segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

A SÍNDROME DO CÃO QUE EU TIVE

Mal vai o cão cujo dono pensa noutro que já teve e não vê no actual o muito que ele tem para dar, porque sempre será julgado por comparação e ver-se-á obrigado a ser aquilo que não é. É do conhecimento geral que não existem dois cães iguais e com rara propriedade o confirmarão os criadores votados à endogamia, porque por mais idênticos que sejam os animais produzidos, sempre subsistirão algumas diferenças pelo peso da individualidade. O apego declarado ao cão que já se foi tende a menosprezar o rendimento do recentemente adquirido, porque as diferenças obrigam à novidade de procedimentos e a disponibilidade operacional do dono, traído pela afeição e ávido de um clone autêntico, não será certamente a desejável, o que condenará o trabalho do cão ao sub-rendimento, a um aproveitamento parcial e à obtenção de respostas artificiais de difícil instalação. Este fenómeno é visível nos condutores que no passado tiveram em mãos um cão excepcional ou tido como excepcional, normalmente produto do trabalho alheio que não reclamou do dono grande empenho ou esforço em demasia. Graças à bitola do dono, presa ao passado, imprópria e alheia ao cão, o animal tornar-se-á evasivo, desatento e pouco interessado, factores advindos da ausência dos verdadeiros afectos que tarde ou nunca lhe chegam. A relação entre ambos dificilmente chegará à cumplicidade e o bicho enveredará justificadamente por tarefas a modo próprio, tornando-se desatento para aquelas que lhe serão solicitadas. O mundo do adestramento tem o seu esqueleto nos afectos, tanto que a mão que acaricia é ordinariamente a mesma que despoleta a ordem e é seguida. Como nenhum ânimo é válido se provir do desgosto ou desalento e o carácter dinâmico do adestramento assenta sobre o aproveitamento da novidade, importa alertar tais donos e convidá-los para a unicidade e mais-valia dos cães que conduzem, colocados à sua disposição e sedentos por apresentar trabalho. Ensinar cães é semear esperança nos condutores, despertá-los para a realidade e fomentar-lhes a parceria. E nisto que Deus nos conserve!

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