo-femural
pode ter outra origem que não a genética e resultar também de razões
ambientais, normalmente ligadas ao desrespeito pelo particular de cada raça e
dos indivíduos, ao seu tamanho, à sua curva de crescimento, à qualidade das
suas dietas e ao tipo de exercício solicitado aos cães enquanto cachorros.
Ainda que a “displasia do cotovelo” seja um termo generalista, porque engloba
quatro patologias de desenvolvimento (osteoncondrite dissecante, fragmentação
do processo coronóide, desunião do processo ancóide e incongruência articular),
também ela pode ser despoletada pelas mesmas razões ambientais que acima
manifestámos. Como o tema excede em muito a nossa competência e tem sido
objecto de várias teses por toda a parte, remeter-nos-emos apenas aos casos
mais comuns e por nós observados, uma vez comprovados pelos veterinários que
nos assistiram, relativos às relações entre a dieta e o exercício (trabalho),
ao tipo de instalação doméstica, ao concurso de brinquedos impróprios, à ausência
de passeios diários e ao desrespeito pela morfologia dos distintos grupos
somáticos caninos, no período compreendido entre os 4 e os 18 meses de idade
dos animais.
A relação dieta pobre e
exercício exagerado ou inadequado. Primeiro há que considerar se os cães são de raça
grande ou pequena, se quadrados ou rectangulares, porque os estragos são
maiores e mais visíveis nos cães grandes e rectangulares, devido à sua curva de
crescimento, a uma maior plasticidade e à consequente morosidade do seu
processo de ossificação, apesar ambos poderem vir a ser vitimados pelo nanismo,
o que não é absoluto, mas que implicará em menor tamanho, na diminuição da
densidade óssea e na perca substancial de envergadura. Nos casos que
observámos, esta relação mais contribuiu para a displasia do ombro do que para
a coxo-femural, estando também associada a fenómenos como: pernaltismo, peito
estreito, joelhos para dentro, mãos divergentes, pé chato, abatimento de
metacarpos, dorso selado, descodilhamento e jarrete de vaca.
A relação
dieta rica e exercício precário. Esta é a relação que mais contribui para más
formações ou deformações ósseas, que induz ao crescimento exagerado, ao aumento
de peso e à sobrecarga das articulações, produzindo nelas alterações anómalas
ou indesejáveis. Tanto as displasias do cotovelo como a coxo-femural encontram
aqui razão para a sua origem ambiental, porque o aumento de peso, ao
ultrapassar o processo de robustecimento natural do esqueleto canino, acabará
por condená-lo à deformação.
Particular da
instalação doméstica.
Pisos duros e escorregadios, percursos de um só sentido, excesso de
enclausuramento, inactividade e exiguidade dos espaços, tudo somado ou cada um
em particular, de modo continuado e durante a fase de crescimento, podem
contribuir para as displasias ambientais, porque propiciam por necessidade ou
desuso, assentamentos ortopédicos extraordinários que produzirão alterações
articulares nos cães, vulgarmente entendidos como ausência de convexidade e
desaprumos.
Brinquedos impróprios para
a idade. Antes
dos cachorros atingirem os sete meses de idade, não lhe deverão ser entregues
ou repartidos brinquedos multi-direccionais, porque contribuem de sobremaneira
para a luxação dos ombros e concorrem de modo substancial para a displasia do
cotovelo, já que obrigam os cachorros a repentinas mudanças de direcção sobre a
espádua, ombros e cotovelos em formação. É importante lembrar que os cães não
têm clavículas e caso o cão persista em coxear de uma das mãos, deverá de
imediato ser levado ao veterinário, para que a possível luxação de um dos lados
não leve à sobrecarga do outro e venha a comprometer ambos.
A ausência ou impropriedade
dos passeios diários. Cachorro
que não se mexe acaba por definhar e sofrer alteração no seu esqueleto,
crescendo de forma anómala e de acordo com o seu modo de vida, desusando
músculos e comprometendo articulações. Nos passeios diários deverá evitar-se,
sempre que possível, os pisos duros (alcatrão, calçada, cimento, etc.) e dar-se
à preferência aos de terra. Também os de areia solta deverão ser evitados, para
que o esforço que requerem não venha a ofender o esqueleto dos cachorros em formação. Assim ,
nas idas à praia, os passeios deverão acontecer onde a areia que encontra mais
compactada, geralmente junto ao leito dos rios ou próximo da água do mar.
Desrespeito e abuso da
morfologia canina. Mais do
que a inactividade, o esforço é a causa que mais contribui para a displasia de
origem ambiental e acontece geralmente por desrespeito à curva de crescimento
dos cachorros, à sua morfologia e andamento preferencial. Os cães rectangulares
demoram mais tempo a galopar que os quadrados, tendo como andamento
preferencial a marcha ou o passo de andadura. Os cães mais pequenos galopam
mais cedo que os grandes, que normalmente galopam periclitantes (“à coelho”)
até aos sete meses de idade, com os membros posteriores a reboque da espádua e
paralelos entre si. Muitos cachorros acabarão rebentados, tanto atrás como à
frente, pelo desafio das bolas que os convidam a galopar precocemente ou a
saltar amiúde na sua procura, graças ao esforço empreendido. A persistência
neste tipo de exercícios inusitados tem favorecido a ocorrência de displasias
de origem ambiental. Também a descida atabalhoada e constante de escadas antes
dos sete meses de idade tem concorrido para igual incapacidade. A existência da
displasia de origem ambiental não desculpa e não esconde a de origem genética,
porque é menos frequente e sujeita a casos extraordinários.
Cães acorrentados. Não tínhamos previsto
falar deste caso mas como entre nós ele persiste, não nos restou outro remédio,
porque o acorrentar de cachorros também contribui para o aparecimento de
displasias, tanto por inactividade como por esforço, já que provoca alterações
no esqueleto dos animais, levando-os a um desenvolvimento atípico e inibidor da
sua propensão atlética. Basicamente, a dita displasia de origem ambiental nos
cães resulta de fenómenos ligados à sua instalação, à qualidade das suas dietas
e ao tipo de esforço que lhes é requerido na fase plástica, podendo acontecer
por inactividade, desgaste ou esforço. Adiantámos sete casos, muito embora
hajam muitos mais, que outros melhor apetrechados manifestaram e continuarão a
manifestar. Debruçámo-nos sobre o tema para esclarecer que a displasia é uma
enfermidade multi-factorial e que não se deve apenas à carga genética.
Alguns conselhos. Dê uma dieta adequada
para a idade que o seu cachorro atravessa, evite hospedá-lo em locais
escorregadios, passeie com ele várias vezes ao dia por pisos de terra ou
jardim, não lhe entregue brinquedos multi-direccionais e não o obrigue ao
galope sistemático antes dos sete meses de idade, respeite a curva de
crescimento do seu cachorro e não o sobrecarregue com exercícios impróprios
para a sua idade. Quando forem à praia leve-o a circular onde a areia se
encontra mais compactada e jamais o acorrente. Se tiver em conta estes
cuidados, dificilmente contribuirá para o aparecimento da displasia de origem
ambiental. Diz-se que “quem nasce torto tarde ou nunca se endireita”, mas nunca
se ouviu dizer que quem nasce direito não se pode entortar. Para que isso não
aconteça, todo o cuidado é pouco!
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