quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A CURVA DE CRESCIMENTO DAS DIVERSAS LINHAS DO PASTOR ALEMÃO

Há um só Cão de Pastor Alemão, mas dentro da raça, como sempre aconteceu, acontecem diferentes linhas de selecção, ligadas a predicados tão distintos como são o trabalho e a beleza. Os actuais cães de trabalho, mercê das alterações de estalão, devem mais aos cães recentes que aos ancestrais dessa categoria, apresentando uma curva de crescimento mais próxima ou igual à dos cães de exposição, o que nem sempre abona em seu favor e tem levado à sua substituição por exemplares doutras raças, nomeadamente pelo Malinois. A discussão sobre as diferentes linhas anda acesa por este mundo afora, sendo invariavelmente mais cardíaca que razoável e por conseguinte mais apaixonada que objectiva. Como há muito fizemos a nossa opção, não nos interessa alimentar polémicas, apenas revelar dados da nossa observação e experiência ao longo de quatro décadas, no intuito de mais valer a uns e a outros, para que todos melhor acompanhem o desenvolvimento dos seus cachorros, os compreendam por aquilo que são e não segundo tabelas ou modelos estereotipados que a uns beneficiam e a outros prejudicam.
Somos obrigados a reconhecer duas linhas, uma anterior aos cães Von Arminius e Wienerau, que aqui trataremos como “linha antiga” e outra advinda desses dois canis que trataremos como “linha moderna”, muito embora esta diferenciação não nos agrade de todo, porque sempre subsistiram entre os Pastores Alemães exemplares muito mais rampeados que outros, o que legitima os actuais numa mesma e só origem comum. E quem disso tiver dúvidas, depressa as sanará pelas fotos dos primeiros exemplares da raça, onde tal já era por demais evidente. Essa inclinação de garupa, caraterizada por uma excessiva convexidade dorsal, sempre esteve associada a costelas mais planas, ao desaprumo dos jarretes (jarrete de vaca), à menor abertura de peito, às mãos divergentes e ao abatimento dos metacarpos, o que pela disposição dos eixos, ontem como hoje, garante uma marcha solta e desenvolta, para a frente e nalguns casos extraordinariamente suspensa, factores que têm contribuído para a proliferação de exemplares mais leves e nalguns casos substancialmente mais pequenos, dentro de um estalão que ainda aceita beneficiamentos entre progenitores com 10cm e quase 20kg de diferença entre si, o que não elimina de imediato os indesejáveis exemplares pernaltos. Entretanto, não se pode dissociar o trabalho nas linhas de Walter Martin prá supressão da displasia coxo-femural e pró reforço da caracterização lupina destes pastores.
Os cães considerados de linha antiga, cuja diferença principal não é o tamanho, porque também entre eles abundam exemplares pequenos, são cães mais arredondados de costela e de dorso quase paralelo ao solo, com tendências ao selamento e com mais facilidade na transição dos andamentos naturais. Grande número deles ainda é flagelado pela displasia coxo-femural, muito embora raramente apresentem displasia do ombro, bolsas de líquido sinovial nos codilhos, dificuldades digestivas ou intolerâncias alimentares, fenômenos mais comuns nos cães tidos como de linha moderna, a quem a endogamia e consanguinidade não são alheias. Foi a linha antiga a responsável pelos louros grangeados pelos Pastores Alemães, enquanto cães de trabalho, mais robustos, resistentes e equilibrados. Os actuais cães de trabalho, pelo menos no papel, há muito que quebraram os laços de sangue com eles, o que nem sempre é verdade e é por demais evidente na morfologia de alguns, especialmente se forem lobeiros, pretos ou doutra variedade recessiva, uma vez que estas variedades cromáticas foram, durante demasiado tempo, desprezadas ou arredadas da criação pelos expositores da raça.
Aos exemplares provenientes dos beneficiamentos entre as duas linhas, prática exclusiva dos criadores que procuram cães de utilidade, se tem chamado de meia-linha. Esta opção, atendendo ao fim procurado, tem-se revelado a mais capaz, muito embora o cão ideal ainda esteja por chegar, aquele que juntará à extraordinária beleza a excelente capacidade de aprendizagem. Chegará mais cedo se o adestramento específico ruir, o que parece não tardar, ou se os critérios selectivos se alterarem, o que já está a acontecer face à excessiva consanguinidade presente nesta e noutras raças. Os cães tratados como de “meia-linha” seguem a curva de crescimento dos cães de exposição e não a encontrada nos seus progenitores de selecção mais antiga, o que só por si legitima a pureza das linhas actuais, uma vez que o regresso ao atavismo não as desconsidera, contrariamente ao que alguns continuam a afirmar pelos quatro cantos do mundo. Não obstante e reforçando o que já dissemos, os cães actuais, quando libertos do calvário que apenas compreende o “vai-vem” da boxe para o ringue e vice-versa, pelo aumento da massa muscular produzido pelo trabalho, tendem a amarrecar-se menos, diferindo dos mais antigos somente pelas angulações traseiras e particular das costelas, já que o seu dorso tende a nivelar-se pela linha do solo (o que para muitos é um tremendo contratempo), isto se não forem demasiado estreitos de peito, apresentarem mãos divergentes, significativo abatimento de metacarpos, descodilharem em marcha ou forem “naturalmente” famélicos ao ponto de espetarem os ossos. Quando isto acontece, é melhor deixá-los à vontade e entregá-los ao exercício da sua preferência, para que não agravem a sua frágil morfologia e vejam assim comprometida a sua saúde que já não é muita!
Nenhuma linha de selecção se pode gabar de só produzir bons exemplares, porque subsistem em todas elas indivíduos bons, maus, excelentes e medíocres, independentemente da sua genealogia ser mais ou menos chocalhada e das expectativas criadas à sua volta. Apesar das diferenças entre elas, todas se sujeitam ao mesmo estalão e perante ele são julgadas, mesmo que tenham diferentes curvas de crescimento como é o caso. Os actuais cães de exposição crescem mais rápido que os seus congéres de trabalho, podendo inclusive ver o seu peso aumentado, dos 2 para os 7 meses, cerca de 25% em relação a eles, mas aos 8 meses estão praticamente formados e pouco aumentarão de peso e altura, permanecendo no peso de estalão até aos 3 anos de idade. Se houver aumento de peso (o que é natural), ele dificilmente ultrapassará os 5%. Já os das selecções anteriores têm uma curva de crescimento mais alongada, alcançando ou ultrapassando os outros até aos 12 meses. Uns e outros irão respeitar tanto a altura quando o peso padronizados.
A que se deverá tal diferença? Basicamente à escolha das linhas e aos pressupostos selectivos de cada criador, ao diverso entendimento do cão desejável diante do fim procurado, pois se antigamente se desprezavam os cães de costela demasiado plana, hoje procura-se a sua proliferação. Os coeficientes de envergadura desejados passaram de 2 e de 1.8 para 2.2 e 1.9, respectivamente para fêmeas e machos, entrando algumas em ringue com 2.4 e machos com 2.2. Se no passado se procurava uma ossatura forte, agora tal é um entrave, atendendo à flexibilidade dos cães muito angulados, que mesmo sendo leves, sofrem horrores sobre os jarretes, já que a exagerada convexidade os sobrecarrega pelo atraso do ponto gravitacional. O crescimento acelerado dos actuais pastores, que é mais célere do que o verificado nos lobos silvestres, ao aproximar a maturidade sexual da emocional, dá aos adestradores menor espaço de manobra e poderá condicionar a capacidade de aprendizagem desses cães, assim como a sua recuperação morfológica, por vezes imperativa diante de desaprumos vários mercê de uma fase plástica menor. Contudo, deste modo se conseguiu eliminar o selamento do dorso, indesejáveis alterações morfológicas, maiores delongas no uso dos cães e alcançar a sociabilização sem maiores dificuldades.

Convém não esquecer que o estalão em vigor foi lavrado 13 anos antes da descoberta do genoma canino e que futuramente, tudo leva a crer, conseguiremos eliminar menos valias físicas sem suprimirmos as mais–valias psicológicas e cognitivas que engrandeceram a raça. A nossa referência às linhas antigas, e que isto fique bem claro, desconsidera as “selecções” operadas na década de 70 do século passado e reconhece a excelência do trabalho selectivo operado nas três décadas anteriores, nomeadamente o efectuado nos países da Commonwealth, Estados Unidos, Bélgica, Alemanha, França, Austria e no Leste europeu, particularmente no mundo eslavo, apesar de nalguns casos a endogamia ter alcançado valores nunca vistos por força do isolamento a que se viu votado e que foi agravada com o passar dos anos.
As diferentes tabelas de crescimento, provenientes da observação de distintos criadores, ao não serem universais, não contemplam a globalidade da raça, as várias linhas de selecção e as respectivas curvas de crescimento, sendo por isso mesmo inexactas e apenas válidas para determinado grupo de indivíduos com a mesma origem, apesar de aos 12 meses todos os cães se encontrarem debaixo do mesmo estalão, diferindo apenas na envergadura, valor encontrado pela divisão da altura pelo peso e que deverá considerar o sexo, as diferentes ossaturas e as distintas variedades cromáticas (a dominante e as recessivas), porque cada uma delas se desenvolve mais ou menos em períodos diferentes, havendo umas mais precoces do que outras segundo a herança genética de cada uma.
Porque sempre nos dedicámos à utilidade dos Pastores Alemães e nunca isentámos nenhum do trabalho, de acordo com os pesos e medidas manifestos no estalão, temos para as cadelas 3 tabelas distintas de crescimento e o mesmo número para os machos, considerando os exemplares maiores e os menores, os mais leves e os mais pesados, atribuindo às fêmeas os valores de 2, 2.2 e 2.4 e aos machos de 1.7, 1.8 e 1.9. Abaixo ou acima destes valores, a prestação dos CPA’s torna-se incaracterística e certamente terá como modelo um cão doutra raça, por mais excelente que seja o seu desempenho ou a sua celeridade operativa. Estes são os valores desejáveis aos 12 meses de idade, pois não estamos a falar do peso intermédio (Ps.Int) que acontece a partir dos 3 anos ou do máximo (Ps.Mx) que pode suceder dos 6 em diante, respectivamente mais 5 e 10%. Atendendo à longevidade e qualidade de vida dos pastores, o ideal é que se mantenham por mais tempo dentro do peso indicado pelo estalão (Ps.Est).

NÃO COMO BURROS A TIRAR ÁGUA À NORA

Ao tratarmos este tema vem-nos à memória a estória do rapaz, do velho e do burro, que depois de cada um deles andar em cima do animal, à vez e em conjunto, acabaram por carregá-lo às costas por força da pressão e do parecer alheios. Assim procedem também muitos proprietários caninos, que na ânsia de tanto quererem aos seus animais, acabam por prejudicá-los e abraçar o ridículo sem disso darem conta (pelo menos de imediato). Estamos a referir-nos ao modo e aos meios usados para o exercício destes animais, companheiros que a tudo se sujeitam e que acabam arredados das práticas do seu agrado, responsáveis directamente pelo seu bem-estar social, qualidade de vida e aumento dos seus dias. De tudo se vê e imaginação não falta, será que alguns donos acabarão, desnecessariamente, também por carregá-los às costas?
Para começo de conversa, o melhor exercício para um cão (desde que a sua raça o permita) é a excursão diária, feita ao lado do dono, desenvolvida em marcha, com uma légua de extensão e em diferentes ecossistemas, numa cadência nunca superior aos 5 km por hora, cuidado que respeita a propensão excursionista canina e mantém o animal física e psicologicamente apto, radiante e ávido de novas jornadas, que fortalece os vínculos afectivos com o dono e torna indivisível a equipa homem-cão, sem estafas, ânsias ou atropelos. Mas como a maioria dos donos se queixa da falta de tempo e de disponibilidade física para tal, o que nem sempre corresponde à verdade, os cães acabam por se ver sujeitos a um conjunto de exercícios que não os poupam e isentam os seus líderes de maior esforço. Conhecedores dessa realidade, iremos analisar os mais vistos, tendo a preocupação de realçar as vantagens e desvantagens que cada um deles tem para os cães.
Das correrias atrás duma bola ou de um disco. Para alguns proprietários caninos, o correr à desfilada atrás de uma bola ou dum disco é o melhor dos exercícios para os seus cães, valendo-se para esse efeito dos parques e jardins à sua disposição. As vantagens deste exercício são mais técnicas do que físicas, porque o líder é o dono da bola e o brinquedo induz à sua supremacia, uma vez que por ele toda a obediência pode ser desenvolvida e instalada de modo pronto, descontraído e alegre, o que basta aos condutores civis, normalmente dispensados doutras exigências, responsabilidades e desempenhos. Como o galope mais cansa do que muscula e exige um esqueleto já consolidado, este exercício só pode ser aconselhado aos cachorros quando o deixam de ser, logo após a chegada da maturidade sexual, porque até lá os riscos para a sua saúde são enormes pela sobrecarga das articulações. É importante não esquecer que os cães não possuem clavículas e que a displasia (tanto a do ombro como a coxo-femural), pode resultar doutra origem que não a genética. Pela mesma razão, os brinquedos que na sua evolução disparam em diferentes direcções não devem ser usados nos cachorros antes dos 7 meses de idade. É evidente que se não forçarmos e as sessões de treino forem de curta duração, os riscos serão diminutos, muito embora se esteja a pedir aos cachorros desenvoltura sem primeiro os robustecer, pela antecipação da tarefa em relação à estrutura que a suporta, o que poderá levar a alterações morfológicas indesejáveis e implicar na curva de crescimento dos indivíduos (por encurtamento ou alongamento, sendo mais comum o 1º caso). Esta prática vicia os cães nos brinquedos, tanto nos seus como nos alheios, podendo levar a luta pela sua posse, dependendo isso do carácter dos indivíduos, do fim procurado, da sociabilização de que foram alvo e da qualidade da liderança.
Acerca dos cães atrelados a bicicletas ou coagidos a acompanhar viaturas. Este tipo de exercício, típico dos donos que não abdicam dos seus hobbies, pouco acostumados a cedências ou avessos à actividade física, contudo preocupados com o exercício dos seus cães, garante a boa forma canina, o desenvolvimento dos seus indices atléticos e condiciona os cães a não puxar graças à prisão em que se vêem. Dos pontos de vista social e cognitivo pouco adianta, porque o cão vai à arreata tal qual macho em varais de carroça. E daqui não veio grande novidade ao mundo, já que a prática é bastante antiga. No tempo em que os ciganos usavam esse meio de transporte, era comum ver cães debaixo dele e atrelados no seu eixo. Devido à territorialidade canina, os cães bem depressa guardavam a carroça e pouco se interessavam pelo pessoa dos seus donos, tendo com eles apenas uma relação de dependência por causa do seu sustento, daí que esta “modernice” se perde pelos confins do tempo. Este tipo de exercício, quando usado em exclusivo, pela ausência da cumplicidade necessária ao bom entendimento entre homens e cães, lança os animais na apatia e pode comprometer o seu uso pela precária relação com os donos, pelo que deverá ser substituído ou alternado com outro modo de parceria.
Dos cães sujeitos à tracção. Em primeiro lugar importa dizer que a tracção não transforma os fracos em fortes, antes agrava as suas insuficiências ou menos valias, que só deverá ser aplicada nos cães robustos e geneticamente dotados para isso, que por acaso não são muitos e que por norma apresentam um baixo impulso ao conhecimento. Apesar de qualquer cão, independentemente da sua raça, poder puxar, a maioria das raças caninas deverá ser dispensada de tal carga, porque poderá morrer, incorrer em lesões permanentes ou de difícil recuperação. Este exercício, que alarga o peito e molda a garupa, mas que também sela o dorso e sobrecarrega os membros dianteiros, há muito que é utilizado no treino dos cães de luta. Se o objectivo for o de melhorar a frente do nosso cão, existem outros meios mais suaves, menos dolorosos e mais eficazes para o seu alcance, tais como a natação, o aumento da capacidade de impulsão e o concurso às rampas, exercícios que possibilitam a convergência de membros que garante o desenvolvimento harmonioso do peito e da espádua (os resultados serão melhores se soubermos aproveitar a fase plástica dos cães). A tracção não reforça os vínculos afectivos entre o cão e o seu dono, não torna o animal feliz, antes desnuda um dono que se serve dele para usos bem distantes das suas respostas e propensões naturais, transformando-o em pau para toda a obra ou numa rara ocasião para o seu gozo. Convém não esquecer e olhando para trás, que o atrelamento dos cães só aconteceu em ecossistemas onde não haviam outros animais próprios para isso ou máquinas que os substituissem. Infelizmente para os cães, eles não são como os burros, que, quando a carga é demasiada, empacam ou jogam a carga no chão.

Dos cães que marcham à volta dos donos sozinhos e em liberdade, em percursos previamente determinados. Esta opção, abraçada pelos donos menos disponíveis do ponto de vista físico ou com alguma incapacidade locomotora, só é possível pelo ensino prévio dos cães e consequente aprovação na disciplina de obediência. Os proprietários caninos confinados no espaço urbano e sem trajectos imediatos ao seu redor, acabam por proceder do mesmo modo por ausência doutras condições. O exercício consiste em mandar o cão para diante e em torno do dono, em percursos circulares que podem ter de raio de 6.5 a 12m, dividindo-se as voltas em metade para que o animal se equilibre e curve nas duas direcções, circulando para a esquerda e para a direita. Este exercício, substituto por imperativo da excursão diária comum, mantém os indíces atléticos dos animais e reforça a obediência canina, nomeadamente a nuclear. O seu uso sistemático tende a saturar os cães e a levá-los à diminuição da cadência de marcha, pela ausência de novidade e inexistência doutros desafios, obsta ao desenvolvimento cognitivo canino pela persistência numa experiência repetitiva e pobre, fragiliza os cães diante de novos ecossistemas e poderá comprometer o “junto” a médio prazo, mesmo que amplamente recompensados. Ironizando, esta opção lembra os burros a tirar água à nora, subsistindo no entanto uma diferença, é que lhes vendavam os olhos para não ficarem tontos. 
Dos cães que correm pelas quintas à vontade! Os proprietários caninos urbanos, mais preocupados com o seu bem-estar e com a economia familiar, optam quase sempre por um cão pequeno, porque ocupa menos espaço e sai mais barato, o que nos parece razoável. No entanto, pondo de parte essas razões, mas também por causa delas, vende-se por aqui a idéia que os cães grandes são próprios para as quintas, onde se sentirão mais felizes, a gosto e à larga, como se do cativeiro e do isolamento grande benefício lhes sobrasse. Há quem diga ainda, um pouco por ignorância ou na tentativa de se enganar a si próprio, que os cães podem fazer exercício à vontade pelas quintas. Poder até podem, mas acabam por não o fazer devido à ausência da liderança e à falta de motivação para tal, porque não se vêem recompensados e acabam dominados pela apatia, comportando-se como borregos nas horas de mais calor. Ainda que ao princípio ladrem aos portões, pouco a pouco, com o passar do tempo, deixam de ser vistos e só aparecem para comer (quando aparecem). A quinta outra coisa não é que uma gaiola de ouro, algo parecido com um parque ampliado no Zoo, que tenta atenuar a alteração do viver social dos animais, a falta do seu habitat e a perca da sua liberdade. Os cães que deambulam pelas quintas, por desintesse, tornam-se indolentes e pouco propensos ao exercício físico, correndo esporadicamente e descansando de imediato, não adquirem resistência nem sentem necessidade de maior preparo atlético, a menos que o adquiram atrás dos gatos, a perseguir ratos ou a correr atrás de libelinhas. É importante lembrar que a marcha muscula mais do que o galope e que a perca da massa muscular induz a um maior esforço articular.
Dos cães que concorrem aos obstáculos. O concurso aos obstáculos é uma das práticas mais saudáveis para o exercício dos cães, desde que os seus donos os acompanhem e os ajudem a vencer as dificuldades, quando diversificados e de diferente categoria, próprios para o robustecimento de carácter, para o desenvolvimento de novas aptidões, para a correcção morfológica e necessários para a sobrevivência dos animais. O trabalho sobre os obstáculos não dispensa o aquecimento prévio e deverá acontecer dos mais simples para os mais complicados, numa toada progressiva que respeite a morfologia dos indivíduos, o progresso dos seus indíces atléticos e a observação dos seus ritmos vitais. Atendendo à necessidade de aquecimento, a disposição dos obstáculos deverá obedecer à transição ascendente dos andamentos naturais presentes nos cães, assim como obedecer às suas sequências naturais, devendo começar-se por aqueles que dispensam o galope e que propiciam o preparo dos musculos, independentemente da sua natureza ser elevadora, extensora, concêntrica ou mista. Por ausência de pistas tácticas e de quem as saiba montar, por questões ligadas ao desconhecimento biomecânico, enraizou-se entre nós a idéia que os obstáculos apenas se destinam aos cães de competição, sendo a maioria deles arredada do seu benefício, nomeadamente aqueles que mais necessitariam deles. Por tudo isto, muitas escolas apresentam-se mal vestidas ou “carecas” de obstáculos, carregadas de “bonecos” impróprios, tornados obsoletos e sem préstimo, o que em nada as abonará. Bem sabemos que uma pista táctica é dispendiosa e que o valor médio das mensalidades dificilmente sustentará a sua montagem e manutenção.
Dos cães entregues a obstáculos mecânicos e eléctricos. Cá por casa esta prática não está muito difundida e também não nos faz grande falta, fará a quem não quer fazer nada ou àqueles que se vêem obrigados a tudo. Nalguns hóteis caninos doutras latitudes, menos sujeitas à crise que nós passamos, existem obstáculos mecânicos e eléctricos à disposição dos hospedados que irão sair dali mais fortes e musculados. Uns são de uso individual e outros de uso colectivo, sendo os últimos parecidos com os carroceis da criançada. Alguns tiram partido do movimento animal (a exemplo da guia mecânica para os cavalos) e a maioria deles é accionada à distância por meios eléctricos ou electrónicos, o que permite trabalhar mais cães ao mesmo tempo, funcionando como serviço extra a acrescentar ao preço da hospedagem. Por razões óbvias, duvidamos que esta opção seja rentável em Portugal. Não obstante, já muita gente constrói e se serve de dispositivos mecânicos e eléctricos para a musculação dos seus cães, sendo a passadeira eléctrica a mais comum. Esta opção, que até se compreende e aceita por necessidade terapêutica ou esclarecimento clínico, é geralmente tomada pelos donos deficientes, pelos incapacitados, pelos pouco propensos ao exercício físico e por aqueles que se dizem de pouca disponibilidade, ficando por saber neste último caso, porque carga de água foram buscar um cão. Atendendo ao incómodo, só o uso terapêutico canino justificaria essa sobrecarga ou dor de cabeça. Ainda que daqui resultem melhorias físicas significativas para os seus involuntários e desconsiderados praticantes, nenhuma mais-valia técnica, social ou cognitiva lhes sobra, a não ser que as escadas rolantes façam parte do seu dia-a-dia e se vejam obrigados a subi-las ao contrário com os donos ou necessitem de aprender a caminhar sem fim à vista, descomandados e por sistema, o que não nos parece ser do agrado dos cães por ausência de motivação.
Da natação. Será que virá o dia em que as pistas destinadas aos cães deixarão de ter um aspecto provisório, desapetrechado, descuidado e mal-amanhado? Oxalá que sim! Agora, com a falência de muitas sociedades recreativas de bairro, aldeia e freguesia, os centros de treino caninos ocuparam os seus campos de futebol há muito abandonados, aproveitando assim (a custo zero), a luz, a água, os balneários e as bancadas desses recintos desportivos, sem contudo operarem qualquer melhoramento digno desse registo, o que nos lança uma vez mais para o carácter suburbano, inóspito e degradado dos espaços dedicados ao adestramento. Centro de treino que se preze, para além doutras condições, deverá ter uma piscina própria para exercitar os cães, considerando os benefícios advindos da natação, numa dimensão mínima de 24m2 e com um volume de água de 36m3. A natação possibilita a recuperação de lesões e o desenvolvimento muscular dos cães, harmoniza a sua morfologia, robustece o seu carácter, pode corrigir aprumos, mantém a sua boa forma física e alivia as suas articulações, é obrigatória na disciplina de salvamento e é do agrado dos animais, apesar de muitos não saberem nadar convenientemente e de necessitarem de ser ensinados, o que é tarefa obrigatória  para quem ensina, diante do País que temos e honrando a nossa aposta na sobrevivência animal. Todavia é um exercício complementar e não absoluto, porque lidamos com animais terrestres que têm outro tipo de locomoção preferencial.
O espaço que nos devem. As autarquias continuam em falta com os proprietários caninos e atendendo ao que por aí vai, assim continuarão por algum tempo, porque continuam a não existir parques destinados aos cães e pistas para o seu exercício, apesar desses cidadãos continuarem, não se sabe bem para quê, a pagar a “licença” dos seus animais. Não merecerão estes contribuintes melhor atenção?
Como os cães não são burros, a avaliação que fizemos dos exercícios que vulgarmente lhes destinam não esconde a nossa filosofia de ensino, que é a de fazer que o cão se sinta bem ao lado do dono e não que o dono abuse da sua posse, pois o adestramento é um namoro e dele resultará, se for bem alcançado, o mútuo prazer que sustenta a cumplicidade. O sucesso espera-vos, boas caminhadas!

VAMOS RESGATAR A ADELE!

A Adele é uma pastora alemã de 7 meses, pouco desenvolvida, acometida de diarreias e sujeita a uma dieta imprópria, cujo registo ainda não apareceu, uma descendente de cães negros que até há pouco tempo esteve jogada num canil, tendo como companheiro de infortúnio um rafeiro adulto (um dos raros que não lhe mordia), apesar de ser muito prestável, meiga e inteligente. Finalmente o seu dono lembrou-se dela, decidiu educá-la e iniciar o trabalho à trela, tendo o cuidado de a animar, amparar e recompensar diante da novidade do trabalho, dos seus companheiros e dos ecossitemas envolventes. Facilmente aprendeu a transpôr obstáculos e a nadar, já assume o “quieto” e adora brincar com os cachorros da sua idade. Pese embora o passado, mas apostados no seu futuro, dizemos: tarde é aquilo que nunca chega! Força Adele, nós acreditamos em ti!

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

PARA QUE NÃO SEJAM FRITOS NA MATA

Todos os verões as matas nacionais são fustigadas por incêndios. De norte a sul do País as marés de fogo e fumo repetem-se, o que muito tem contribuído para a desertificação da nossa terra, outrora pródiga em bosques, matas e pinhais, hoje fecunda em eucaliptos e repleta de matos por limpar, que se constituem no melhor dos combustíveis quando associados às temperaturas elevadas, para o despoletar desta tragédia que põe em risco pessoas, bens, culturas e animais, para além de influir negativamente sobre a qualidade do ar que todos respiramos, diminuindo assim a nossa esperança de vida e aumentando a já incontestável catástrofe global. È importante não esquecer que nos encontramos mais perto do Saara do que de Londres, também ela agora sujeita a temperaturas nunca experimentadas, e que o desaparecimento das árvores, pela alteração dos ecossistemas, mais rápido do que se julga, trará o deserto até nós. Que Portugal quereremos, aquele que nos foi legado ou o visível no interior da Península, aquele se avista da Autovia 5 e que nos leva de Badajoz a Madrid, seco e asfixiante?
Como a prática do “Canicross” está a cativar cada vez mais portugueses, é comum ver-se diversos binómios em treino pelas serras e matas, a distintas horas do dia, em locais por vezes remotos ou imprevistos, já que este desporto apresenta duas vantagens consideráveis: não é dispendioso e é possível fazê-lo com o cão ao lado, usufruindo assim do contacto com a natureza para reforço dos vínculos afectivos entre homens e animais. Contudo, esta prática não se encontra isenta de riscos no Verão, atendendo aos incêndios e à super proliferação de viandantes pedestres, ciclistas e moto transportados. Por falta de outras opções, a estes se juntam os “farneleiros”, famílias que optam por comer nos sopés das matas e que normalmente se decidem por uma bela e descansada soneca, longe do buliço das cidades, da algazarra dos vizinhos, da urbe asfixiante e debaixo de uma frondosa árvore, invariavelmente com os seus cães ao lado, que nem sempre são bem comportados. Mais do que nunca, as nossas matas encontram-se superpovoadas no Verão, independentemente dos locais escolhidos se encontrarem em áreas consideradas de alto risco para incêndios.
Por sua vez, os atletas que se fazem acompanhar dos seus cães, quiçá levados pela aventura e pela necessidade de desprendimento, até porque o mal só acontece aos outros (pelo menos até nos bater à porta), descoram a sua segurança e a dos animais que conduzem, para além de eventualmente desrespeitarem os restantes utentes das concorridas serras ou matas. Mas não são só eles a passear os seus cães ali, qualquer um o pode fazer e são cada vez mais os que o fazem, incorrendo na mesma falta de cuidado e a despeito dos avisos adiantados. Lamentavelmente, não nos cabe a solução destes problemas, mas adiantaremos subsídios preventivos para que você e o seu cão não sejam surpreendidos por um incêndio ou possam sair dele ilesos e o mais depressa possível.
Nunca encete percursos desconhecidos (à deriva), pois pode ficar acidentado, retardar o seu socorro e isso pode ser fatal tanto para si como para o cão. Só parta se se encontrar em perfeitas condições físicas, doutro modo poderá comprometer a sua fuga. Se o seu cão estiver com diarreia ou tiver saído dela poucos dias antes, não o leve consigo, porque se encontra debilitado e mais facilmente ficará desidratado. Circule nos pontos de cota mais baixa e perto de vias de acesso, para que a evasão esteja mais próxima e não se veja rodeado pelo fogo. Opte por caminhos circundados por lagos, lagoas, represas, rios e ribeiros, porque são zonas de protecção e podem salvar-lhe a vida (cuidado com as moto4). Comunique aos seus familiares mais próximos ou aos seus amigos onde se encontra e para onde deseja ir, porque mais depressa será localizado, esclarecido e socorrido. Não progrida no terreno debaixo de temperaturas acima dos 28º Celsius (o ideal é fazê-lo em temperaturas até aos 23º da mesma unidade de temperatura), para não desperdiçar reservas e evitar o “estoiro” do cão (os cães uniformes de côr mais escura cansam-se mais depressa do que os demais quando em exposição ao sol, porque rapidamente absorvem o calor proveniente dos raios solares. Além disso, o fogo necessita de calor para a sua combustão. 
Não se estafe e reserve forças para o regresso, pois pode vir a precisar delas. Evite embrenhar-se em matos secos e entre vegetação densa e alta, porque esses locais são de difícil transposição e altamente inflamáveis. Não escolha trilhos para dentro de reservas de caça ou para habitats de algum mamífero silvestre em particular, porque esses animais, quando surpreendidos pelo fogo e uma vez incendiados, tendem a aumentar as suas frentes (tal é o caso dos coelhos bravos). Carregue água na mochila para si e para o cão, não a desperdice. Se a natureza dos pisos o permitir, quando pararem para descansar, molhe as patas do cão para que arrefeça mais depressa e não entre em exaustão. Por prevenção, e isto é para si, também deverá levar na mochila uma mácara para a boca e o nariz, daquelas de uso hospitalar (à venda nas farmácias) ou das que os pintores usam (sempre à disposição nos armazéns e estâncias de materiais de contrução), para evitar a inalação de fumos. Caso não possua nem uma nem outra, valha-se de uma t-shirt para o mesmo efeito. Escusado será dizer que o estojo de primeiros socorros é indispensável, porque os acidentes acontecem e nem sempre sabemos o que nos espera. Não carregue muito peso e use roupa própria para a estação, para poder caminhar naturalmente, descontraído e desafogado. Nos percursos mais longos evite a companhia das crianças, pensando no seu bem-estar e no delas. Não vá sozinho, use roupas claras e contrastantes à paisagem, escolha botas leves e resistentes ao fogo, para melhor ser auxiliado, detectado e poder progredir sem dificuldades acrescidas.
Não sobrecarregue o cão com arneses, coletes ou peitorais de transporte e não lhe consinta grandes correrias. Para se evitar a prisão acidental e desnecessária do cão, assim como o seu enforcamento,  convém que os enforcadores, estranguladores e semi-estranguladores cedam lugar à coleira. Pela mesma razão, a coleira anti-parasitas deverá ser retirada. Como alternativa, temos por hábito pulverizar o cão na véspera com TAK-TIK e voltamos a fazê-lo no final da caminhada, depois de vistoriar o animal (cuidado com as praganas) e de o haver escovado. Os percursos de montanha, os mais escarpados, acidentados e repletos de espinhos, também aqueles salpicados de vidros ou conspurcados com resíduos químicos, podem obrigar à colocação de botas protectoras no animal, que deverão ser de imediato retiradas quando o trajecto deixar de apresentar essas características. O uso das botas obriga a treino prévio (doméstico ou escolar até deixarem de ser um incómodo para o cão). Se parar para descansar, não deixe os óculos sobre o mato, tape o telemóvel, não fume ou faça fogo e não abandone garrafas de vidro ou utensílios metálicos, porque tais acessórios, devido ao calor, podem constituir-se em comburentes. Se no meio dos seus percursos avistar utensílios dessa categoria, não hesite, enterre-os ou soterre-os debaixo de algumas raízes (é comum encontrarem-se algumas latas abandonadas pelos campos).
Os menos confiados e mais precavidos, têm o hábito salutar de manter os seus headphones sintonizados numa estação de rádio noticiosa, procedimento mais do que recomendável na época estival e que lhes poderá salvar a vida (os mais irreflectidos e descontraídos ouvem hip-hop, rap ou outros estilos musicais da sua preferência). Ao menor sinal de incêndio, por mais insignificante que ele lhe pareça, ligue para o 112, sintetizando a ocorrência pela resposta às perguntas: quem?, quando?, como?, onde?, o quê e porquê? A brevidade da comunicação que leva à rápida identificação do local, agiliza de sobremaneira o socorrro e pode salvar muitas vidas e bens (a sua e a do seu cão inclusive). Mais e melhores explicações poderão ser dadas pela Protecção Civil, pela GNR e pelos Bombeiros. Afinal, salvar o seu cão é também salvá-lo a si, porque os cães não lêem e apenas entendem os conselhos pela experiência directa e pela atempada advertência (quando aceite). Desgraçado é o cão cujo dono não olha por ele!
Boas férias, bons passeios e óptimo regresso!

NÃO O ENSINE A SALTAR DA JANELA DO CARRO!

Muitas vezes sem querer ou ignorando as repercurssões, acabamos por ensinar acções escusadas aos nossos cães, que delas se aproveitam para uso indesejável ou comprometedor. Tal é caso de os ensinar a saltar da janela do carro, o que à partida não parece um grande disparate ou disso resultar grande mal, o que infelizmente não é verdade atendendo aos riscos daí decorrentes, tanto para os animais quanto para as pessoas.
Depois de os havermos ensinado a saltar da janela do carro, ninguém nos garante que permaneçam dentro dele nas esperas mais longas ou nos dias mais quentes, nos sinais ou nas portagens, quando outro cão passa, uma cadela com o cio se aproxima ou alguém os provoca, a menos que deixemos a janela somente entreaberta (já existem no mercado janelas de rede que substituem os vidros e garantem a circulação do ar, pelo que aconselhamos a sua compra). 
Se o seu cão foi ensinado a atacar ou é naturalmente belicoso e ofensivo (o caso agrava-se se atacar sem primeiro avisar, daqueles que “mordem à boca calada”), depois de experimentar que a janela aberta não constitui qualquer entrave, sem maiores dificuldades, poderá encetar acções não ordenadas e lesivas, na sua ausência ou quando menos espera. Por outro lado, se assim proceder, o abandono da viatura implicará na sua desprotecção e quiçá no seu furto, o que não acontece só aos outros! 
Bem sabemos que os cães dos profissionais ou dos que almejam sê-lo, só saltam à ordem e que muitas vezes tal é necessário por razões operacionais ou de serviço, o que não deve ser o seu caso, uma vez que não se encontra a coberto duma farda e não foi recrutado como milícia. Por força do treino aturado, tantas vezes enfandonho para o comum cidadão, os cães militares, para-militares ou polícias, são tão prontos a ficar quanto a saltar, porque os seus tratadores não separam a obediência canina do cumprimento pronto e imediato das ordens, prerrogativa pouco observada nos binómios civis.
Já ouvimos dizer e discordamos, que se não ensinarmos os cão a saltar a janela do carro, em caso de necessidade ou urgência (quando a vida dos animais estiver em risco), eles jamais sairão de lá, podendo inclusive perecer. E discordamos porque os cães ainda não baniram o instinto de sobrevivência e tudo fazem para a sua salvaguarda, não são autómatos nem suicídas, apesar de poderem marchar para a morte debaixo de ordem, porque não sabem ao que vão e partem confiantes pela prévia experiência feliz (vão ao engano). A somar a isto, na ausência dos seus treinadores e líderes, as respostas naturais caninas tendem a sobrepor-se às artificiais fornecidas pelo treino, particularmente diante de situações nunca experimentadas e quando a sobrevivência dos cães estiver em risco. Assim, ensinar um cão a saltar a janela do carro, é uma brincadeirinha que pode virar um caso sério, mais uma patacoada no já defraudado adestramento canino, uma habilidade que poderá acabar em desastre.

A BARCA DOS CÃES: TRABALHO DE VERÃO

Em cada Verão a saga repete-se: toca a ensinar os cães a nadar! E quem não tem rio vai para o mar! Os da fotografia são uns privilegiados, porque o seu dono possui uma praia privativa e sempre se podem ali exercitar. No princípio há que ensiná-los a nadar com as quatro patas abaixo da linha de água, para que mais rápido se desloquem e não entrem em exaustão. Depois aumentam-se as distâncias e acrescenta-se o serviço, para que a água não seja um entrave e os cães se sintam dentro dela à vontade. Alguns irão alcançar uma velocidade de 3m/s (isto se o mar estiver “chão”), outros darão fortes indícios para a disciplina do salvamento e haverão alguns… que não quererão sair da água, que mais tarde entrarão dentro das piscinas apenas para se refrescar, permanecendo nos seus acessos enquanto lhes aprouver. Para os donos que possuem piscinas é mais do que obrigatório ensinar os seus cães a nadar, isto se não querem vê-los afogados. Ao mesmo tempo, devem condicioná-los a entrar e a sair pelo sítio certo. 
Logo a seguir ao desempenho na pistagem, a natação surge como o exercício de eleição pelos cães, porque se encontram apetrechados para isso e adoram refrescar-se. Assim sendo, já sabemos porque razão muitos deles apresentam aversão à água: porque tiveram pouco contacto com ela e não tiveram quem os ensinasse a nadar, alguém disposto a acalmá-los e a acompanhá-los nessa aventura. Se considerarmos que o adestramento está cá para dar vida aos cães, então não podemos isentá-los da natação, enquanto precioso subsídio para a sua sobrevivência, melhor forma e longevidade. Nós que sabemos disso, não hesitamos: Verão é tempo de natação!

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

O CÃO DO DONO INSUPORTÁVEL!

Por mais voltas que demos à cabeça, não conseguimos lembrar-nos de um cão deliberadamente insuportável, apesar de vários milhares nos terem passado pelas mãos, assim como não nos recordamos de nenhum que fosse essencial “burro” ou sem préstimo. Ao invés, e sem grande esforço, depressa nos lembramos de donos verdadeiramente insuportáveis, com baixo índice de progresso, pouco dedicados, avessos a mudanças, destituídos de protocolos e impróprios para o adestramento. Engana-se quem julgar tratar-se de gente rudimentar ou pouco letrada, pois alguns deles, para além de licenciados, eram doutores, o que nos lança para um ditote muito ouvido lá para as Terras do Bouro, que diz “ser um doutor um burro carregado livros”. Humor ou fleuma à parte, o grosso dos alunos que obtiveram melhor aproveitamento foram os de formação universitária, os já formados ou em formação. No entanto, houve gente que se quedou “inexplicavelmente” pelo secundário, que alcançou notariedade e que enriquece hoje as fileiras do adestramento ou que é uma mais-valia para outros proprietários caninos.
O cão é um ser que age por reflexo, reagindo mais ou menos a determinados estímulos segundo a individualidade que a carga genética lhe ofereceu, podendo sem grande dificuldade, e isto muita gente esquece, ignora ou nega-se a aceitar, alterar o seu comportamento por força do peso ambiental, por ser um animal social e por isso mesmo dependente, o que de sobremaneira importa e justifica o adestramento. Para melhor se compreender o que acabámos de dizer, lembro aqui um episódio ocorrido durante umas filmagens no Jardim do Quevedo em Setúbal, quando uma respeitável senhora não se conteve e exclamou: “ Parabéns! O seu cão é muito inteligente!”, merecendo do adestrador a seguinte resposta: “ Obrigado. O inteligente sou eu. O cão aprende sem grandes dificuldades e descansa ali à sombra, enquanto eu penso como fazer o trabalho que iremos realizar!”. È evidente que os cães possuem algum ou mais tipos de inteligência, o que os torna mais aptos para a sobrevivência do que alguns humanos disso destituídos, e não estamos a falar exclusivamente em instintos, até porque eles aprendem por observação e são capazes de complementar ou reproduzir tarefas que nos são próprias.
Para o bem e para o mal, e disto não restam dúvidas, um cão será tanto ou mais capaz quanto fôr o seu adestrador, que nosso entender deverá ser o seu dono. Se por acaso o dono sentir dificuldades ao fazê-lo e solicitar a ajuda de uma escola ou de um treinador, então o responsável pelo êxito ou insucesso do ensino será também da entendidade ou do profissional que ofereceu os seus préstimos. E não atribuímos o mérito ou o insucesso exclusivamente a estes, porque trabalharam a rogo dos donos, não coabitavam com os animais e não lhes cabia a instalação e a recapitulação domésticas, pois seis horas semanais de treino dificilmente substituirão 162 passadas em casa, arredadas do ensino e com os animais entregues a si próprios. O adestramento é para o dia-a-dia e o cão bem compreendido é um projecto familiar, um encargo acrescido que não se confunde com um hobby ou um brinquedo, algo que desprezaremos quando não temos tempo ou que arrumaremos numa gaveta até à próxima utilização. Mas se por acaso o cão vier a morrer por negligência, por não lhe terem sido adiantados os necessários subsídios para a sua sobrevivência, certamente não poderemos isentar de culpas aqueles que se fizeram pagar, quer por não se terem feito ouvir, quer por ignorarem a obra maior do seu ofício. 
É evidente que cada dono faz o seu juízo e apenas leva a cabo aquilo que mais lhe importa, é mais cómodo ou lhe dá gozo, a despeito muitas vezes daquilo que lhe é dito, ensinado e enfatizado, porque os cães a tudo se prestam e os donos com eles ao lado revelam comportamentos até ali encobertos, acabando por demonstrar a sua verdadeira natureza, aquela que está para além das conveniências e que invade os seus sonhos, a despeito dos direitos alheios e em prol da sua realização pessoal, até porque não estão sós e podem culpabilizar os animais pelas manifestações menos válidas da sua personalidade. 
Por outro lado, devido ao dualismo das vontades que o adestramento sempre expõe, a máscara quotidiana de cada um cai por terra, evenciando nos condutores os seus méritos, deméritos, virtudes, lacunas, qualidades e impropriedades, o seu particular afectivo, processo pedagógico e aspirações. Sempre será mais fácil, para quem ensina, desconsiderar isso e sobrecarregar os cães de exercícios, mesmo que a sua assimilação seja dificultada pelos entraves presentes nos donos. Mas o que importará mais a um adestrador, o peso da fortuna ou o índice de progresso binomial? Estamos cientes que a esmagadora maioria optará pelo primeiro caso, por ser mais aliciante, conveniente e ser do agrado dos donos, mesmo que os cães pouco ou nada aprendam, os seus proprietários saiam traídos pela sua personalidade e ludibriados nos seus intentos. Dali partirão felizes e contentes apesar de tratados como tontos, dando razão ao aforismo por todos conhecido: “mais vale cair em graça do que ser engraçado”, porque corrigir nunca foi fácil e é muito difícil de encontrar quem aceite a correcção, em particular neste mundo onde o culto pessoal é enfatizado e a humildade passou de moda. É curioso reparar que a sobranceria raramente afecta os mais doutos e quando isso acontece… breve serão ultrapassados, até porque a verdadeira sabedoria leva-nos à constactação das nossas limitações, ao pouco que sabemos e ao desejo de mais sabermos. 
E no meio disto tudo, como não poderia deixar de ser, os cães alheios continuarão a importunar-nos, a não nos deixar dormir, a perseguir os nossos, a invadir o nosso espaço, a passar por cima de nós, a derrubar-nos e até a dar-nos caça, quando não morrem envenenados ou atropelados, massificando e reforçando aquilo que dentro dos seus donos habita, quer seja ignorância, incúria, desplante ou malvadez, agindo dessa maneira por reforço ou inacção dos seus líderes. Os cães insuportáveis são-no por causa dos donos e como não aprendem sozinhos, os donos deverão ser objecto de aturada educação, tarefa de difícil aceitação mas necessária à sociedade, enquanto líderes e primeiros responsáveis pelos seus cães. Diante disto, não compreendemos porque não se exige a cada um deles um certificado de robustez física e psicológica.  Serão porventura os cães mais inteligentes? Nalguns casos quisera Deus que sim!

AGRADECIMENTO DE UM EX-ALUNO

O Email que a seguir transcrevemos na íntegra (apenas formatámos o texto), é de um ex-aluno da Escola. Esta publicação não se prende com o seu carácter elogioso, antes com a transmissão daquilo que sempre pretendemos legar. Não adiantamos a identidade do autor porque não o consultámos para isso, muito embora nos pareça que nada teria a obstar.
Olá
Sempre fui um apreciador e amigo da raça canina, sem ser grande estudioso, e em Dezembro de 2003 adquiri um Dogo Argentino, por influência, ocasião, graça, gosto, dissemelhança e também “ignorância”. O gosto pelos cães e a possibilidade de ter um fez-me adquirir um cão apesar de não ser propriamente o desejo da minha esposa que tinha medo da espécie canina, fosse grande ou pequeno. Por aconselhamento do criador e também por curiosidade própria frequentei durante 1 ano uma escola para cães, na minha opinião para os donos dos cães. A escola aconselhada, ACENDURA BRAVA, ficava perto de minha casa, o que era óptimo. O seu proprietário, SENHOR João Garrido foi um excelente professor naquilo que dizia respeito a cães mas, foi a sua mestria no entendimento do comportamento humano e na sua relação com o animal cão que mais me surpreendeu. Sendo um homem de linguagem e franqueza directa era tolerado por uns e odiado por outros. Para mim era a pessoa certa pelo facto de gostar de pessoas francas e directas, sem rodeios e falsas modéstias. Muito aprendi sobre as raças canina e humana naquela escola. Infelizmente, em Março deste ano, após vários problemas de saúde o meu amigo faleceu, repentinamente. Nunca na vida me passou sequer pela imaginação que o sofrimento de perda de um cão fosse tão doloroso, ver as suas fotos ou qualquer outro acto de recordação é demasiado doloroso. Apesar de considerado um cão potencialmente perigoso nunca houve qualquer acto óbvio da sua parte que o demonstrasse, não sei se o seu comportamento obediente, amigo e submisso se devia ao seu carácter, à escola ou à sua convivência humana, porventura foi o conjunto de tudo. Para quem nunca teve um cão torna-se difícil compreender mas posso dizer que senti e presenciei muitos actos de comportamento e comunicação canina inteligente por parte do meu cão, actos que não eram obviamente de comportamento condicionado. A actual investigação animal está a chegar à conclusão que os animais são muito mais inteligentes do que se pensava pelo simples facto de que nós próprios estamos menos condicionados pelos preconceitos. 
Não sei o que é feito do Sr. João Garrido, após 8 anos sem o ver perdi o seu contacto e a escola que conheci já não existe, de qualquer forma deixo aqui o meu agradecimento por tudo o que aprendi com ele.
Cumprimentos, (…)

sábado, 3 de agosto de 2013

NÓS TRABALHAMOS MUITO!

Duas simpáticas alemãs, mãe e filha, entendidas primeiro como inglesas por quem as servia, co-proprietárias de um kindergarten com apoio estatal nos arredores de Frankfurt, encantadas com a sua primeira visita a Portugal, depois de terem comido sardinhas e bebido copiosamente uma garrafa de vinho branco, felizes e relaxadas, descansavam na esplanada onde foram servidas, para além da hora do seu fecho e com a lua a brilhar sobre as suas cabeças. Por delicadeza, o pessoal que as servia não as queria mandar embora, até porque os turistas são cada vez menos e há que conservá-los, apesar dos actuais terem os bolsos mais vazios que os de outrora e andarem de mochila às costas a conferir os preços. Segundo se diz para aí, os melhores são os franceses, apesar de se apresentarem agora mais austeros e de serem mais exigentes. Ingleses e alemães comportam-se como ávaros, os espanhóis têm tirado a barriga da miséria a muitos (não obstante serem cada vez menos) e os brasileiros estão na moda. Por todo o lado se ouve dizer que a restauração está pela lei da morte (ao que parece já teve dias bem melhores). Voltemos às alemãs.
A determinada altura, no meio da conversa que entabulámos com elas, cujo tema foi a actual crise económica, a mais velha, sem se fazer rogada, soltou em tom solene: “sabe, nós (os alemães) trabalhamos muito”, o que nos pareceu abusivo e despropositado. Quem já andou por esse mundo afora e viu portugueses a trabalhar entre os demais, sabe que poucos são mais sacrificados do que eles, que se destacam pela sua capacidade de trabalho e que sobem a pulso onde outros não singram. Para elucidarmos a convicta senhora, valemo-nos do exemplo do criado que a serviu, um jovem  a trabalhar 90 horas semanais, com direito a um dia de folga e a auferir um salário mensal de 650€ (comidos e bebidos), o que na actual situação até nem é mau de todo, muito embora o seu contrato lhe garanta somente seis meses de trabalho. Ali mesmo comprovámos o que tínhamos dito, chamando o empregado que se fez acompanhar do seu último recibo de vencimento. Surpreendidas e mudas, as alemãs olharam uma para a outra, soltando depois, entre dentes, um pequeno comentário na sua língua mãe (só sonseguimos entender “scheisse”), seguido dum sorriso deslocado e sensaborão. Como resultado do nosso esclarecimento, o criado acabou por recerber de gorjeta 1/3 do valor do jantar de ambas, exactamente 7€, o que muito estranhou e melhor agradeceu. Para seu agrado, as alemãs acabaram clientes da casa durante o mês em que tiveram o flat alugado nas redondezas.