segunda-feira, 3 de setembro de 2012

CHEGOU A VEZ DO DOGUE ARGENTINO


Num país onde a maior parte da juventude não tem qualquer contacto com animais, exceptuando o havido com os do Jardim Zoológico que se encontram por detrás das grades e  em exposição ao público, o papão do bicho-cão cresce assustadoramente e toda a gente jura ter-se cruzado com um cão potencialmente perigoso pelo menos uma vez na vida. Apesar da psicologia aqui ter chegado tarde e a etologia ser para muitos desconhecida, o populacho julga-se agora “entendido” em cães e não se inibe na formação de pareceres, movido pelo cagaço que leva à confusão entre o indivíduo e a sua raça, segundo a ignorância de quem tudo sabe e de acordo com as manchetes que lhe bombardeiam os ouvidos. Chegou a vez do Dogue Argentino, porque, ao que parece, já causou duas vítimas mortais. Quem será o freguês que se segue?
O grande boom do Dogue Argentino, que entre nós não foi assim tão grande, iniciou-se no final da década de 80 via Espanha, depois da adesão de Portugal à CEE e a raça começou por ser recrutada para a guarda convencional, uma vez que vinha acompanhada de uma fama que nunca lhe sobrou em proveito e que a fazia devoradora de pumas. Sobraram desse tempo uns tantos vídeos de má qualidade, que pela sua natureza sanguinária, foram e continuam impróprios para os serões familiares. O desaproveitamento massivo da raça na guarda convencional, motivado pelo seu pouco interesse na disciplina, pela constante confusão na troca de alvos, precária resistência às invernias, pouca predisposição laboral, problemas articulares e inadequada máquina sensorial (ainda sobrevivem na raça muitos exemplares surdos), reencaminhou o “porco branco”, nome como ficou conhecido na gíria em analogia ao Rottweiler, para o seu lugar de eleição: as matilhas de caça grossa, acontecendo com isso o seu desbarato e banalização. Assim como não se pode esconder que alguns Dogues Argentinos se vieram a constituir em bons guardiões, também não se deve omitir a escassez do seu número, enquanto cães matilheiros, afáveis de trato e de fácil coabitação, qualidades desconsideradas por aqueles que os desconhecem  e que agora ao condenam.
 
Nestas coisas dos cães, como em tantas outras áreas, mais vale cair em graça do que ser engraçado, muito embora a situação vire desgraça para qualquer proprietário canino que se faça acompanhar pelo seu cão, em particular se for grande e pouco visto, porque sem grande dificuldade poderão ser entendidos como uma ameaça pública, plebe a evitar e companhia nada recomendável. Recentemente, debaixo do medo instalado, num jardim público, uma pequena cachorra de 12 kg e 5 meses de idade, sem raça defenida, no intuito de brincar, empoleirou-se num miúdo de 13 anos, obeso e a rondar os 100 kg, que se encontrava a jogar à bola (a guarda-redes) com o pai. Da brincadeira resultaram exíguas marcas das patas no animal nas pernas do rapaz, “insólito” que deu azo ao seguinte protesto do seu papá: Veja lá se prende a cadela, ela é perigosa e a prova disso encontra-se nas pernas do meu filho. Ele não está aqui para ser ferido!” Decididamente, perante a escassez de espécies cinegéticas, e de uma vez por todas, abriu a caça ao cão! Urge reatar o salutar convívio com os cães, fazer saber aos homens porque razão é o cão considerado o seu melhor amigo.
Sosseguem as mentes inquietas e os corações atribulados que do Dogue Argentino não virá grande mal ao mundo. Lamentavelmente, o mesmo não se poderá dizer de todos os donos, tanto dos proprietários dessa raça como das outras, que de forma intencional ou não, pela irresponsabilidade, projectam o disparate e põem a cabeça dos cães a prémio. No nosso entender, todos os cães deveriam ser treinados e não somente os que se portam mal, porque a ausência da prática do bem já é mal que a todos basta. E depois, pior do que qualquer raça canina e muito mais mortífera do que qualquer uma delas, tem sido a actual crise que teima em se ir embora, responsável por uns tantos suicídios, pela destruição de muitas famílias e pela diminuição da taxa de natalidade. O País precipita-se para a cova e nós a correr atrás dos cães!

O NOSSO RIN TIN TIN


Brevemente iremos voltar a este assunto, está prometido, quando estivermos melhor documentados e nos for facultado o acesso a alguns ficheiros há muito esquecidos, porque o tema nos interessa e faz parte da história da cinecultura nacional, da nossa cinemateca e espelha o trabalho dos tratadores militares que nos antecederam, trabalho embrionário que geralmente é pouco lembrado. Quarenta e dois anos depois do filme “The Man From Hell’s River”, que marca a estreia do mítico Rin Tin Tin no cinema, em 1964, estreia-se em Lisboa, no cinema Odeon, o filme de Constantino Esteves “9 Rapazes e Um Cão”, uma produção nacional levada a cabo por Manuel Queiroz, ficção filmada em Campolide com uma duração de 94 minutos, com um guião ao gosto da época, a enaltecer o drama e o heroísmo juvenis.
 
Ao que nos foi dito e isso parece confirmado, o cão protagonista veio das fileiras da GNR, ali dando entrada por doação da sua proprietária. Quem o conheceu diz que era quase todo negro, que o afogueado da sua máscara era por demais claro e que era pernalto de morfologia. O seu tratador, que foi acompanhado nas filmagens por um Cabo, vivia até há pouco tempo na área de Algés. Também segundo o que nos foi contado, o cão era um “Às” dentro e fora do cinema, chegando a interpôr-se entre tratadores e cães, quando a integridade dos segundos era posta em risco. Meia dúzia de anos depois da sua formação, a cinotecnia da Guarda começava a dar os seus frutos, a cerrar fileiras e a constituir-se naquilo que até hoje nos chegou. Poucos tratadores desse tempo continuam entre nós e a memória dos seus cães irá morrer com eles. Até lá, relembram em cada Pastor Alemão que vêem um pouco da sua história e vão adiante. Mas como “serviço é serviço e conhaque é conhaque”, o que fica para a história é que quarenta anos antes do aparecimento da série do “Inspector Max” em Portugal, já um Pastor Alemão havia sido protagonista num filme. Continuamos sem saber o seu nome, mas ele ainda pode ser visto, o cinema imortalizou-o.

ELES ENTENDEM-SE!

Os conceitos quando não são científicos, e não estamos aqui a tratar da transcendência das verdades metafísicas, mais cedo ou mais tarde, acabam por ser desacreditados e desprezados. O mundo canino está impregnado de falsos conceitos que para alguns ainda são verdades absolutas, inverdades que a seu tempo acabarão por revelar-se. Certo zootécnico, por sinal bem sucedido no seu ofício, decidiu aceitar mais uma cadela no seio da sua já numerosa matilha heterogênea. Na ocasião da entrega do animal foi alertado para os riscos do amatilhamento canino sem a interferência humana, ao que respondeu: “Eles entendem-se!”. Acabou por descobrir, da pior maneira, que estava redondamente enganado e foi ontem enterrar a cadela miniatura que mais adorava, vítima da outra que recentemente havia adquirido. A sociabilização canina não é gratuita e não dispensa tanto a liderança humana quanto a familiarização, porque o escalonamento da matilha animal não acontece de forma pacífica, mas sim por meios ligados à “lei do mais forte” que normalmente não dispensam o recurso à violência, o que sempre levará o Homem a estabelecer regras e a fazê-las cumprir.

ESCONDA-SE PARA SER ENCONTRADO E SEMPRE ANDARÁ ACOMPANHADO


Um dos problemas mais comuns entre os proprietários caninos é a fuga dos seus cães e a dificuldade no seu retorno, quando em liberdade e em espaço aberto, o que tem levado muitos, justificadamente, a conservá-los quase sempre atrelados ao seu lado nas rotineiras deambulações pelos espaços públicos, conforme a Lei e para defesa da integridade de homens e animais. Tecnicamente falando, estamos perante a inexistência de um comando básico – o “Aqui”, que quando associado ao “Junto” (ao lado), constitui a base piramidal do adestramento. A constactação do problema levará alguns donos e outros tantos cães até às portas dos centros de treino caninos, onde por norma encontrarão solução através de um ou mais tipos de condicionamento, consoante os métodos utilizados e de acordo com as características individuais de cada cão.
A causa do problema é gregária e aponta para algum descuido no ciclo infantil que antecede os quatro meses de idade nos cachorros, altura em que começam a manisfestar a sua propensão excursionista, partem à descoberta do mundo que os rodeia e procuram nele um lugar que lhes seja mais cómodo, vantajoso ou propício. É também nesta idade que começam a compreender e a respeitar a hierarquia, cujas bases normalmente se encontram consolidadas aos seis meses. A incidência do problema é maior junto dos cachorros que passam a maior parte do seus dias sózinhos e daqueles que aos nossos olhos nos parecem mais erráticos, quiçá por uma selecção mais baseada nos instintos do que na parceria. Como atrás se disse, tanto para uns como para outros, a partir dos 4 meses, as escolas caninas tendem a resolver o problema, dentro de um cronograma mais ou menos longo que sempre exigirá alguma recapitulação até ao alcance do automatismo desejado, delongas associadas à resistência dos animais, à aceitação da liderança e ao despreparo dos seus condutores, geralmente suavizadas e tornadas mais céleres pelo recurso ao reforço positivo. Por razões óbvias, o problema deverá ser resolvido antes da maturidade sexual dos cães (antes dos 7 meses de idade), isto se quisermos evitar maiores entraves.
No entanto, se você acabou de adquirir um cachorro com dois meses de idade e não deseja vir a passar pelo mesmo problema ou embaraço, saiba que ele pode ser evitado a partir de uma simples brincadeira e que os cães, mesmo entre eles, aprendem brincando. A brincadeira é algo similar ao “brincar às escondidas”, você esconde-se e convida o seu cachorro a procurá-lo, chamando primeiro pelo nome e desaparecendo depois sem pré-aviso. A constância na brincadeira, que é do inteiro agrado do cachorro, leva-lo-á a nunca o perder de vista e possibilitará a inserção quase automática dos comandos de “Busca” e “Aqui”, exercitando assim o seu faro enquanto sentido director. O adestramento tem sofrido profundas alterações nas últimas décadas e as tradicionais caminhadas lineares ou circulares destinadas à obediência, têm cedido lugar, na fase introdutória do treino, à administração do currículo básico de pistagem, ganhando-se com isso os vínculos afectivos binomiais indispensáveis a um adestramento mais alegre e mais profícuo. Até lá, brinque às escondidas com o seu cachorro e ganhe um companheiro que sempre se fará presente a seu lado, pois mais vale conquistar o cão em casa do que perdê-lo no meio da rua.

PROTESTARAM E COM RAZÃO!

Certo empregado dedicado e fiel, amigo do seu patrão e zelador dos seus cães, chegada a hora, decidiu trocar os cachorros de habitáculo e separá-los um a um, cada um para o seu canil, três Pastores Alemães de 5 meses e há 3 a viverem em conjunto. Esperou pela noite para fazer a mudança e depois foi dormir descansado, distante dos animais porque morava longe. Os bichos não se calaram durante toda a noite, arranharam as portas, gemeram e uivaram, e não deixaram os vizinhos “pregar olho”. Na manhã seguinte o coro dos protestos fez-se ouvir e os vizinhos indignados não foram nada simpáticos, protestando veementemente pelo incómodo a que se viram sujeitos. O pobre homem derreteu-se em desculpas, mas isso para alguns pareceu não bastar. Agora já sabe como fazer e gradualmente vai acostumando os cachorros aos canis, primeiro de dia e depois à noite, nunca sem antes permanecer um pouco a seu lado e lhes deixar uma guloseima ou petisco do seu agrado (um deles até gosta de ouvir rádio).