NOTA INTRODUTÓRIA: Este artigo, publicado agora com
algum atraso, remonta aos dias imediatamente à seguir à derrota do S.L.Benfica
frente ao Chelsea de Londres a contar para a Champions League da época
transata.
Mesmo que a queiramos ignorar, não podemos
desconsiderar a força do futebol entre nós, porque o País pára quando algum dos
“grandes” defronta outro lá de fora, aproveitando as televisões esse entusiasmo
para aumentar as audiências, dedicando ao “desporto-rei” intermináveis horas de
emissão. Aqui e ali surgem nas praças ecrans gigantes, os políticos associam-se
à “coboiada”, a cerveja corre a rodos, reina o silêncio e as ruas ficam desertas
pouco antes da hora dos jogos, dando a sensação que a “redenção” está prestes a
chegar ou que a “glória” se encontra a um passo. Assim é em Lisboa, uma cidade
controversa que bem depressa se dá a conhecer, particularmente quando joga o
Benfica. Acostumados à sua sina, porque há mais de cinquenta anos que os
benfiquistas não ganham um troféu internacional (uma Taça Uefa ou a Liga dos
Campeões), mais uma vez, agora perante a derrota frente ao Chelsea, soaram os
acordes do fado da desgraça e urgiu encontrar um responsável, sendo ele, neste
caso ela, a maldição de Bela Guttmann, idéia também abraçada por alguns jornais
desportivos estrangeiros que a usaram nas suas parangonas. Mas o mais curioso
disto tudo, é que um jornalista televisivo português, quiçá descendente de algum
ignoto marrano ou cristão-novo, para realçar o papel da dita maldição, disse-a
proveniente do “judeu” Bela Guttmann, como se ela fosse mais eficaz vinda de um
hebreu e os judeus continuassem a causar todas as desgraças, mesmo depois do
decreto da sua expulsão, acontecido há cinco séculos atrás. Hábitos antigos que
tornam actual o refrão da canção da Ala dos Namorados: “ São os loucos de Lisboa/ Que me
fazem duvidar/ Que a Terra gira ao contrário/ E os rios nascem no mar”.
A
maldição do agora tornado proscrito Bela Guttmann, até aqui um simples húngaro,
falecido em 1981, remonta ao ano de 1962, quando conquistou como treinador do
Benfica a segunda Taça dos Campeões Europeus e disse que o Clube da Águia jamais
voltaria a ganhar uma final europeia sem ele, vaticínio que até hoje tem
vigorado para desespero das hostes benfiquistas. Aquilo que o homem proferiu em
exaltação tem sido aproveitado como maldição, como razão oculta para menos
valias à vista de todos. A este “Judeu” muito deve o Benfica, porque com ele
foi bicampeão nacional (1959-1960 / 1961-1962), ganhou uma Taça de Portugal
(1961-1962) e duas Taças dos Campeões Europeus, respectivamente em 1961 e 1962,
elevando o nome do Clube da Luz por essa Europa fora. Como treinador foi ainda campeão
húngaro duas vezes e ganhou uma taça, deu ao São Paulo um Campeonato Paulista,
ao Millan um Campeonato Italiano e ao F.C.Porto um título de Campeão Nacional.
Afortunadamente os tempos são outros e o homem não se encontra aqui sepultado,
porque doutro modo desenterrariam os seus ossos e queimá-los-iam à vista de
todos, tal como sucedeu com Garcia de Orta. A “habilidade” do jornalista
desportivo português traz-nos à memória
“A Matança da Páscoa”, “O Massacre de Lisboa” ocorrido em 1506, quando
um grupo de fradecos, designados por dominicanos, exaltou os ânimos populares e
responsabilizou os judeus da Capital pela peste, pela fome e pela seca que
então grassavam. Como resultado disso foram mortos milhares de judeus. Como
este “Pogrom”, apesar de realçado por eminentes historiadores (Alexandre
Herculano, Oliveira Martins e Garcia de Resende), nunca constou da História a
ser ensinada nas escolas, é de todo conveniente ler o relato que Damião de Góis
trouxe até nós.
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